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NÃO ADIANTA FUGIR
Acadêmico: José Renato Nalini
Não adianta fugir do futuro. Ele entra em nossa vida, queiramos ou não

Não adianta fugir

Refém das redes sociais, interesso-me por tudo o que elas veiculam, embora ciente de que há muita inverdade a circular. Mas o futuro me apaixona, embora não possa contar muito com ele. Enquanto estiver aqui, quero participar de tudo aquilo que a ciência e sua serva, a tecnologia, nos oferecerem para tornar a vida mais saudável, mais harmônica, mais de acordo com a natureza.

Recebi, como outras pessoas também receberam, um vaticínio que surpreende e não deixa de angustiar. Dentre outras previsões, está a de que desaparecerão as oficinas de reparação de automóveis. As "mecânicas" hoje tão comuns, não terão mais razão de existir. É que o motor flex ou o comum, que funciona a gasolina e a diesel, tem mais de vinte mil peças. O motor elétrico tem apenas vinte. Os carros elétricos fruirão de garantia vitalícia e só serão reparados pelas concessionárias. Em dez minutos se remove e se substitui um motor elétrico. É a vitória da economia circular.

Se algum motor elétrico tiver defeito, será encaminhado a uma oficina regional que trabalha apenas com robôs. Se acender um aviso luminoso no carro elétrico, o motorista terá à disposição um espaço que lembra um lava-rápido. O carro é rebocado e enquanto o dono fica a conferir mensagens no celular, volta o carro com novo motor perfeito.

É óbvio que os postos de gasolina desaparecerão. A cada esquina haverá aparelhos que recarregarão o carro elétrico. Os maiores fabricantes de automóveis inteligentes já fizeram a transição e só produzirão veículos movidos a energia elétrica.

A natureza vai agradecer o desaparecimento das indústrias que necessitam de carvão. Também não serão necessárias as grandes produtoras de petróleo. A energia será outra e será verde. O hidrogênio verde é a bola da vez. Chance excepcional de que o Brasil precisa se aproveitar.

Cada residência terá condições de produzir e de armazenar mais energia elétrica durante o dia e a capacidade ociosa será devolvida para a rede. A empresa que abastece todas as demais será a fornecedora do excesso.

Por isso, aquela civilização que se equivocou ao trocar o trem pelo automóvel, o veículo mais egoísta que se possa imaginar, está prestes a se extinguir. As crianças do futuro nem acreditarão que nossas ruas ficavam repletas de carros poluidores e que existiu, na história do mundo, um pesadelo chamado trânsito.

Tudo isso já existe e já está disponível em países mais adiantados. Mas embora possa demorar um pouco para chegar ao terceiro ou quarto mundos, o futuro é irrefreável. Basta mencionar, como exemplo, que a Kodak possuía em 1998, quase duzentos mil funcionários e vendia 85 de todo o material fotográfico do mundo. Em poucos anos o seu modelo de negócios desapareceu, como o papel carbono, como a fita das máquinas de datilografia, como a geleia que reproduzia balancetes, como os chapéus, os grampeadores, os fichários e tanta coisa mais. É preciso enfatizar que hoje todos são fotógrafos? Em qualquer concentração de pessoas, como a apresentação de um popstar, preste atenção quantas luzes de celulares se acendem. Sobrevivem os fotógrafos verdadeiramente artistas. No mais, toda a população fotografa para eternizar sua memória afetiva.

O fenômeno que atingiu a Kodak e a Polaroid ocorrerá com inúmeros setores nos próximos anos. A Inteligência artificial continuará a criar surpresas como o Uber e o Airbnb. A maior frota de veículos de aluguel não possui um só carro e a maior rede hoteleira do planeta não é proprietária de um só imóvel. Nos Estados Unidos, jovens advogados não conseguem empregos por causa do Watson da IBM, que presta assessoria jurídica em segundos, com 90 de acerto, em cotejo com os 70 daquela prestada por humanos.

Muita novidade já está disponível. Muitas outras surgirão nos próximos anos. Precisamos estar aptos a usufruir delas. E resilientes, preparados quanto a seus impactos, prontos a animar a juventude a procurar outras profissões e a se acostumar com o inesperado. Ele sempre irrompe e modifica nossos planos. Mas o intuito das novas descobertas é permitir que a humanidade tenha uma sobrevida mais duradoura do que teria se permanecesse na insanidade cruel de destruir a natureza.

Não adianta fugir do futuro. Ele entra em nossa vida, queiramos ou não. O homem precisa se compenetrar de que é incapaz de segurar a tempestade com as mãos.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 14 03 2023



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