Compartilhe
Tamanho da fonte


A INDEPENDÊNCIA E A RELIGIÃO
Acadêmico: José Renato Nalini
Pouca gente se aterá ao fato de que o gesto de Pedro I repercutiu também na Igreja

A Independência e a religião

As celebrações do bicentenário da Independência do Brasil contemplarão inúmeros aspectos desse episódio em que se romperam os laços com a metrópole. Pouca gente se aterá à circunstância de que o gesto de Pedro I repercutiu também na Igreja Católica, então a religião oficial de nossa Nação.

O Imperador Pedro I foi coroado no Rio de Janeiro, numa tradicional cerimônia litúrgica. Seu sentido é exprimir que o próprio Deus confere poder ao governante. Expressão emblemática da teoria do direito divino do monarca, ressuscitado por Bossuet na França, quando o poderio dos senhores feudais ameaçava a soberania.

A partir de um texto do apóstolo Paulo - todo o poder vem de Deus - a coroação dos soberanos quase se converteu num oitavo sacramento. Por isso o teor do sermão proferido por um sacerdote franciscano, durante a pomposa solenidade de coroação do primeiro monarca do Império nascente.

Ele proferiu longa oração, da qual se extrai: "Nós vemos hoje reproduzida esta misteriosa cerimônia sobre a Pessoa de um Príncipe, que o céu deu ao Brasil na época em que o monstro do despotismo nos mostrava além dos mares essas mesmas cadeias, arrancadas dos nossos pulsos; dum príncipe que, marchando intrépido sobre os punhais dos nossos inimigos, como o primeiro e o mais zeloso propugnador dos nossos direitos, subiu ao trono imperial levado pelo justo entusiasmo de uma aclamação já repetida em todas as províncias, e hoje vem receber aos pés dos altares a unção dos reis para adiantar, com a força da religião, o estabelecimento da nossa prosperidade, adquirindo por isso mesmo novos títulos ao nosso respeito".

O orador era também festejado pregador, com tino político. Pois não poupou elogios ao governante: "Nós já o devemos considerar como o Ungido do Senhor, respeitável pelas convenções sociais mais antigas, inviolável pela sanção política e religiosa, como uma pessoa ligada com os interesses da Nação, porque nele temos o defensor desta Constituição, que nos deve dar uma idade de ouro, desconhecida nos dias de nossos pais e tão próxima de nós, porque já vemos enterrado debaixo do trono imperial este infame sistema de escravidão, que entorpecia nossa indústria e nosso comércio, nos campos e nos mares, onde daqui adiante o nosso pavilhão mostrará a Independência, a Liberdade Política, a glória do Brasil regenerado".

O orador procura enaltecer as vantagens da monarquia, evocando a história da Grécia, Israel, Egito, Pérsia e China: "A inviolabilidade dos reis, um dos maiores dogmas políticos, inculcados pela mesma religião, é o penhor da paz, da prosperidade e da fortuna das Nações". A Grécia, "vingadora da liberdade, a inimiga dos tiranos, nos dá o exemplo deste respeito na primitiva criação das monarquias reguladas pela sabedoria das leis, que concorreram tanto para a felicidade dos povos. Vemos as tribos de Israel fugindo da teocracia, abandonando o governo dos juízes, os conselhos dos velhos e dizendo ao Pontífice que os dirigia com os oráculos do propiciatório: "Constitui-nos um rei, como o têm todas as nações, para que ele nos julgue". E conclui: "Hermes no Egito, Zoroastro na antiga Corte dos Dários, Confúcio na China, Brama na Índia, perpetuaram estas ideias a respeito" da monarquia, algo infinitamente superior à república.

Basta comparar a Grã-Bretanha, a Suécia, a Dinamarca, a Holanda, a Espanha, com esta nossa república, nascida num rompante de ingratidão perpetrado contra o pai do Imperador coroado em 1º.12.1822.

Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião
Em 26 05 2022



voltar




 
Largo do Arouche, 312 / 324 • CEP: 01219-000 • São Paulo • SP • Brasil • Telefone: 11 3331-7222 / 3331-7401 / 3331-1562.
Imagem de um cadeado  Política de privacidade.