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ALGUMA CHANCE DE MAIS HUMANISMO?
Acadêmico: José Renato Nalini
Se os homens tivessem juízo, já teriam deixado de lado a fabricação de armas, para que esse capital fosse empregado na redução das desigualdades.

Alguma chance de mais humanismo?

A Inteligência Artificial Generativa já está fazendo coisas incríveis. Concordo com Cândido Bracher que sugere ser medo do descarte a resistência dos profissionais liberais ao uso mais intenso de ferramentas como o ChatGPT. Enquanto os ameaçados eram os braçais, não nos incomodamos muito com a automatização. Só que agora ela chega até nós. Médicos, advogados, professores, jornalistas, escritores, todos correm o risco de uma substituição com vantagens pelo sistema. Trabalho ininterrupto, sem reclamação, sem horas extraordinárias, sem cansaço.

Por que não olhar com esperança essa nova fase? Pode ser que o tempo empregado em atividades que serão executadas com proficiência maior - e mais economia - por máquinas, venha a ser destinado ao prazer. Ao entretenimento. À leitura. À conversa jogada fora.

Se os homens tivessem juízo, já teriam deixado de lado a fabricação de armas, para que esse capital fosse empregado na redução das desigualdades. A indústria bélica fabrica ferramentas letais. Algo que sequer deveria entrar na cogitação do "homo faber". Entretanto, ela prossegue e se vale de "guerra no quintal dos outros" para faturar mais.

A violência recrudesce, nada obstante aumentem as vagas nos presídios. A experiência catastrófica do sistema penitenciário brasileiro, considerado verdadeiro "estado de coisas inconstitucional" pelo insuspeito Supremo Tribunal Federal, já deveria ter sugerido que as verbas empregadas na construção de prisões, na substituição de equipamentos, na modernização de sofisticados sistemas de segurança, melhor estariam se viessem a sanar a fome de trinta e três milhões de brasileiros.

Há uma série de incongruências e de perversões que nos levam a indagar se houve algum verdadeiro progresso nestes últimos séculos. Seria verdade que a história humana registraria movimento espiral ascendente, a cada movimento um grau mais elevado no índice civilizacional? Não parece. A impressão que se tem é a de um violento retrocesso, civilização abaixo.

Uma gestão mais inteligente dos recursos naturais disponíveis levaria a uma constatação incrível: não há necessidade do trabalho contínuo, exaustivo e desalentador, a que se submetem milhões de seres humanos. Já está comprovado que a semana de quatro dias é mais produtiva do que a semana inglesa, que só reserva sábados e domingos para o descanso e que já foi considerada um enorme avanço.

De igual forma, o trabalho à distância mostrou-se inequivocamente superior. Que o diga a combalida Justiça, que viu sua produtividade aumentar consideravelmente, acordos serem realizados, profissionais do foro mais satisfeitos porque administraram melhor o seu tempo e não tiveram de se locomover até o Tribunal, a enfrentar trânsito pesado e cruel.

Mas ainda predomina em cabeças resistentes aquela ideia de que o trabalho tem de ser executado no lugar construído para uma outra era. Mentes liliputianas não se acostumam com as novas tecnologias. Não ousam pensar em poupar as pessoas ao estafante serviço exauriente de suas forças e de sua sanidade mental, em nome de convicções anacrônicas e totalmente superadas.

Houvera bom senso, discernimento e razão, já se teria descoberto que a renda mínima, pregação tradicional de Eduardo Matarazzo Suplicy, desde que ingressou na vida pública, é uma solução para os próximos anos. A chamada Renda Básica Universal - RBU, é objeto do livro "Renda Básica: uma proposta radical para uma sociedade livre e uma economia sã", publicado em 2017 e escrito por Philippe Van Parijs e Yannick Vanderborght. Ela já existe na Finlândia, em Stockton, na Califórnia, no Quênia. Em todos esses lugares, provou-se uma política estatal de resultados.

O objetivo dos governos deveria ser a satisfação plena dos cidadãos. Infelizmente, a política profissional visa a perpetuidade dos postos de poder, a sucessão hereditária, o nepotismo e a conversão de vidas simples em status milionários. É o que a história recente do Brasil e a crônica judiciária criminal registram, para desencanto nosso.

Alguém está a enxergar uma perspectiva de uma era de predomínio do humanismo autêntico, da ética, da solidariedade e da fraternidade entre as criaturas que se autoconsideram racionais?

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 04 06 2023



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