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DIVORCIAR CUSTA CARO?
Acadêmico: José Renato Nalini
Quando realizado em juízo, o divórcio é pago por toda a cidadania, pelos contribuintes que honram a elevada carga tributária brasileira.

Divorciar custa caro?

A Juíza Maria Paula Branquinho Pini elaborou dissertação de Mestrado Profissional junto ao CEDES - Centro de Estudos de Direito Econômico e Social, sob orientação da Professora Maria Tereza Aina Sadek. Com a experiência na Magistratura, elaborou trabalho de fôlego, encarregando-se de exaustiva pesquisa de campo. O resultado foi uma dissertação que impacta, pois mergulha na realidade e não fica na retórica estéril que só tem servido para adornar o Currículo Lattes dos envolvidos.

A partir de evidências, conseguiu bem definir o panorama em que o assunto divórcio se insere. Apurou que o divórcio extrajudicial é obtido em prazo médio doze vezes menor do que o judicial, embora este recaia na preferência de partes e advogados.

É a simbologia do Judiciário, ainda a preponderar quando os divorciandos têm à sua disposição a celeridade extrajudicial ou a singeleza dos CEJUSCS, Centros Judiciários de Solução de Conflitos e de Cidadania.

A cultura jurídica é algo que explica a resistência à migração de boa parte dos trabalhos hoje cometidos ao Judiciário para que sejam apreciados e solucionados no âmbito das delegações extrajudiciais, serviço estatal que, após 1988, adquiriu notável eficiência. Eficiência que deriva da inspiração privada que se imprimiu a tais préstimos.

A mais inteligente estratégia do constituinte de 1988 tem dado certo. Como o delegatário é recrutado por severíssimo concurso público de provas e títulos, a cargo da Justiça Estadual em cada uma das vinte e sete entidades da Federação, a titularidade das serventias é entregue a pessoal qualificado. Não é raro que juízes e promotores deixem a Magistratura e o Ministério Público para o exercício de uma atividade que não é tolhida pela compulsória.

Mais do que isso, ao conferir aos antigos cartórios a filosofia da iniciativa privada, instiga seus responsáveis a buscarem - incansavelmente - a eficiência que, em regra, o serviço público não tem.

Por isso é que se pode traçar uma linha divisória muito nítida entre o que eram cartórios antes de 1988 e o que ocorreu nestes quase trinta e cinco anos de Constituição Cidadã. As delegações extrajudiciais se modernizaram, se automatizaram, se tornaram eletrônicas, dando um show de assimilação das mais modernas tecnologias a serviço da Justiça.

O melhor: não há custos para o Estado. Ao contrário, ele extrai dos serviços extrajudiciais um percentual significativo. A remuneração fica a cargo do usuário e o Estado - o governo - não coloca um centavo nas delegações.

Por isso é que a dissertação de Mestrado de Maria Paula Branquinho Pini alerta para alguns pontos de aperfeiçoamento que devem ser levados em conta pelo Poder Judiciário Estadual e também pelo Parlamento. Ainda há muitos préstimos gratuitos, o que parece contrassenso, quando a parte dispõe de condições econômicas de custear os serviços prestados.

Quase todos os divórcios pesquisados obtiveram justiça gratuita. Mas é o caso de se indagar: "Gratuita para quem?". Quando realizado em juízo, o divórcio é pago por toda a cidadania, pelos contribuintes que honram a elevada carga tributária brasileira. Onerado o Erário com o custeio de uma tentacular estrutura, que só tem crescido no Brasil, ao contrário do que acontece no Primeiro Mundo.

Também não se justifica a entrega da solução do dissenso entre notário e parte, quanto à condição financeira dos interessados, ao Juiz Corregedor. Se houve transferência do trâmite de separações e divórcios do foro para os tabelionatos, não se pode onerar a Justiça para decidir a questão. Invalida-se a prática da transferência da chamada "jurisdição voluntária" para o extrajudicial, fazendo com que um incidente retorne à apreciação judicial.

Outros problemas assinalados na dissertação decorrem da falta de expertise dos funcionários, que cadastram manualmente processos físicos de forma equivocada. Aliás, os concursos públicos para seleção de quadros funcionais deveriam priorizar outras competências, que não apenas a capacidade mnemônica do candidato.

É urgente repensar o ensino jurídico, para que os bacharéis em direito retomem a consciência de que a ciência jurídica existe para mitigar problemas, para solucioná-los quando possível, não para torná-los ainda mais complexos. A leitura da dissertação de Maria Paula Branquinho Pini é interessante para todos aqueles que tratam do assunto e para mostrar que, se não houver consciência dos profissionais envolvidos, a obtenção do divórcio não custa apenas em tempo e angústia. Pode custar também muito dinheiro.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 15 03 2023



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