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Acadêmico: José Renato Nalini Se eu perguntar quem foi Milton Viola Fernandes, ninguém saberá dizer quem é. Mas se eu disser o nome pelo qual ficou conhecido - e como! - Millor Fernandes.
Milton Viola Se eu perguntar quem foi Milton Viola Fernandes, ninguém saberá dizer quem é. Mas se eu disser o nome pelo qual ficou conhecido - e como! - Millor Fernandes. Ele nasceu em 16.8.1923, no Rio, filho de imigrante espanhol com imigrante italiana. A má caligrafia do registrador civil escreveu "Millor", talvez também por causa da pronúncia do pai. Sua vida não foi fácil. Perdeu a mãe aos onze e já tinha perdido o pai aos dois anos. Iniciou-se na imprensa em 1938, em "O Cruzeiro", revista semanal muito popular à época. Em 1945, lançou a seção "Pif-Paf", que todos liam. Foi demitido em 1963, por uma série de reportagens chamada "Esta é a verdadeira história do Paraíso". Em 1964 fundou Pif-Paf, agora uma revista que, perseguida pelo arbítrio, só teve oito números. Em 1969, foi um dos fundadores de "O Pasquim". Durante sua vida escreveu inúmeros livros, escreveu peças, traduziu dezenas de clássicos e organizou três exposições individuais. Faleceu em 27 de março de 2012, aos oitenta e oito anos. Foi um dos poucos brasileiros cujo centenário se celebrou, ainda que modestamente. O único de seus livros que ainda não saiu do catálogo das livrarias é "Millor Definitivo - A Bíblia do Caos", da L&PM. O subtítulo dá o tom: "Dialética do irritante guru do Meyer". Ele era corajoso. Em pleno 1970, uma charge em "Veja" estampa um soldado expulsando uma família de esfomeados de um jardim, onde a placa informa: "É proibido comer a grama". Suas frases são antológicas e servem como tema para provas de filosofia, ética, sociologia ou direitos humanos, desde que entregues a cada aluno. Veja-se, por exemplo, o que um estudante escreveria sobre "O dinheiro não é tudo. Tudo é a falta de dinheiro". Mas não era superficial. Ao contrário. Escreveu "É", em 1977, uma peça teatral, a pedido do casal Fernanda Montenegro e Fernando Torres. A peça fala da inutilidade das teorias, quando se tenta aplica-las à vida real e cotidiano. Esteve em cartaz durante muitos anos. Em "Decálogo do Verdadeiro Humorista", de 1955, Millor dizia: "Para escrever, o humorista deve escolher sempre o assunto mais sério, mais triste, mais chato ou mais trágico. Só um falso humorista escreve sobre assuntos humorísticos". Seguiu seu conselho e escreveu "Os órfãos de Jânio", contraponto à peça "Os filhos de Kennedy", do dramaturgo americano Robert Patrick, que ele traduzira em 1975. São cinco personagens em um bar, em monólogos alternados e sucessivos, que se lembram de sua existência e do Brasil, nos vinte anos anteriores - a peça é de 1980 - desde a renúncia de Jânio Quadros. Já escrevera "Um Elefante no Caos", em 1955. Inclui-se na tradição das farsas, um gênero teatral surgido na Idade Média e que permaneceu nos períodos posteriores. O nome inicial da peça era "Por que me ufano de meu país", como era chamada uma cartilha para estudar Educação Moral e Cívica, editada em 1901. Ele teve de mudar o nome, pela censura e pela acerba crítica generalizada. Décio de Almeida Prado (1917-2000), respeitado crítico de arte, escreveu que os censores não souberam perceber que Millor escrevera um hino de amor ao Brasil. "Hino às avessas", por certo, mas muito bem elaborado por um ironista profissional. Mas ainda escreveu "Liberdade, Liberdade" (1965), "O Homem do Princípio ao Fim" (1967) e "A História é uma História" (1976). Quando estiverem tristes, procurem frases de Millor. Santo remédio! Publicado no Jornal de Jundiaí, em 24 09 2023 voltar |
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