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AS HIENAS GARGALHAM
Acadêmico: José Renato Nalini
Este é um país que destrói a sua natureza, que quer construir usinas de carvão, na contramão do mundo civilizado,

As hienas gargalham

O país de Pollyanas vê tudo cor de rosa! Que fantástica a situação brasileira! Vale a pena aumentar os Fundos Partidário e Eleitoral, para que o governo continue a atender às necessidades da população. Afinal, partidos políticos são muito mais importantes do que o resto. O resto é o povo.

Um povo muito exigente. Quer comer todos os dias. Pouco importa que praticamente um Chile inteiro – vinte milhões de corpos famélicos – passem mais de vinte e quatro horas sem ter o que comer. Além disso, quase vinte e cinco milhões não sabem como se alimentarão a cada dia. Outros quase setenta e cinco milhões têm a convicção de que estarão, em breve, em situação idêntica.

A Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – Rede Penssan, apurou que mais da metade dos brasileiros padeciam de insegurança alimentar em dezembro de 2020. Alguém se arriscaria a dizer que as coisas melhoraram desde então? Quem é que costuma frequentar supermercado, padaria ou qualquer outro tipo de comércio?

Este país que destrói a sua natureza, que quer construir usinas de carvão, na contramão do mundo civilizado, que multiplica os Partidos políticos, que só pensa em eleição e em reeleição, tem uma Escala Brasileira de Segurança Alimentar, que é utilizada pelo IBGE, para complementar a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – Pnad e Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF. Isso se fez antes do ressurgimento do fantasma da inflação, que penaliza principal e primeiramente a pobreza e a miséria.

Os brasileiros comem pouco e comem mal. Consomem o que é mais barato. Consideram pés de galinha uma iguaria e disputam ossos aos sopapos. Entre 2014 e setembro de 2021, a inflação subiu quase cinquenta por cento. Mais exatamente, 47,5. O valor do dólar mais do que dobrou. Isso faz com que toda a cadeia de nutrição se altere para piorar a situação dos desvalidos.

Será que o “agro é pop” tem notícias disso? O “milagre brasileiro”, a “salvação da lavoura”, não teria um projeto-piloto de emergência, para impedir que as crianças brasileiras passem fome?

Não há condições de se instituir um “bom prato” em todas as cidades, com as principais lideranças do agronegócio assumindo o compromisso de dar de comer a quem tem fome? É vergonhoso saber que nos “vales verdes e férteis”, onde jorra a produção potencializada com a informatização da lavoura, seres humanos não tenham o mínimo existencial em termos de sobrevivência.

O mundo encara com perplexidade esta potência que teria tudo para possuir a população mais bem alimentada do planeta, mas não cuida de cumprir o que sua Constituição ordena: edificar uma sociedade justa, fraterna e solidária. Com erradicação da miséria e redução das iníquas desigualdades sociais.

Especialistas do United Nations World Food Programme, o programa mundial de alimentos da ONU, estranha que o Brasil, ao contrário da África, conviva com uma tributação que aprofunda as diferenças e aflige ainda mais os aflitos. Onerar o consumo é condenar brasileiros a morrer de fome.

Enquanto se discutem regras eleiçoeiras, para garantir a profissão política, deixa-se de encarar a nefanda carga tributária que está condenando o Brasil a retroceder, aceleradamente, rumo à condição de “pária alimentar”, depois de já ter alcançado o ranking de “pária ambiental”.

De acordo com quem entende disso, pois atua nas regiões menos desenvolvidas do planeta, países periféricos e de escasso grau civilizatório, como é o Brasil, “a tributação sobre o consumo é uma das mais injustas, porque os pobres consomem toda a sua renda no dia a dia. Temos que modificar isso, para que os mais ricos contribuam mais via Imposto de Renda”. Não quer isso dizer que se pretenda equalizar todas as pessoas, em si irrepetíveis, singulares e heterogêneas. Apenas se reclama bom senso para que ninguém venha a morrer de fome, junto aos silos abarrotados pelas supersafras garantidas por uma revolução inteligente do agronegócio.

Enquanto o tema único para os brasileiros que teriam condições de mudar o cenário é a eleição e a matriz da pestilência que é a reeleição, tudo converge para tornar a situação dos humildes mais humilhante ainda. Evidente a redução dos gastos sociais, com a desidratação da bolsa família, desamparo à pesquisa e à educação que viria – ainda que a longo prazo – conceder aos carentes, condições de superação desse flagelo.

O silencioso espetáculo de horror não comove os mandatários de cargos e funções para as quais foram eleitos por essa população rumo ao verdadeiro patíbulo da fome. Continuam a gargalhar, quais hienas que sabem da impotência de um mandante desprovido de qualquer forma de participação na gestão da coisa pública e, portanto, nenhuma ameaça paira sobre eles. Seus privilégios estão garantidos pela democracia formal.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 25 10 2021





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