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O SÁBIO PROTEGE A FLORESTA
Acadêmico: José Renato Nalini
O colonizador via o pau-brasil como mercadoria, não como dádiva espontânea da Providência.

O sábio protege a floresta

É uma falácia, uma fake News, antagonizar lavoura e meio ambiente. O verdadeiro sábio – e quem trabalha com a terra e na terra tem propensão à sapiência – não desconhece que a preservação é essencial à melhor produção agrícola.

Verdade que há uma parcela considerável do agronegócio que se comporta como um "ogronegociador". É aquela que envenena o solo com herbicidas proibidos em seus países de origem, mas vendidos descaradamente entre os primatas, os incultos, os moradores dos países atrasados, quase sempre situados nos trópicos. São os que preferem fabricar desertos, em lugar de converter o Brasil no celeiro do mundo e no jardim ecológico propiciador do mais lucrativo ecoturismo.

O amor pelo verde não é recente no Brasil. José Bonifácio de Andrada e Silva se impressionara com a destruição da mata portuguesa e voltou para cá disposto a salvar as nossas, que também estavam se degradando. O colonizador via o pau-brasil como mercadoria, não como dádiva espontânea da Providência.

Dentre os defensores do verde encontra-se o jundiaiense Manoel Elpídio Pereira de Queiroz (1826-1915), em cuja correspondência se encontra uma carta encaminhada ao seu vizinho de terras, o Padre João Manoel, hoje uma importante rua dos Jardins, na capital.

Nessa missiva, escrita ao estilo da época, a segunda metade do século XIX, o jundiaiense reclama por ter sido "avisado que seus madeireiros estavam tirando madeiras nas terras deste sítio". Imediatamente foi à fazenda e como o administrador ignorasse ordens do proprietário, Manoel Elpídio ordenou que cessassem a extração, até que ele pudesse conversar com o sacerdote-proprietário. Acrescenta na mensagem que, sem ordem do fazendeiro de Jundiaí, fizeram uma ponte no córrego, para facilitar o transporte das madeiras. Antes de desmanchar a ponte, Manoel Elpídio consultava o Padre João Manoel e pedia providências "para que isso não se repita, pois não ignora Vossa Reverendíssima que, estragando-se as madeiras, ficam muito defeituosos os sítios".

Em 15 de fevereiro de 1852, o Padre João Manoel de Almeida Barbosa responde ao jundiaiense: "não dei ordem e nem quero que se tire um só pau das terras dos vizinhos porque, quando necessitasse, pediria ou compraria". Mas afirma que as madeiras não estão nas terras de Manoel Elpídio, senão na Fazenda do Quilombo.

Em linguagem desabrida, o Padre afirma que "é inútil se escandalizar", porque nem ele, nem seu confrontante Antônio Benedicto haviam aberto mão dessas terras, que julgam pertencer a eles. Isso enquanto "não formos convencidos judicialmente, a cuja demanda nunca recorremos porque nos julgamos com direito e bom seria que disputássemos isso logo", a ver quem ficava com essas terras. Acrescenta: "Embora não sei quem seja, por essa razão não procedi criminalmente, arrancasse o marco que se achava do meu lado e conduzisse a pedras ou as enterrasse. O lugar é bem conhecido e existem milhares de testemunhas e por isso não importa se afixasse outro, ficando o desprazer a quem arrancou, de não ter procedido regularmente e não levar água a seu moinho".

Inconformado com o desrespeito às divisas, Padre João Manoel se escusa junto a Manoel Elpídio: "Perdoe se eu o escandalizo, mas como sou muito franco e não sei ocultar coisa alguma, essa é a razão porque me escapam algumas vezes expressões com que se possam dar por escandalizados".

Jundiaí deveria honrar essa tradição e cuidar melhor do que ainda lhe resta de verde.

Publicado no Jornal de Jundiaí, em 27 07 2023



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