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NÃO É DIFÍCIL DEFENDER A NOVA PREVIDÊNCIA
Acadêmico: Roberto Duailibi
"Ao longo dos anos, no entanto, essa relação mudou. A ciência evoluiu, vieram as políticas de prevenção a doenças, novos remédios e técnicas e uma crescente urbanização. Os hábitos da população mudaram. "

Quando eu era criança e até minha adolescência considerava velhos os meus tios na faixa dos 45 anos de idade. Era natural. As pessoas morriam cedo, poucos chegavam aos 60 anos de idade, ainda mais em Mato Grosso. Outro aspecto comum era o elevado número de filhos. As pessoas tinham famílias numerosas com 5, 6 ou mais filhos — na minha família éramos sete. Só por isso já se justifica a necessidade de uma nova Previdência. Como os jovens começavam a trabalhar muito cedo, na faixa dos 13 ou 14 anos de idade, havia um contingente imenso de gente contribuindo para a Previdência, o que permitia a aposentadoria com folga dos poucos velhos que usufruíam os benefícios.

Ao longo dos anos, no entanto, essa relação mudou. A ciência evoluiu, vieram as políticas de prevenção a doenças, novos remédios e técnicas e uma crescente urbanização. Os hábitos da população mudaram. Hoje, velhinhos de 80 anos, como eu, estão na academia, viajam, têm uma vida saudável. Ao mesmo tempo, as famílias, por conta do custo de vida e, também, de mudanças culturais e educação, passaram a ter menos filhos. Paralelamente a tudo isso, surgiu ainda a economia informal, que, na maioria das vezes, não contribui para a Previdência. O resultado desse quadro é que há um envelhecimento da população e a curva se inverteu, há menos pessoas contribuindo para um mundo de pessoas na outra ponta, da aposentadoria. Por isso a conta não fecha.

Mas, o que é mera percepção, pode ser também facilmente comprovado por números. Fui atrás dos dados. Descobri, por exemplo, que a expectativa média de vida do brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), está em 76 anos. Esse número representa um salto de 22 anos em relação ao que era registrado nos anos de 1960, quando as pessoas viviam em média 54. Por conta disso, naturalmente, a população cresceu bastante, somos 208,4 milhões de habitantes.

Outro dado muito curioso é o de velocidade de crescimento dessa população. Em 1960, o Brasil era formado por apenas 70 milhões de pessoas e saltou para 190,7 milhões em 2010. Ou seja, num lapso de 50 anos. O mais impressionante, contudo, é o crescimento do número de idosos que em 1960 era de 3,3 milhões de brasileiros com 60 anos ou mais e representavam 4,7% da população. Em 2000 passou a 14,5 milhões, ou 8,5% dos brasileiros. Ou seja, houve uma duplicação de pessoas nessa faixa etária. Dez anos depois, em 2010, esse porcentual passou a 10,8%, com 20,5 milhões de idosos.

Esses dados, somente eles, já deveriam ser suficientes para mostrar a todos que a reforma da Previdência é mais que necessária. Mas, e na outra ponta, dos jovens que estão entrando no mercado de trabalho? Para que as pessoas não fiquem apenas com a opinião, com o ponto de vista político, fui pesquisar a taxa de natalidade. Em 1940 a média de filhos das famílias brasileiras era de 6,16 e em 2014 estava em somente 1,57. Não bastasse essa informação, o início oficial das pessoas no mercado de trabalho, hoje, só pode se dar por lei a partir dos 16 anos de idade. Até pouco tempo esse limite, oficialmente, era de 14 anos de idade. Hoje, só é possível entrar no mercado com menos de 16 anos na condição de aprendiz. Ou seja, são dois anos a menos de contribuição para o sistema, algo que acaba por afetar a conta final.

Espero que ninguém se tenha perdido em meio a tantos números. A intenção era ser o mais didático possível, mostrando algo que já era para ter sido percebido pela maioria da população. A cada dia que passamos sem uma mudança importante no sistema previdenciário a situação se agrava ainda mais: sem recursos, não é possível ao governo investir em educação, segurança e saúde. É como se todos os impostos que pagamos servissem apenas para manter a máquina previdenciária.

Até agora não vi nenhum gráfico e nenhuma demonstração mostrando esses números. A discussão, que poderia ser racional, ficou só emocional. E é através da emoção, apoiada pelo conhecimento, que se conseguirá o apoio para a aprovação.

Roberto Duailibi é publicitário e membro da Academia Paulista de Letras

Publicado em O Globo, em 09/05/2019.
https://oglobo.globo.com/opiniao/artigo-nao-dificil-defender-nova-previdencia-23651284





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