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Acadêmico: José Renato Nalini Se há benefícios, há também malefícios. Mas estes derivam exclusivamente da internet ou é a própria humanidade que tem alguns membros em decomposição?
Não culpe só a internet A invasão de memes, tik-toks, linkedins e facebook, além dos incontáveis grupos em que somos incluídos sem pedir, nos convertem em verdadeiros robôs. Automaticamente a responder, atentos a cada sinal sonoro ou de luz. Impossível não se deixar levar pelas redes sociais, nossa patroa e chefe, à qual devemos submissão contínua. Recebi há dias uma homilia de sacerdote que dizia que a pior arma já fabricada pelo homem não era a bomba atômica. Era aquela que matou o telefone, matou o livro, matou o relógio, matou o correio, matou o jornal, matou a televisão. Está matando a família, a começar pela infância. Ou seja: a pior arma seria o celular. Uma bugiganga que até serve de telefone, mas que - de fato - substitui relógio, caderneta de endereços, agenda, cartões de visita, nos leva onde queremos - nem sempre pelos melhores caminhos - e ainda nos oferece cinema, música e material de leitura. Há uma certa verdade. É triste ver que hoje não se namora. Os apaixonados lado a lado, cada qual com o seu celular. O milagre da refeição familiar é um silencioso teatro em que todos os comensais levam um garfo à boca, sem tirar os olhos do seu smartphone. Sinal dos tempos. Umberto Eco tinha razão quando disse que a imbecilidade poderia estar no banquinho junto ao balcão do botequim e que a internet fez com que os imbecis ganhassem o mundo. Se há benefícios, há também malefícios. Mas estes derivam exclusivamente da internet ou é a própria humanidade que tem alguns membros em decomposição? Para o escritor Jeff Jarvis, que escreveu "O Parêntese de Gutemberg", a internet é nada além de uma conversa gigante. "É uma praça pública, onde várias pessoas se juntam, algumas são inteligentes, outras são estúpidas e algumas estão erradas. Não devemos esperar que as empresas resolvam todos os problemas, embora possamos cobrar que elas façam melhor. O pessoal do Vale do Silício não causou todos os problemas da sociedade americana. Os EUA já eram um país sexista, desigual e injusto, muito antes da internet". Transplante-se isto para um Brasil em que a educação capenga e se preocupa exclusivamente com o adestramento do estudante para que memorize dados. Um país que, ao contrário das nações latino-americanas, que tiveram Universidade desde o século XVI, só recebeu a sua no século XIX. Mesmo assim, anacrônica e superada, com modelo que já existia há mil anos. Um país campeão das desigualdades. O "celeiro do mundo" que convive com trinta e cinco milhões de famintos. Mais da metade da população sem esgoto sanitário, sem água tratada, sem moradia, sem emprego, sem saúde e educação de qualidade. O que esperar quando essa população se vê às voltas com o mundo mágico da internet? Passa a acreditar em tudo. Ainda hoje, há quem duvide de que a vacina é imprescindível, mas acredita em chips chineses injetados por ocasião da Covid-19. Acreditam em terraplanismo, em comunismo galopante - que não existe sequer nos países que se autodenominam comunistas. Mas desconfiam de qualquer coisa que contrarie o seu fanatismo. Ou seja: a rapidez com que a internet produz conteúdo, atordoa aquele que não tem discernimento, não consegue sobreviver a essa inflação informativa. Mas não é culpa da internet! Os humanos gostam de fantasia, de ficção e de se imaginarem mais espertos do que os outros. Mergulham fundo nas inverdades, que sempre existirem, mas que agora ganharam apelido novo: "Fake News". Elas seduzem muito mais do que a verdade. A verdade, quase sempre, pode ser cruel e machucar. É melhor permanecer no engano, desde que acreditemos que o Grande Irmão também acredita em nós. Publicado no Jornal de Jundiaí, em 28 09 2023 voltar |
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