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Acadêmico: José Renato Nalini Em tempos em que mulher na política era coisa relativamente rara, ela foi professora, bacharel em Direito, vereadora, deputada e senadora por São Paulo. Foi a primeira mulher senadora por São Paulo, ao substituir o senador Amaral Furlan
Dulce Salles Cunha Braga Completaria cem anos em 2024, a querida Dulce Salles Cunha Braga, a quem conheci e com quem aprendi muita coisa. Nasceu em 20.04.1924 e faleceu em 12.01.2008. Em tempos em que mulher na política era coisa relativamente rara – havia Conceição da Costa Neves, ou Conceição Santa Maria, lembram-se? – ela foi professora, bacharel em Direito, vereadora, deputada e senadora por São Paulo. Foi a primeira mulher senadora por São Paulo, ao substituir o Senador Amaral Furlan, cujo suplente, o professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, exercia o cargo de Vice-Governador de Paulo Egídio Martins. Nasceu em São José do Rio Preto, filha de Maria Paternost Salles e Feliciano Salles Cunha, que exerceu política local e era homem influente. Casou-se com Antônio Roberto Alves Braga, médico, advogado e empresário, que faleceu em 1995. Licenciou-se em Línguas Neolatinas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Sedes Sapientiae, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e bacharelou-se em direito pela Universidade Mackenzie. Falava muito bem, pois dominava a oratória naturalmente. Era muito solícita ao atender os convites de jovens docentes que gostavam de leva-la para falar com alunos de cursos jurídicos. Nunca se recusou a conversar com os meus alunos de Teoria Geral do Estado, contando suas experiências no Parlamento e o que ela sonhava para o Brasil. Aproximei-me singularmente dela, quando me casei, pois meu sogro, o médico Francisco Glicério de Freitas Filho era colega e amigo de Antônio Roberto Alves Braga. Tanto que o casal foi ao meu casamento. Eles construíram uma bela casa na divisa entre as praias Astúrias e Enseada, no Guarujá. Uma solução arquitetônica hoje inviável, pois parte da residência se assenta sobre as pedras, o que é ambientalmente inadequado. Mas, no tempo em que foi edificado esse exemplar insólito, isso foi possível. Hoje, a casa é alvo de muitas fotos de quem visita o Guarujá. Dentro dela, a opção de Dulce e Antônio, que não tiveram filhos, foi multiplicar muitos recantos para os afazeres de uma dupla intelectual: salas de leitura, bibliotecas especializadas, espaços para receber visitas e para ouvir pessoas. Minha sogra, Heloísa Brant de Carvalho Freitas sempre comentava que a casa de Dulce e Antônio era uma verdadeira coleção de “compartimentos íntimos”. Dulce se dedicou também às letras. Escreveu “Autores contemporâneos brasileiros”, em 1951, livro reeditado em 1966; “A Forma Poética de Camões a Guilherme de Almeida” “ABC para você”, “ABC da democracia”, “Conceito de autoridade”, “Gramática-Índice da Língua Portuguesa” “Gramática Índice da Língua Inglesa” e “Ser Feliz”, sua última publicação, em 1996. Estudou canto lírico, aluna de Camargo Guarnieri. Chegou a apresentar-se no Teatro Municipal. Valendo-se de sua bela voz, gravou pela Chantecler, em 1967, o LP “Personalidade”, regravado em CD em 1998. Nessa gravação, interpreta músicas de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, com orquestra de Francisco Moraes. Integrava inúmeras entidades e associações. Foi eleita para a Academia Cristã de Letras, foi sócia da Associação de Jornalistas e Escritores do Brasil, União Cívica Feminina e Associação Comercial de São Paulo. Atuou na televisão, primeiro na TV Excelsior, entre 1960 e 1961, e na sequência foi contratada pela TV Record, servindo como entrevistadora. Substituiu Hebe Camargo na TV Globo, apresentando o programa “O mundo é das mulheres “. Era conservadora e não hesitava em se assumir política à direita. Tanto que se deve também a ela a criação do Mobral, movimento de alfabetização no período autocrático, o Projeto Minerva e o Condephaat. Ao receber o título de “Mulher do Ano”, em 1982, o inesquecível Paulo Bomfim, o último “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, declamou em sua homenagem: “Na magia deste encontro/Nos arrepios de abril/No azul das manhãs paulistas/No amor às nossas raízes/Nos convites do futuro/Nas lembranças do passado/Na inquietude do presente/Na fibra do nosso povo/Na fé em nossa bandeira/Nos sonhos que são vividos/Nas lutas que são lutadas/Nas vozes de nossa terra/Nos ideais de nossa história/Nos amigos aqui reunidos/ num dulçor dulcificante/Dulce Sales Cunha Braga!”. Muito religiosa, saía da missa ao sentir-se mal. Faleceu por deficiência cardíaca, essa mulher que sempre se caracterizou por possuir um coração gigantesco, no qual cabiam São Paulo e o Brasil. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 13 09 2024 voltar |
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