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![]() Acadêmico: José Renato Nalini Além de ser um azougue na tribuna, Bilac era uma pessoa de presença de espírito e muito solidária quando verificasse alguém que necessitasse de ajuda
A palavra que faz chorar A oratória era um dom com que se podia nascer, mas que podia ser adquirida mediante contínuo treino. Os gregos tinham na retórica uma de suas mais importantes artes. Era a palavra que persuadia e o exercício de uma democracia direta não podia prescindir de bons oradores. Hoje, o alunado de Humanidades não se vê chamado a falar. Permanece inerte, a maior parte do tempo, a ouvir preleções orais de seus professores. É o que explica, em boa parte, a indigência dos debates nos Parlamentos, as sustentações orais prolixas, o tatibitate de quem pode ter lido, mas não sabe transmitir. Mas houve tempos, neste mesmo solo brasílico, em que oradores de escol eram admirados e louvados. Um deles foi Olavo Bilac. Ele acompanhou a comitiva que o Presidente Campos Sales levou à Argentina em 1900. Poucos sabiam que ele era um tribuno, embora o conhecessem como consagrado poeta, o maior nome do parnasianismo pátrio. Quando chegou o momento de visitar a Associação Argentina de Imprensa, toda a comitiva esquivou-se de falar. Foi Olavo Bilac o representante do Brasil, a responder à saudação do Presidente. No silêncio da sala, sua voz cristalina percorreu, sem hesitação, um histórico das relações entre nossos países e foi num crescendo que, ao terminar, foi estrondosamente aplaudido. Daí por diante, não teve mais descanso. Onde surgia, era obrigado a falar. E falava com idêntica fluência, a mesma elegância, mostrando-se mestre absoluto da palavra improvisada. O mais belo discurso estava reservado para a recepção que “La Nación” oferecia à delegação brasileira. Além do nosso Presidente Campos Sales, compareceria o General Mitre. Ao responder à saudação, Olavo Bilac tece verdadeiro hino ao sábio, ao escritor, ao guerreiro e ao político. Seu discurso provoca tal entusiasmo, que as palmas da sala parecem sacudi-la, por entre constantes e demorados “Vivas” a Brasil. Esvaziando-se o salão, restou nele uma jovem de grande beleza, a enxugar os olhos. Ao se notar observada, exclamou: - “Que pícaro. Me há hecho llorar!”. Além de ser um azougue na tribuna, Bilac era uma pessoa de presença de espírito e muito solidária quando verificasse alguém que necessitasse de ajuda. O General Cunha, Ministro de Portugal no Brasil, era um homem simplório, destituído de qualquer malícia e despreparado para os embates da política. Ao final de um banquete no “Clube dos Diários”, coube a ele fazer um brinde. Risonho, afável, mas desconcertado, ficou em pé, segurando a taça. E começou: - “Portugal, embora seja uma nação pequenina...” Demorou uns segundos, buscando o fecho da frase. E como não encontrasse, voltou a dizer: - “Portugal, embora seja uma nação pequenina...” Sentado ao seu lado, Bilac resolveu salvar o diplomata. Soprou-lhe estas palavras, disfarçando a ajuda com um movimento do guardanapo junto à boca: - “É grande e glorioso pela sua história!”. Foi o que o General disse, terminando seu discurso relâmpago. Sentou-se, voltou-se para o poeta e agradeceu: - “É isso mesmo. Você tem razão! É grande e glorioso por sua História! Essa eu não esqueço mais...” O único senão em Bilac, era o seu desinteresse concreto pela natureza. Embora compondo belas descrições de nossos trópicos, não tinha o menor gosto para meter-se nas selvas, como o Fernão Dias Paes Leme do seu poema “O caçador de esmeraldas”. Uma vez foi provocado por Medeiros e Albuquerque, a dizer em público o que falava nas pequenas rodas: para ele, só havia no mundo uma coisa bela: uma bela mulher! Bilac admitiu sua indiferença pelo bucolismo e acrescentou: - “Mas tenho de ocultar essa opinião em público, por um deve profissional. Se disser isso, sou demitido de poeta: acham logo que não sei fazer versos!”. Foi por sugestão de Coelho Neto que escreveu o poema a Fernão Dias. Instigado a fazê-lo, respondeu: -“Por tua causa, vou afrontar a mata virgem, onde achas tanta poesia, e eu somente vejo serpentes, macacos e mosquitos...”. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 03 05 2025 ![]() ![]() |
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