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ESPERANÇA PARA OS LIVROS
Acadêmico: José Renato Nalini
É urgente o movimento para a revalorização da biblioteca e do livro, hoje tão pouco lido pela maior parte dos usuários de redes antissociais que disseminam, preferentemente, a chacota, o humor de baixa extração, o mau gosto, a ira e o ódio

Esperança para os livros

Para quem se alarma com a proliferação de más novas, a notícia de que a Biblioteca da Faculdade de Direito da USP completa duzentos anos é um alento. É a mais antiga biblioteca pública de São Paulo e tem acervo físico de meio milhão de livros. Dentre estes, quase sete mil são obras raras, produzidas entre os séculos dezesseis e dezenove.

Melhor notícia ainda, a construção de um novo prédio de dez andares, com oito mil metros quadrados, na Rua Riachuelo. Haverá espaços de estudos e ambientes para armazenamento do acervo, além de um anfiteatro no último andar, com vista panorâmica para o centro histórico.

Dentre as preciosidades contidas na Biblioteca da FADUSP, está a Enciclopédia de Diderot, do século 18 e a edição da Divina Comédia de Dante, impressa na Itália no século 16. Também ali se guarda um exemplar de “Princípios de Direito Natural”, de 1829, publicada pelo primeiro professor nomeado para a Faculdade de Direito, José Maria de Avelar Brotero.

Incrível pensar que a pesquisa nos livros da Biblioteca seja feita pelos alunos da Pós-graduação, principalmente – (eu pesquisei lá, quando orientado pelo notável Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, para obtenção dos graus de Mestre e Doutor) – mas também por populares e até moradores de rua.

Ela nasceu com a doação da biblioteca de Frei Manuel da Ressurreição, o terceiro bispo da Diocese de São Paulo (1774-1789), que destinou seus dois mil volumes “para a utilidade comum do clero e estudantes”. Em 1810, ela cresceu com a doação do acervo do bispo de Funchal, dom Luiz Rodrigues Villares, paulistano de nascimento. Com a morte do bispo Dom Mateus de Abreu Pereira, em 5.5.1824, o presidente da Província, Lucas Antonio Monteiro de Barros, adquiriu o acervo para abrir a primeira biblioteca pública paulistana.

Esquecido hoje, o primeiro bibliotecário da Instituição foi José Antonio dos Reis, órfão negro criado pelo cônego da Sé. Aos quinze anos, inscreveu-se no curso de Filosofia aberto por Frei Francisco Montalverne e era tão bom aluno, que o bispo Dom Mateus Abreu Pereira o acolheu. Ordenou-se sacerdote em 1821, assumiu o cargo de bibliotecário até 1833, quando foi nomeado bispo pelo Papa Gregório XVI e assumiu a diocese de Cuiabá.

Muitas outras doações enriqueceram a Biblioteca, assim como a do tenente-general José Arouche de Toledo Rendon, primeiro diretor da faculdade, assim como as coleções de Mário Marzagão, Waldemar Ferreira, Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araújo Cintra, Cássio Mesquita de Barros, Jose Afonso da Silva, Vicente Marotta Rangel e outros.

A essa boa notícia se adiciona a da revitalização da Biblioteca do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, também preciosa e hoje instalada no edifício esférico anteriormente ocupado pelo Hilton Hotel, na avenida Ipiranga. É a segunda maior biblioteca paulistana e foi gradualmente enriquecida com a biblioteca dos antigos desembargadores, que eram verdadeiros devotos de seus livros.

Outra excelente biblioteca é a da Academia Paulista de Letras, que possui mais de cem mil exemplares, muitos deles raríssimos. Também fruto da doação de acadêmicos. Ainda não foi escrita a sua história. Sei que, recentemente, doaram os seus acervos para a “Casa de Cultura por excelência de São Paulo”, como costuma dizer Ives Gandra da Silva Martins, os acadêmicos Célio Salomão Debes, grande estudioso de Washington Luiz, o fabuloso arquiteto Benedito Lima de Toledo, parte da coleção afetiva de Paulo Bomfim e parcela dos livros de Lucas Nogueira Garcez. Quando faleceram os irmãos Nogueira Garcez, todos estudiosos e leitores das obras que nunca deixaram de comprar, havia mais de cento e cinquenta mil volumes.

Em fase de “queda do teto”, por infiltração, a Academia Paulista de Letras não podia comportar todos os volumes. Foram distribuídos e, aquilo que teria ocorrido em país bem adiantado, a formação de uma “Biblioteca da Fundação Nogueira Garcez”, foi diluído entre inúmeras outras coleções.

É urgente o movimento para a revalorização da biblioteca e do livro, hoje tão pouco lido pela maior parte dos usuários de redes antissociais que disseminam, preferentemente, a chacota, o humor de baixa extração, o mau gosto, a ira e o ódio. Os bons sinais nos inspirem e animem a prosseguir na defesa dos livros e das bibliotecas.

Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 25 04 2025



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