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Acadêmico: José Renato Nalini Não era um cientista neutral, dos que mergulham em sua área de conhecimento e se desinteressam do restante. Não. Era um brasileiro que amava a sua Pátria. Foi o seu patriotismo que o levou a estudar a relação do homem com o meio ambiente em diversas regiões do País, inclusive o sertão desértico do Nordeste
Aziz Ab’Saber: 100 anos Exatamente hoje, 24 de outubro de 2024, celebra-se o centenário de um grande brasileiro: Aziz Nacib Ab’Saber, geógrafo, geólogo, pesquisador e professor universitário. Nasceu em 24 de outubro de 1924, em São Luiz do Paraitinga, terra de Oswaldo Cruz e faleceu em 16 de março de 2012, em Cotia. Encantado com a natureza, interessou-se por conhece-la profundamente. Haver nascido numa cidade que teve apogeu durante a Colônia e parte do Império, depois integrou o circuito das “Cidades Mortas” de Monteiro Lobato, era naturalmente inclinado a admirar o relevo paulista. Foi isso o que o levou a tornar-se um grande estudioso e proficiente conhecedor de espaços como a Serra do Japi, da qual foi protetor, a ponto de conseguir seu tombamento pelo Condephaat e presumível vocação de perpetuidade. Iapy é palavra indígena tupi-guarani que significa “nascente de rios” e Aziz chamava a Serra de “Castelo de águas”. Além disso, a Serra hospeda um mosaico de ecossistemas bem significativos na biodiversidade brasileira. Talvez seja a única floresta mundial que se ergue sobre solo quartzítico, o que foi apurado por Ab’Saber em suas pesquisas. Como está situada em sua maior parte no território de Jundiaí, sua tutela efetiva depende do interesse de cada Prefeito na proteção de um patrimônio bastante frágil. Como “santo da terra não faz milagre”, os amigos jundiaienses da Serra do Japi não conseguiriam seu tombamento, não fora o descortino e a autoridade científica de Aziz Ab’Saber. A Serra do Japi foi visitada por José Bonifácio de Andrada e Silva e Martim Afonso Ribeiro de Andrade, durante a Viagem Minerológica pela Província de São Paulo, realizada em 1821. Um país geralmente desmemoriado, o Brasil não cultiva seus maiores com a devida reverência. Só que o mundo científico sabe que Ab’Saber foi um dos autores da teoria dos refúgios. Foi o primeiro cientista a identificar as faixas de transição entre os domínios da natureza no Brasil e se lhe atribui a descoberta das “core áreas”, núcleos de reprodução de vida. Numa era em que ecologia sequer era conhecida, foi o seu desempenho na Academia que propiciou adequado conhecimento da história geoecológica do Brasil e melhor compreender a formação de nosso atual ecossistema. Pode ser considerado, portanto, um dos bandeirantes ecológicos deste país que se destaca pela pressa em exterminar sua biodiversidade, antes mesmo de desvendá-la e bem conhecê-la. Ab’Saber não era um cientista neutral, dos que mergulham em sua área de conhecimento e se desinteressam do restante. Não. Era um brasileiro que amava a sua Pátria. Foi o seu patriotismo que o levou a estudar a relação do homem com o meio ambiente em diversas regiões do país, inclusive o sertão desértico do Nordeste. No artigo “Os sertões: a originalidade da terra”, salientou a importância de bem conhecer as bases físicas e ecológicas da região para se impregnar da consciência necessária a mitigar os males que vêm da ausência de chuva. Era um convicto compadecido do drama dos humanos que habitam regiões inóspitas e se dispôs a compreender melhor as razões dessa tragédia, para também melhor combatê-las. Elaborou o conceito de “geografia humana sofrida”, para explicar a situação dos nordestinos. Visionário, defendia a preservação ambiental e o uso responsável e ético dos recursos naturais. Daí sua condenação quanto à exploração predatória e desmatamento. Fez pesquisas primorosas que serviriam para a edição de um Código Brasileiro da Biodiversidade, muito superior ao atual Código Florestal – Lei 12.651/2012 – cuja versão definitiva criticou. “O Brasil é muito mais do que florestas. Há várias formas de biodiversidade, para além das florestas”. Queria ser historiador. O preço dos livros fez com que optasse pela geografia e concluía: “Para observar a natureza, não preciso de livros”. A insuficiência econômica também fez dele excelente desenhista. Não tinha dinheiro para comprar equipamento fotográfico. Então passou a fazer esboços de lugares e de vegetação. Foi um profeta nativo, que hoje completaria seu primeiro século. Pois sua obra perdurará por muitos outros. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 24 10 2024 voltar |
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