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O SOL DE ABRIL
Acadêmico: Gabriel Chalita
A luz de abril é de abrir as memórias e fazer iniciar a conferência dos dizeres dos sentimentos em defesa do existir. 

O sol de abril

É quase entardecer e o sol prossegue desenhando belezas no céu de abril. Gosto dos outonos. Das trocas das roupagens das árvores. Dos ventos que só permitem permanecer a permanência. 

A luz de abril é de abrir as memórias e fazer iniciar a conferência dos dizeres dos sentimentos em defesa do existir. 

Vejo o entardecer e vejo a mim mesmo. Nascido em um tempo e em um espaço, fruto do encontro de amor que plantou no mundo a semente que sou.  Meus pais já são eternidade. Em um tempo eram aqui a cuidar do meu tempo. O tempo do engatinhar e o do andar. O tempo do crescer e o do descansar. O tempo de dizer e o de desligar as palavras para ouvir o amor. 

Moram  na minha alma as cenas lindas de tantos aconchegos. O amor é o sublime gosto da felicidade. Pensar neles me faz feliz como me faz feliz o sol de abril. 

A janela aberta me diz o tempo suspenso. Esqueço os afazeres para fazer parte do despedir de mais um dia. De um dia de abril. 

Não há máquina capaz de registrar o sol e os seus desenhos. Não há máquina capaz de dizer o que diz minha alma quando comungo a alma do Eterno. 

Um dia não estarei mais aqui para contemplar o sol de abril, e o sol estará. Só de pensar nisso, penso no que devo deixar de pensar. Ocupações que ocupam partes de mim e que deveriam receber de mim a coragem de desocupar. 

A morte não é o fim. E é o fim. A morte explica a finalidade da vida, o despedir da vida. A morte diz que o desnecessário é desnecessário. E desveste o necessário, tantas vezes escondido. 

O dia se despede sabendo que outro dia virá. E se despede inteiro. E, então, a noite e o silêncio. A noite e a pausa. A noite e o luar. Luar de abril. Luar de tantas lembranças de enlaces e de promessas.

Prometi a mim mesmo amar o amor, enquanto o amor amar. O amor é sol em qualquer estação e é poesia. Um sorriso leve ocupa o meu olhar quando vejo e penso no que já foi e no que ainda é.  

Sou um inventário de histórias tristes e felizes, de encontros bonitos e de despedidas também bonitas, de aprendizagens.  Sou uma escritura onde constam os bens que não me pertecem, mas que uso, e os bens que me explicam a existência. 

O olhar o sol de abril é um bem que sou eu. A luz sai, também, de mim e, também, o calor para fazer pulsar os dizeres que ainda tenho de dizer ao mundo antes do despedir. Um mundo indelicado já me assombrou mais de uma vez. Aprendi, para os desassombros, a delicadeza. 

Aprendi a não conferir ao outro o poder do esfriamento das emoções. Aprendi na dor. A dor é também luz, se a ela autorizamos a lapidação. 

Somos preciosidades e brutalidades, como um diamante. Quem sabe o seu valor se a janela não se abre, se a luz não faz ver o seu brilho, se as camadas, que não são o diamante, não forem retiradas? 

O tempo foi me dizendo quem sou e quem eu não sou. E isso me faz bem, embora, às vezes, eu esqueça.  É assim que é. Endireitamos e entortamos e, depois, endireitamos novamente. Tomamos atalhos errados e acendemos a consciência para retomar o caminho. 

No caminho que caminho hoje o que me diz a felicidade é o sol de abril. É o belo que consigo ver, porque a janela está aberta e a alma também. 

Quanto dura um entardecer? O necessário para que o belo seja belo. Em quem vive. Em quem vê.

Publicado no jornal O Dia,em 21 04 2024



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