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TEMPOS ÁUREOS
Acadêmico: José Renato Nalini
A saga dos Caldeira Brant é um relato da bravura dos paulistas, que depois se tornaram mineiros.

Tempos áureos

A saga dos Caldeira Brant na época em que o Brasil lavrava ouro e tinha de atender aos desmandos da perdulária Corte lusa, é um relato da bravura dos paulistas, que depois se tornaram mineiros.

A sofreguidão do Erário real impunha que a exploração do ouro fosse rigorosamente regulada, de sorte a assegurar ao fisco o “quinto” – a quinta parte de todo o ouro que se extraísse das lavras e a “captação”, ou “capitação”, que correspondia ao pagamento semestral de duas oitavas e doze vinténs de ouro por escravo que trabalhasse nas minas. Enquanto o “quinto” foi imposto por Alvará de 8 de agosto de 1681, o Regimento de Capitação foi decretado por Martinho de Mendonça em Vila Rica, aos 27 de março de 1734. Para maiores detalhes, é interessante ler de Antonil, “Cultura e opulência do Brasil, por suas drogas e minas”, cuja segunda edição foi publicada no Rio de Janeiro em 1837.

Mas não era só. Para que se pudesse licitamente minerar, era preciso obter do Guarda-Mor, encarregado da repartição das terras mineiras, a concessão de uma “data”. A cada nova descoberta, o descobridor desse veio obtinha uma data como descobridor e mais outra como mineira. Em seguida, vinha a data que cabia a El-Rey e após a do Guarda-Mor. As datas restantes se distribuíam por sorteio aos requerentes, que deveriam desde logo instruir seus requerimentos com a propina de uma oitava de ouro para o Guarda-Mor e outra para seu escrivão.

As “datas” se chamavam inteiras quando tinham trinta braças em quadra. A braça é medida antiga, equivalente ao comprimento de uma das mãos à outra, de uma pessoa com os braços completamente abertos. Mede hoje 1,83 metros e ainda é utilizada para medir a profundidade dos oceanos. Essa medida também servia para as “datas” do Rei, do Guarda-Mor e do descobridor. Já as demais, tinham a extensão proporcional ao número de “praças”, assim designados os escravos, índios ou agregados que cada requerente trazia para a cata. Em geral, eram duas braças por cabeça de escravo ou índio.

Todo o ouro tinha de ser levado à “Casa de Fundição”, repartição em que o metal era convertido em barra, depois de extraída a importância dos tributos. Existia uma para cada comarca, sediada na vila respectiva a primeira casa de moeda para fundição de ouro, em Minas, foi criada por carta de lei de 18 de julho de 1717.

Graças à enorme distância em que estavam o Córrego Rico, assim batizado por Felisberto Caldeira Brant, e suas aguadas, da Casa de Fundição da Vila de Sabará, puderam os Caldeiras minerar por muito tempo, sem se preocupar com as impertinentes exigências do fisco.

Como eram liberais e não impediam que outros que fossem chegando também explorassem o ouro, não tiveram almas cobiçosas e más que fossem levar ao Guarda-Mor denúncia do criminoso trabalho.

Crescia rápida a fortuna dos descobridores e tranquila continuava a existência dos primeiros povoadores do Piracatu, no território da Vila de Sabará, cabeça da extensíssima comarca do Rio das Velhas. Esta comarca, criada em 21 de julho de 1711 pelo governador Antonio de Albuquerque, era tão grande que confinava com a Capitania de Pernambuco, com a comarca de Serro Frio, com as serras dos Cristãos e Tabatinga e com a Capitania de Goiás. Graças ao trabalho dos Caldeira Brant, o povoado crescia e prosperava. Já com o nome de Paracatu do Príncipe, foi erigido em vila por alvará de 20 de outubro de 1798, muito tempo depois.

Mas o que é bom dura pouco. Animado com a notícia de que venceria o contrato para extração de diamante na comarca do Serro do Frio, Felisberto Caldeira Brant vem com toda a família e a grande escravaria estabelecer-se no Tejuco, que depois se chamaria Diamantina.

Trazia de Paracatu enorme quantidade de ouro e uma fama legendária. Em torno à sua pessoa proliferavam fantasias. Não sabia – ou não nutria exata noção – da situação do povo do Tejuco, que subsistiam sob a mais acerba tirania, sob o domínio de uma lei que havia abolido a justiça e só se movia pelos impulsos da prepotência e do interesse.

Tempos áureos deram lugar a tempos sombrios. Mas isto já é uma outra estória, que fica para a próxima vez.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão, em 16 12 2023



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