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JUÍZES DE OUTROS TEMPOS
Acadêmico: José Renato Nalini
O cargos da Magistratura eram reservados à elite que conseguia cursar a então novíssima Academia do Largo de São Francisco.

Juízes de outros tempos

O juiz brasileiro costuma reclamar de sua carreira. Excesso de serviço, muita burocracia - preenchimento de planilhas, preocupação com a produtividade - pouco reconhecimento de parte dos hierarcas que respondem pela gestão do Judiciário.

Também acreditam que não ganham bem. Para estes, há uma alternativa: procurar a iniciativa privada. Elogio aqueles que, em lugar de se considerarem prejudicados, procuram atividades em que seu talento seja remunerado adequadamente.

Entretanto, nada como lembrar como era a Magistratura antigamente. Não havia concurso. Os juízes eram nomeados pelo governo. Havia juiz de fora e juiz de direito, cujo cargo deveria ser exercido em cidades longínquas e desprovidas de qualquer infraestrutura. Para chegar à comarca, era preciso viajar de barco, depois enfrentar jornadas no lombo da mula até alcançar o lugar ermo onde não havia acomodação condigna. Por isso, era comum que as nomeações não se completassem com a posse e o exercício. Muitas cidades, inclusive as maiores, ficavam durante até quinze anos desprovidas de magistrado.

Isso sem falar na delinquência que ocupava os espaços vazios e que ameaçava de morte - e executava a ameaça - para os incautos que se arriscassem a tomar posse em lugares perigosos.

Ainda assim, os cargos da Magistratura eram reservados à elite que conseguia cursar a então novíssima Academia do Largo de São Francisco. Nomes fidalgos, da nobreza imperial da época, dentre os quais se destaca Luís Fortunato de brito Abreu Souza Menezes. Um fluminense que nasceu na Corte, em 1814. Formou-se na primeira turma daquela escola que viria a ser a FADUSP. Nomeado juiz de fora da Praia Grande, não se acostumou e deixou a magistratura para exercer a advocacia no Rio. Depois retornou à carreira e foi juiz de Itaboraí e Juiz de Órfãos da Corte.

Chegou a ser desembargador em 1845 e, em seguida, Ministro do Supremo Tribunal de Justiça. Após aposentar-se, voltou à advocacia. Tão fidalgo, que a Casa Imperial o tornou Comendador da Ordem de Cristo e da Ordem de São Gregório Magno.

Como era muito relacionado, foi o primeiro presidente do famoso "Cassino Fluminense", fundado em 1845 e frequentado pelo Imperador. Seu filho, Luís Fortunato de Brito Abreu Sousa Menezes Filho, bacharelou-se pela São Francisco em 1863.

Um episódio interessante na vida de Luís Fortunato. Como juiz, tinha de enfrentar as viagens provocadas pelas designações para responder por comarcas distantes. Chegou uma noite a uma humilde casa de pasto, pois não havia hotéis como os que agora se conhecem.

Lá de dentro, alguém indagou: - "Quem bate? O que quer?".

Ele respondeu: "Luís Fortunato de Brito Abreu Souza Menezes".

Então o responsável pelo pouso retrucou:

"Não há cômodo suficiente para tanta gente!".

Os nomes intermináveis eram sinal de nobreza. Basta lembrar os prenomes dos nossos dois Imperadores.

Àquela época, o desempenho da judicatura também costumava causar depressão, estresse, uma série de síndromes e anomalias mentais, algo muito natural para quem não se prepara emocionalmente para o desafio. Se os concursos hoje não respondem à necessidade do sistema Justiça, pois priorizam apenas a memorização de informações, a nomeação pura e simples de alguém recomendado também não primava pela exatidão e acerto da escolha.

O juiz Manuel Alves Alvim, paulistano que nasceu na capital em 1804, ao formar-se em 1832 foi nomeado juiz de fora da Campanha. Depois disso, passou a exercer a judicatura em Bananal, então um burgo florescente, rico e habitado pela nobreza da terra. Judicou durante longos anos. Ao final, tornando-se devoto em demasia, ao sair à rua com as filhas, costumava repetir: "Seriedade! Seriedade! Muita seriedade!".

Advertência que também serve hoje, pois a função de juiz, para quem não se impregnar de uma ética irrepreensível - comando contido no Código de Ética da Magistratura Nacional - é uma profissão de risco. Portanto, magistrados e futuros candidatos à Magistratura: "Seriedade! Muita seriedade!".


Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 25 05 2023



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