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INCOERÊNCIAS POÉTICAS
Acadêmico: José Renato Nalini
Medeiros e Albuquerque é uma personalidade instigante na História do Brasil

Incoerências poéticas

José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros e Albuquerque (1867-1934) produziu literariamente durante quase meio século. Na verdade, escreveu por quarenta e sete anos. Incursionou pela poesia, que abandonou quando se entregou à abundante prosa, a ela voltando pouco antes de morrer. Em 1933, publicou “Quando eu falava de amor”, um ano antes prefaciou a edição das “Poesias Completas de D. Pedro II”, que ele próprio organizou.

A incoerência está em que ele foi ferrenho republicano. Participou da organização do movimento que culminou com o golpe de 15 de novembro de 1889, tramando contra o magnânimo Imperador. Junto com Alcindo Guanabara e de Silva Jardim, converteu-se em voz implacável na luta pela extinção da Monarquia, viajando do Rio para São Paulo em missão delegada por Aristides Lobo e em companhia de Francisco Glicério e Campos Salles.

Nunca deixou de combater o Imperador, mesmo depois de sua deposição. O que o teria levado a organizar o livro com toda a produção poética do injustiçado Pedro, alvo de uma das ingratidões mais clamorosas já praticadas no Brasil e prefaciar a edição?

Medeiros e Albuquerque é uma personalidade instigante na História do Brasil. Destacou-se no jornalismo republicano gerindo “O Clarim”, como também dirigiu, no período florianista, o jornal “O Fígaro”. Aqui denunciou a iminência de um golpe contra o governador de Pernambuco. Em sinal de reconhecimento, o chefe do Estado o fez eleger-se Deputado Federal em 1894. Dois anos depois, é um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Ocupou a Cadeira 22, por ele instituída em homenagem ao patrono José Bonifácio, o moço.

Escreveu contos, alguns em colaboração com Afonso Celso, Afrânio Peixoto, Augusto de Lima, Maurício de Medeiros e Roquette-Pinto. Também publicou o romance “Mistérios”, um dos três que elaborou, produto de uma parceria com Afrânio Peixoto, Coelho Neto e Viriato Correia. Tornou-se célebre a proferir conferências que, reunidas, formam mais de doze volumes. Temas literários, orações políticas, saudações acadêmicas. É autor de uma crônica acerca dos homens e das coisas da Academia Brasileira de Letras, além de cinco ensaios sobre história e crítica literária e dois livros de doutrina política. Após sua morte, foram publicados dois volumes: um com o seu ideário pessoal e outro com as polêmicas que travou ao longo da vida.

Polímata, também perpetrou trabalhos científicos em quatro volumes, que incluem ensaio sobre hipnotismo, com prefácio de Miguel Couto e Juliano Moreira e escrito pedagógico sobre as técnicas de medir a inteligência e a instrução de estudantes. Memorialista, deixou dois volumes autobiográficos e um relato de viagens.

Impulsivo e irascível, incompatibilizou-se com Prudente de Morais e preferiu sair do país, para evitar o quadriênio castrense do Marechal Hermes da Fonseca. Foi então que pretendeu naturalizar-se turco. " - nasci para ser turco", teria dito a João do Rio, segundo relata Humberto de Campos. João do Rio o encontrara por acaso em Istambul, “de cócoras, de fez à cabeça, fumando um narguilé na ponte de Galata”.

Humberto de Campos vai além. Alude a um inacreditável harém que Medeiros de Albuquerque teria mantido em Constantinopla, “guardado por quatro eunucos da Ásia Menor e enriquecido, diariamente, por novas circassianas trazidas do interior por seus agentes, que eram os agentes do próprio sultão”. Para confirmar esse “gosto de ser turco”, há uma foto datada de 1912, em que Medeiros aparece em “exercício de adaptação à indumentária turca”, envergando barrete, bombachas de sultão, colete e cinto largo de seda, sob o qual sustenta, atravessada, uma lâmina de ponta. Ele também tinha a mania de usar, no exterior, a velha farda de Coronel da Guarda Nacional. Curtia o prazer de “sentir-se desconhecido em terras distantes e exóticas”. Durante a guerra, principalmente, isso lhe era de grande utilidade. Fardava-se, ia para a Gare du Nord. Recebia continências dos soldados que estranhavam o fardamento desconhecido.

Não custa lembrar que se deve ao próprio Medeiros de Albuquerque, segundo Hunmberto de Campos, o uso obrigatório do fardão na Academia Brasileira de Letras. Está explicado!

Publicado no Blog do Fausto Macedo, em 07 03 2025



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