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CONSPIRAÇÃO CONTRA A BOA FAMA
Acadêmico: José Renato Nalini
Nossa História está repleta de episódios de desconstrução de imagem, de extermínio de reputação, perpetrados contra pessoas de bem.

Conspiração contra a boa fama

O Brasil é uma terra dos contrários. Os malandros, os ímprobos, os desalmados são exaltados. Os bons são vítimas de opróbio. Triste sina de um país que nasceu sob o signo da Cruz, símbolo maior das injustiças que o bicho-homem perpetra contra inocentes.

Nossa História está repleta de episódios de desconstrução de imagem, de extermínio de reputação, perpetrados contra pessoas de bem. Uma delas foi Felisberto Caldeira Brant, paulista que erigiu uma dinastia em Minas e que foi alvo de calúnias e de perseguição. Por parte de El Rey, a quem serviu devotamente, mas também por parte dos áulicos, raça de víboras que envolve todas as autoridades.

Bem-sucedido na exploração de diamantes no território de Tejuco, depois chamado Diamantina, viu-se perseguido pelos invejosos, que cobiçavam sua fortuna.

Um mal esclarecido roubo levou o tesouro que havia depositado na Intendência de Minas, como caução para obter permissão de lavra. Com isso, programou-se uma falência que não deveria existir, pois ainda possuía diamantes num total de 257.271 quilates, equivalentes a quantia muito superior à que deveria pagar a seus credores.

Nada obstante a estima que granjeara como Contratador generoso e disposto a continuar a trabalhar, arrostou Caldeira todas as dificuldades e a má-vontade do Fisco Real. Poderosa era a conspiração contra sua boa fama. Ter feito fortuna por seus próprios méritos era imperdoável para a mediocridade que só consegue viver se extrair migalhas aos poderosos e envolver o governo com blandícias hipócritas, que os habilite a mamar no Erário.

Felisberto Caldeira Brant agredia a essa gente. Sua boa fortuna despertava a inveja de muitos, o despeito de outros, o receio de alguns. Era preciso que ele caísse. E caiu.

Sentiu que os aduladores sumiam. Todos se afastam de quem cai em desgraça. Os mesmos comensais de seus fartos banquetes rareavam. O contratador envelhecia. Cheio de preocupações e pressentimentos, extenuado da luta desigual em que se via empenhado e que já durava demais, quedava-se taciturno. Contava apenas com a solidariedade de sua esposa, Branca de Lara, fidalga paulistana, que procurava animá-lo.

Não se iludia o Contratador de diamantes, Felisberto Caldeira Brant, que bem conhecia a raça dos homens. Confidenciava, com sua família e derradeiros amigos, o presságio infeliz do funesto caso. Seus negócios eram prejudicados. Quando dependia das autoridades para qualquer ato, ainda que de pouca relevância, encontrava má vontade. Ele nunca tinha razão. Tudo o que alegava era entendido como destemperada censura à Corte, ou incontinente desregramento de linguagem. Quanto fazia, era havido por mal sofreada rebeldia. Via-se uma sórdida segunda intenção em todas as suas palavras e atos.

Fazia-se chegar ao Reino a notícia falaciosa de que ele sonhava com a libertação do Tejuco e com a independência do Brasil. Que trabalhava para levantar os espíritos prometendo a partilha das riquezas extraordinárias da terra no dia da emancipação. O tecido de intrigas surtiu efeito. Fez coisa julgada no ânimo dos ministros do Rei que Caldeira Brant era indivíduo prejudicial e funesto, que convinha exterminar.

Em 20 de fevereiro de 1753, chega a Carta Régia ordenando a prisão de Felisberto. Ele foi preso, recolhido à mais forte prisão e guardado por sentinelas armadas. Seus bens foram confiscados. Quando Felisberto esperava liberdade, a prisão injusta foi agravada, pois levado para o Rio e de lá para Portugal.

Ficou preso no Limoeiro, onde também esteve Bocage e hoje é o Centro de Estudos Judiciários, a escola de juízes de Portugal. Em 1º de novembro de 1755, houve o terremoto em Lisboa. Todos os encarcerados que não pereceram fugiram. Felisberto foi à casa em que estava o Marquês de Pombal. Disse que estava à espera, desde 1753, de julgamento. Vinha pedir que lhe fosse designada outra prisão, para aguardar a liquidação do se débito e levantamento do sequestro de seus bens.

Surpreso com o estranho proceder, Sebastião José de Carvalho disse que Felisberto permanecesse onde pudesse e que, passados os efeitos da tragédia, trataria de seu julgamento. Não conseguiu esperar por Justiça. Depois de três meses, a morte o levou, infeliz e injustiçado.

Não foi o único, nem será o último. O mal é algo ínsito à natureza humana.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão, em 14 12 2023




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