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Acadêmico: José Renato Nalini O bom é que o povo está acordando. Cada vez mais brasileiros conseguem enxergar o risco a que a sociedade humana está submetida. Qualquer pessoa capaz de ver e de ouvir, emocionou-se com o cenário dantesco de fogo em todos os biomas
Confiar na cidadania Nesta República assimétrica em que o constituinte erigiu o município em entidade federativa, mas concentrou todos os poderes na União, fica difícil fazer com que a cidadania efetivamente atue na gestão da coisa pública. O constituinte acenou também com a Democracia Participativa, diante da pré-falência da Democracia Representativa. Quem é que hoje se sente efetivamente representado, mormente nas casas legislativas, de onde deverão provir – ou, melhor dizendo, “deveriam provir” – as regras do jogo. Dentre os graves problemas enfrentados pela nacionalidade, o mais sério é a emergência climática. Depois de catástrofes ocorridas em nosso território, o negacionismo deveria se recolher e parar com a fábrica de bobagens que invadem as redes sociais. O bom é que o povo está acordando. Cada vez mais brasileiros conseguem enxergar o risco a que a sociedade humana está submetida. Principalmente após o lastimável espetáculo das queimadas que incendiaram o Brasil, o percentual de brasileiros que detecta perigo imediato passou de 52 em junho de 2024, para 60 em outubro. Qualquer pessoa capaz de ver e de ouvir, emocionou-se com o cenário dantesco de fogo em todos os biomas. Para deixar ainda mais triste a situação, houve fogo provocado. Dizem que por facções criminosas. A que ponto chegamos, que elas existem, fala-se delas, mas elas continuam desenvoltas, atuando nas atividades negociais e se entranhando na política. Quase metade da população brasileira foi afetada pela fumaça expelida pelo fogaréu. Essa parcela esperava mais da União. Afinal, o governo federal arrecada com vigor, cresce desmesuradamente e os serviços públicos ainda se ressentem de eficiência e de efetividade. Aguardava-se que, depois da miserável situação em que o Brasil foi arremessado, considerado “Pária Ambiental”, o retorno de Marina Silva fosse a retomada do desenvolvimento verde. Mas, como já aconteceu no passado, ela se vê desrespeitada e desprestigiada ante pautas imediatistas daqueles que só enxergam o hoje, o imediato, o dinheiro no bolso para já. Para variar, a promessa de que o Brasil voltasse a liderar o debate ambiental constou do discurso de posse do Presidente no Congresso e na Assembleia Geral da ONU. Só que ficou no papel. Perdem-se excelentes oportunidades: a presidência do G20 e o privilégio de ser anfitrião da COP30, em Belém do Pará, em novembro de 2025. Para essa oportunidade, o Brasil precisaria mostrar serviço, não discurso. Uma coisa que de pouco depende, pois está condicionada à vontade política, é a regulamentação dos créditos de carbono. Diz-se que o mundo está interessado em investir no Brasil, enquanto houver floresta. Coisa para pouco tempo, a se aferir o índice e intensidade do extermínio que não cessa, mas só aumenta. Ocorre que o Parlamento brasileiro tem coisas mais importantes para discutir: emendas Pix, orçamento secreto, reforço dos Fundões Partidário e Eleitoral, sucessão nas duas Casas de um sistema bicameral que também deveria ser rediscutido. A esperança é que os munícipes atuem no âmbito de suas cidades. É sempre bom recordar André Franco Montoro, para quem “ninguém nasce na União, ninguém nasce no Estado: as pessoas nascem no município”. A cidade é o locus adequado para as ações salvíficas, aquelas que garantirão a continuidade da existência dos humanos sobre a Terra. A cruzada climática é apartidária. Não é uma questão ecológica ou de ambientalistas radicais. Como observa Ana Vitória Wernke, “o fator social é um item de relevância na equação da crise climática. A disparidade de classe conjugada com a questão climática é um tema que transborda as caixas e transversaliza, ou devem transversalizar, devem permear e ser ponto de relevância em todas as políticas públicas básicas, como saúde, educação e infraestrutura. Esses são os principais assuntos discutidos pelos governos, no mais das vezes, de maneira estanque”. Os munícipes devem cobrar, em suas cidades, o cumprimento dos programas de governo quanto à crise climática. Elas estão nas agendas de saúde, educação, geração de emprego e renda, habitação, verde e meio ambiente. A questão climática se tornou o maior desafio para qualquer gestão. E a cidadania é que deve cobrar de seus representantes, pois os representados são, de acordo com a Constituição Federal, a única fonte de poder. Toda a soberania emana do povo. Que a faça valer para que o mundo continue a existir por mais algum tempo. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 28 10 2024 voltar |
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