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JUSTIÇA CLIMÁTICA EFETIVA: UMA URGÊNCIA CLAMOROSA
Acadêmico: José Renato Nalini
Na verdade, o recrudescimento da gravidade da situação da Terra exige mais: uma real institucionalização de um braço judiciário para cuidar das emergências climáticas

Justiça climática efetiva: uma urgência clamorosa

A expressão “Justiça Climática” tem sido utilizada em vários contextos e serve para designar as iniciativas do Judiciário de tratar com especificidade os temas ambientais. Na verdade, o recrudescimento da gravidade da situação da Terra exige mais: uma real institucionalização de um braço judiciário para cuidar das emergências climáticas.

Existem alguns passos a serem analisados. Diante do fracasso da Conferência de Copenhague, em dezembro de 2009, o Presidente da Bolívia convocou a Conferência Mundial dos Povos sobre a Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra, em Tikipaya, próximo a Cochabamba, em abril de 2010. Ali se decidiu adotar a Declaração Universal dos Direitos da Mãe Terra e se planejou criar um Tribunal Internacional que sancione os delitos ambientais.

O gesto serve de estímulo a que as Nações Unidas institucionalizem a Declaração Universal dos Direitos da Natureza e crie essa Corte Internacional destinada a julgar os atentados perpetrados contra o ambiente. A omissão da ONU fez com que, desde 2014, essa aspiração se concretize em parte, com a criação do Tribunal Internacional dos Direitos da Natureza. É uma instância fundada pela sociedade civil, com representantes de todos os continentes e integrada por magistrados de reconhecida autoridade ética e compromisso com a ideia de Mãe Terra. São nomeados por lideranças ambientalistas e defensores da natureza de diversas partes do planeta.

Não é um Tribunal provido de soberania internacional, senão uma Corte ética, nos moldes do Tribunal Russell e daquilo que funciona atualmente como Tribunal dos Povos. Seu propósito é investigar os casos de violação aos Direitos da Natureza, resultantes de práticas de Organizações Internacionais, Estados, Empresas, Comunidades e indivíduos. Uma ideia que se fortaleceu desde a Declaração dos Direitos Humanos na Constituição do Equador em 2008.

A primeira sessão inaugural desse tribunal ético foi em janeiro de 2014 em Quito, no Equador. Mas houve outras sessões em Lima (2014), Paris (2015), e Bonn (2017), com reuniões pontuais sobre temas específicos realizadas na Austrália, Bolívia, Equador e Estados Unidos.

A evolução dessa ideia de Justiça Climática deveria culminar com a criação de um Tribunal Climático análogo ao Tribunal Penal Internacional, com jurisdição suficiente para sancionar indivíduos, entidades e Estados que acordassem na aceitação desse organismo.

A vulneração ambiental é um atentado gravíssimo contra o próprio ser humano, que depende da natureza para continuar a existir. Como observa Alberto Acosta, desde 2014 magistrado do Tribunal Internacional ético situado em Quito, “virá o dia em que os Direitos da Natureza serão cumpridos, respeitados e exigidos. E oxalá não seja tarde. Todavia estamos em tempo para que nossas leis reconheçam o direito de um rio fluir, proíbam os atos que desestabilizem o clima da Terra, garantam a vida de bosques e selvas e imponham o respeito ao valor intrínseco de todo ser vivente. Está na hora de frear a tresloucada mercantilização da Natureza, como ocorreu outrora proibir a compra e venda dos seres humanos”.

Não se pode aplicar à Natureza a lógica do mercado. É urgente a adoção de uma estratégia pós-extrativista e fazer uma transição distinta da transição energética. A transição do padrão de civilização capitalista excessivamente antropocêntrica, para um paradigma biocêntrico. Pois, ainda segundo Acosta, “uma nova civilização não surgirá por geração espontânea, nem será o resultado da gestão de um grupo de pessoas iluminadas. Trata-se de uma construção e reconstrução paciente e decidida, especialmente desde âmbitos comunitários, que começa por desmontar vários fetiches (começando pelo fetiche do dinheiro, da ganância, do crescimento econômico, entre outros temas assumidos como verdades indiscutíveis) e em propiciar câmbios radicais a partir também de experiências existentes”.

Por incrível possa parecer, há muitos indivíduos que, discreta ou anonimamente, já praticam Justiça Climática, emprestando a sua solidariedade e a vivência do espírito fraterno, para cuidar do ambiente como entidade coirmã. Assim como praticava Francisco de Assis, o homem do milênio, que – em pleno século 13 – já chamava a água de irmã!

Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 14 02 2025



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