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Acadêmico: José Renato Nalini Houve tempo em que o futebol era a verdadeira mania brasileira. Hoje, parece que ele perdeu espaço para a litigância judicial e para a batalha das narrativas.
O futebol tupiniquim Houve tempo em que o futebol era a verdadeira mania brasileira. Hoje, parece que ele perdeu espaço para a litigância judicial e para a batalha das narrativas, cada qual alimentada por grupos antagônicos polarizados, numa arena psicológica em que não há vencedores. Mas como surgiu o futebol em São Paulo? Quem o introduziu foi Charles Miller, primeiro marido da pianista Antonieta Rudge, que depois se casou com Guilherme de Almeida. Antes disso, os paulistas assistiam a corridas de bicicleta no Velódromo da rua da Consolação. Corriam os rapazes das melhores famílias, dentre os quais Tonico Prado, o Antonio Prado Júnior, prefeito do Distrito Federal no governo de Washington Luís. Foi nesse lugar que, de repente, surgiram ingleses chutando uma bola. O que parecia brincadeira era o futebol. No relato de Laura Rodrigo Octávio, “a coisa tomou impulso, fundaram-se uns clubes: São Paulo Athletic Club, o Club Germania, o Club Internacional, o Club Mackenzie e o Club Athletic Paulistano, dirigido por Antonio Prado Júnior, Numa de Oliveira, Luis Fonseca e outros”. Os primeiros times congregaram os jovens da elite. Laura se lembra de “Jorge Miranda (Tutu) no gol, que defendia com certeiros munhecaços, Guilherme Rubião, Thiers Costa Marques, full-backs, Jorge Mesquita, center-half e o Álvaro Rocha center-foward, um tipo de Apolo, cabelos crespos, perfil grego, a camisa aberta e a jogar magistralmente. Imagino as paixonites que despertou! Eu era uma criança, mas quando um dia ele me apertou a mão, senti-me honradíssima”. O Paulistano passou a jogar muito bem, foram surgindo os treinadores profissionais, mas durante vários anos, o Paulistano empatava com o São Paulo e, no desempate, os ingleses ganhavam a taça. As arquibancadas do Velódromo ostentavam o escudo do Paulistano, C.A.P. vermelho sobre branco. Na extrema direita havia uma parte reservada à família Prado, proprietária do espaço. Cada fila tinha uma cancela a interceptar a entrada. As mulheres participavam das partidas como assistência muito elegante, vestindo sempre as últimas novidades de Paris. Uma cisão do Paulistano fez surgir o Palmeiras. A essa altura, o Paulistano já construíra uma piscina, fizera gramado, contava com quadras de tênis, fazia festas para os sócios, enfim era um clube em plena atividade. Não era fácil para as torcidas deixarem o lugar após às partidas. O campo era distante da rua, no interior de uma enorme área. Tinha-se de caminhar a pé por um caminho de terra, com algumas pedras. Isso para a maioria dos torcedores, pois os mais ricos iam com suas carruagens, puxadas por belos cavalos e se serviam de uma raia própria, vedada aos pedestres. Tudo era copiado do modelo inglês. Vinha da Europa uma boa quantidade de fitas vermelhas e brancas com o escudo C.A.P. – Clube Atlético Paulistano. Isso para que os homens ostentassem nos chapéus de palha, que eram o uso da época. As moças procuravam usar o símbolo na cintura ou bordado em suas blusas. Começaram as competições com o Fluminense, elegante clube do Rio. Nele jogavam muitos estrangeiros ou filhos de estrangeiros: Frank Walter era o diretor e os jogadores se chamavam Cruikshank, Cox, Frias e os dois irmãos Etchegaray. O Paulistano também ia ao Rio, devolver a gentileza da visita e jogar com o Fluminense. Interessante observar que o futebol nasceu com a elite e depois contaminou toda a população. Hoje, o Clube Atlético Paulistano é uma potência que desenvolve outros esportes, principalmente a natação, o tênis, o vôlei, o basquete, a ginástica olímpica. Não tem um time de futebol à altura de sua tradição, como o primeiro núcleo paulista que se entregou a essa verdadeira arte, que ofereceu ao Brasil o símbolo-maior chamado Edson Arantes do Nascimento, o Pelé. Algo meritório que o Paulistano faz é abrir suas portas para jovens esportistas que não teriam condições de pagar suas taxas, mas que se utilizam de seu excepcional equipamento, para treinar e chegar à glória olímpica tupiniquim, na qual o Brasil tem feito bonito. Sem prejuízo de uma atuação cultural que o converte num grande incentivador do belo na maior cidade da América Latina, palco de infinitas experiências e atrações em todas as artes. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 11 02 2024 voltar |
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