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A NATUREZA QUER O QUE É DELA
Acadêmico: José Renato Nalini
É urgente criar mais escolas de tecnologia, para que os brasileiros estudem mais biologia, agronomia, silvicultura, botânica, se preocupem com resiliência e adaptação das cidades para suportar os fenômenos extremos que se intensificarão e ocorrerão com assiduidade maior

A natureza quer o que é dela

Assim como a ex-ministra da Agricultura reconheceu que não seria preciso cortar uma árvore sequer para aumentar a produtividade da lavoura, o atual ministro da pasta da Agricultura e Pecuária reconhece que os fatos acabaram com o discurso negacionista.

Três anos de seca e três enchentes seguidas no Rio Grande do Sul evidenciam que o ambiente cobra o que foi tomado da natureza. O clima é o principal ativo dos agricultores. Isso o ministro Carlos Fávaro conhece bem, pois é produtor rural, vice-presidente da Aprosoja e dirigiu a associação em seu Estado, o Mato Grosso. Ele também ratifica o discurso de sua antecessora, de que o Brasil pode ser o fornecedor de alimentos para o mundo, apenas com a substituição de áreas de pastagens degradadas por plantio de grãos.

Para ele, não há como negar que o Brasil – governo e povo – precisa agir rapidamente para mitigar os efeitos das mudanças. O bom agricultor tem consciência de que de nada vale ter equipamento, ciência e sementes de última geração, se o solo para o plantio se transformar num deserto.

Ainda é tensa a relação do Ministério da Agricultura com o do Meio Ambiente. Um dos pontos nevrálgicos é a vedação dos pesticidas. São venenosos, matam, poluem. Ainda assim, pede-se mais tempo para a migração rumo a produtos mais sustentáveis, como os biológicos, biodegradáveis e seletivos.

Num otimismo próprio a quem integra convictamente um setor bem delineado, o ministro Carlos Fávaro acredita que os agricultores que praticam grilagem e desmatam são apenas 2 do total de produtores rurais. E esses dois por cento devem ser tratados com rigor pela Polícia Federal, Ministério Público e Ibama.

Prega a disseminação das boas práticas. Dentre as quais, fazer um perfil do solo de quarenta centímetros com calcário, fertilizantes e muita matéria orgânica. Com isso, o solo suporta mais a seca e absorve mais a água. Quem procede assim obtém vinte por cento a mais de produtividade. É o que o ministro chama de “bomba d’água da produção”.

Sua visão de mundo é que depois da II Guerra Mundial, cada país foi em busca de sua vocação. Japão e Coreia do Sul optaram pela tecnologia e o Brasil passou a produzir alimentos. Em 1989, o país produzia 71 milhões de toneladas de grãos e em 2023, chegou a 320 milhões. Isso se deveu à Embrapa, que forneceu ciência para o produtor rural e também à criação da CTNBio e à regulamentação dos transgênicos.

Como agricultor que não é ogro, o ministro acredita não existir antagonismo entre produzir e preservar. Reitera a existência de oitenta milhões de hectares de áreas de pastagem degradadas que podem ser reaproveitadas para o plantio de grãos.

Diante das reservas dos europeus quanto à origem discutível dos produtos extraídos de grilagem e desmatamento, além do trabalho na condição de escravidão, o ministro entende que é melhor não ficar chorando. Pode-se ampliar o mercado com o Sul Global, China, Japão, Índia, outros países da Ásia, Oriente Médio e Brics. São regiões com grande potencial econômico e crescente demanda.

Mas é preciso que o Brasil retome a sua postura de promissora potência verde. Que o agro também participe da questão da venda dos créditos de carbono. Que os fazendeiros se preocupem com o replantio de espécies nativas de todos os biomas que estão sendo exterminados. E é urgente criar mais escolas de tecnologia, para que os brasileiros estudem mais biologia, agronomia, silvicultura, botânica, se preocupem com resiliência e adaptação das cidades para suportar os fenômenos extremos que se intensificarão e ocorrerão com assiduidade maior.

A Embrapa precisa ser também uma entidade ecológica, deixando de lado o discurso de que existe mais verde intocável no Brasil do que território, numa tergiversação descabida, diante dos episódios climáticos comprobatórios de que o maior perigo que ronda a humanidade não é a guerra, nem a dissidência entre os grandes líderes, nem a hegemonia dos gigantescos conglomerados econômicos. É o clima. É a resposta da Terra a quem a maltratou de forma inclemente e incessante.

Mais amor à terra e menos redes sociais iradas em reforço de nefasta polarização. O Brasil precisa de amor e trabalho. Nessa ordem!

Publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 12 06 2024



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