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Acadêmico: José Renato Nalini ‘O nosso amor-próprio é o maior de todos os sofistas. Ninguém defende com tanto zelo os nossos erros, defeitos e desvarios. Em matéria de amor-próprio, o mais pequeno inseto não o tem menor que a baleia ou o elefante’
Variações sobre o amor-próprio Amor-próprio: a mais generalizada forma de amor que pode ser encontrada em nosso tempo. As pessoas têm a convicção de que seu ego é a única perfeição disponível, neste convívio com a imperfeição alheia. Como é desinteressante a conversa em que o “eu” não está presente! Que gente desagradável essa que não me admira como eu mesmo, que me encanto com a música de minha voz, com a suavidade de minhas feições, com o suprassumo de meus atributos! Por isso o self é a foto mais disseminada nas redes sociais. É testemunho de minha generosidade: repartir com os menos dotados de talentos, aqueles de que disponho. Até para que me copiem e possam reduzir suas fragilidades. Será que isso era também o que pensava o pensador Marquês de Maricá, ao elaborar suas milhares de máximas? Vamos dar um passeio por elas. “O nosso amor-próprio é tão exagerado nas suas pretensões, que não admira se quase sempre se acha frustrado nas suas esperanças. Dói mais ao nosso amor-próprio sermos desprezados, que aborrecidos. O amor-próprio do tolo, quando se exalta, é sempre o mais escandaloso. Queremos tudo porque nos cremos dignos e capazes de tudo. Tal é a filáucia do nosso amor-próprio. Ninguém nos aconselha tão mal como o nosso amor-próprio, nem tão bem como a nossa consciência”. Com pequena variação: “Ninguém nos lisonjeia tanto como o nosso amor-próprio, nem nos argui com mais perseverança do que a própria consciência”. Mais ainda: “Pouco saber exalta o nosso amor-próprio, muito saber o humilha. Amamo-nos sobre tudo, e aos outros homens por amor de nós. O nosso amor-próprio é a causa e a fonte de todos os amores: amamos somente por amor de nós mesmos. Agrada mais ao nosso amor-próprio a companhia que nos diverte, que a sociedade que nos instrui. Os homens nos parecerão sempre injustos, enquanto o forem as pretensões do nosso amor-próprio. Somos enganados mais vezes pelo nosso amor-próprio do que pelos homens. Custa menos ao nosso amor-próprio caluniar a fortuna, do que acusar a nossa má conduta”. Segue: “O nosso amor-próprio se exalta mais na solidão: a sociedade o reprime pelas contradições que lhe opõe. O nosso amor-próprio é, muitas vezes, contrário aos nossos interesses. A obstinação nas disputas é quase sempre efeito do nosso amor-próprio: julgamo-nos humilhados se nos confessamos convencidos. Somos em geral demasiadamente prontos para a censura e demasiadamente tardos para o louvor: o nosso amor-próprio parece exaltar-se com a censura que fazemos, e humilhar-se com o louvor que damos. Refletindo cada um sobre si mesmo, acha sempre com que humilhar o seu amor-próprio, e com que satisfazê-lo e consolá-lo. Por mais sagaz que seja o nosso amor-próprio, a lisonja quase sempre o engana. Ninguém avalia tão caro o nosso merecimento como o nosso amor-próprio. O nosso amor-próprio argui de soberbos aqueles que o não lisonjeiam”. Quem já refletiu sobre isto: “O interesse, filho do amor-próprio, conforme é bem ou mal educado, assim é útil ou danoso a seu próprio pai. Os homens não fazem sacrifícios gratuitos do seu amor-próprio; quando rendem adorações a um homem, exigem que ele se assemelhe de algum modo à Divindade pelas suas perfeições e beneficência. O nosso amor-próprio, como o Prometeu da fábula, se transforma por tantos modos que é extremamente difícil distingui-lo em todas as suas metamorfoses. Ser modesto é transigir com o amor-próprio dos outros homens. O nosso amor-próprio nos compromete frequentes vezes, persuadindo-nos que sabemos ou podemos muito mais do que é realmente verdade”. Tal sentimento, o amor-próprio, está em todas as personalidades: “O amor-próprio dos poetas e pintores é sobremaneira irritável; não se contentam com um desagravo ordinário. Procuram imortalizar a sua vingança própria. O amor da nossa individualidade, o amor-próprio, faz inevitável o terror da morte que a destrói. O nosso amor-próprio é o maior de todos os sofistas. Ninguém defende com tanto zelo os nossos erros, defeitos e desvarios. Em matéria de amor-próprio, o mais pequeno inseto não o tem menor que a baleia ou o elefante”. Por fim, “os homens não se vendem de graça; o seu amor-próprio lhes marca o preço, mas a concorrência o rebaixa. Humilhai o vosso amor-próprio, mas respeitai o dos outros. O amor-próprio é o amigo leal que nunca nos desampara em nossos maiores infortúnios. A nudez do amor-próprio é tão indecente e desagradável, que recorremos à civilidade para o vestir, ataviar e fazê-lo tolerável”. Como ficou o seu amor-próprio, depois de ler todas estas máximas? Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 18 09 2024 voltar |
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