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VIAGEM
Acadêmico: Gabriel Chalita
"Importa saber o que nos importuna, o que nos pesa, o que nos rouba a paz. Há paz no nosso interior. Certamente, há. E é para lá que deve nos levar a nossa viagem."

Há muitos que tiram as férias em julho. E saem em viagem. Viajam, alguns, para outros países. Viajam, outros, para cidades litorâneas ou montanhas ou casa de parentes. Há os que preferem viajar para o interior, para viver o sossego de dias calmos. Interior? Essa é uma viagem necessária.
Há que se ter coragem e sabedoria para tirar férias. Férias não são apenas interrupções de trabalho ou de estudo. Há os que não conseguem deixar de trabalhar. Conta uma antiga história que um carteiro trabalhava arduamente entregando cartas. A quem o perguntasse se era bom o que fazia, a resposta era decisiva. "É muito penoso. Entrego cartas, enfrento cães ferozes, endereços errados, portões enferrujados. Decididamente, é um árduo trabalho". Foi quando alguém resolveu amenizar. "É, mas pelo menos você tem as férias". O carteiro foi ainda mais incisivo. "Nossa, eu trabalho esperando as férias". O interlocutor quis saber. "E o que você faz, então, nas férias?". O carteiro pensou um pouco e optou pela sinceridade. "Bem, como eu não sei muito o que fazer, eu acabo acompanhando o meu substituto, fazendo companhia para ele, entregando cartas".
Reinventar os dias não é tão simples. Há tantos que sonham com a liberdade. Que se encontram trancafiados em relações não saudáveis. Mas, quando chega a tal liberdade, frustram-se na ausência de conflitos. Há os que se aposentam e adoecem. Mas não buscavam isso? Não queriam mais tempo para si mesmo e para os seus? O que houve, então? Faltou uma viagem ao interior. Férias reais.
Viajar pelo nosso interior é o que nos limpa de tantas sujeiras que vamos acumulando pelo excesso da falta de tempo. Estranho, não? Percorremos tecnologias e confortos para que tivéssemos mais tempo. O que aconteceu? Viajamos por redes tecnológicas, por mensagens de conhecidos ou estranhos, por assuntos variados, lambuzamo-nos de informações, algumas decididamente mentirosas. E, mesmo assim, passamo-las adiante. E o que melhorou?
Não quero viajar nas saudades. Dizer que os tempos de ontem eram melhores. Que éramos mais atentos ao outro, menos dispersos, talvez. Cada tempo tem as suas idiossincrasias. Mas é no nosso tempo que precisamos arrumar um tempo para fazer uma viagem ao nosso interior. Pensar nas escolhas que fizemos. Se acertamos ou não. Se há tempo para mudar. Se será melhor mudarmos. Se estamos encontrando significado na nossa vida, e se a nossa vida dá significado à vida de pessoas que amamos ou que convivemos ou que nem conhecemos.
Viajar pelo nosso interior para pensar sobre o nosso temperamento, sobre as nossas atitudes, sobre as implicâncias e as desistências. Não importa a nossa idade. Vidas podem ser reinventadas. Importa saber o que nos importuna, o que nos pesa, o que nos rouba a paz. Há paz no nosso interior. Certamente, há. E é para lá que deve nos levar a nossa viagem. Para um recanto de paz que mora dentro da gente mesmo e que, às vezes, fica longos períodos sem receber visita. Reparem que é comum conversarmos sobre nossos problemas com muita gente. Narramos detalhes das histórias que nos incomodam. E com a gente mesmo? E com o silêncio necessário para que pensemos.
Platão foi um de tantos pensadores que ensinaram que os erros são frutos da ausência de pensamento. Pensar antes de fazer. Parece simples. Simples é o nosso interior. Que, se for visitado, nos dará as melhores férias das nossas vidas. E quem sabe será tão agradável que aproveitaremos para viajar sempre. Não se preocupem com custos ou distâncias. Basta a decisão. O aprendizado. O silêncio. O pensamento. E as consequências serão surpreendentes. Descarte de entulhos embolorados. Limpeza. E muito mais disposição para o que vier pela frente.
Essa viagem será um presente que daremos a nós mesmos e aos que conosco convivem. Ninguém leve pesa sobre os outros. Boa viagem.




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