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FAKE NEWS É COISA VELHA
Acadêmico: José Renato Nalini
Disseminar inverdades não é coisa nova. Existe desde que o homem passou a viver em sociedade.

Fake news é coisa velha

Disseminar inverdades não é coisa nova. Existe desde que o homem passou a viver em sociedade. Todos os que fazem algo a mais do que cuidar de seu próprio umbigo, sofrem as consequências da fofoca, dos comentários desairosos, de várias expressões da malícia humana.

Um episódio da História paulista é exemplo de como isso ocorria aqui, há mais de um século. Armando de Salles Oliveira, que foi interventor e governador de São Paulo, era um homem preocupado com a desorganização, característica típica do brasileiro. Dizia sempre: “O problema brasileiro é um problema de organização e a organização se faz, na maioria dos casos, sem a exigência de novos recursos financeiros”.

Aplicava isso na iniciativa privada e levou para a vida pública. Foi um dos criadores do IDORT, o Instituto de Organização Racional do Trabalho e seu primeiro Presidente. Graças a ele a ideia vingou, em fase muito difícil para o Brasil. Quando Ferraz do Amaral historiou a experiência do IDORT, recorda o trabalho desenvolvido por Armando: “Os pósteros dirão um dia da benemerência desse que foi o primeiro chefe de Estado a aplicar métodos científicos na administração da coisa pública no Brasil. Detenhamo-nos em nosso restrito âmbito social e recuemos um instante até os idos de 1930, quando a situação econômica do mundo e a do país, abalado por uma revolução, que se julgava iria resolver o mais recôndito da maneira de pensar em termos de vida nova. Armando de Salles Oliveira foi dos poucos que enxergaram. O momento que vínhamos vivendo causava-lhe acerbas preocupações”.

A criação do IDORT respondeu a essas angústias. Quando já estava no terceiro ano de sua existência, Armando Salles foi escolhido para ser Interventor Federal em São Paulo. Cinco meses após assumir o governo de São Paulo, ele reconheceu o IDORT como instituição de utilidade pública. Mas os maledicentes de sempre começaram a propalar que isso foi favoritismo, proteção descabida, lesiva aos interesses da população.

Armando de Salles Oliveira não era homem que deixasse sem resposta os ataques desferidos contra a sua pessoa e o seu governo. Isso ele não deixava para os auxiliares, mas ele próprio se encarregaria de responder aos detratores. Era um conhecedor da alma humana e isso transparece naquilo que então escreveu:

“Um dos aspectos mais característicos destes tempos é o da vaga de notícias falsas que todos os dias cobre o nosso país e especialmente São Paulo. Por mais calvas e inverossímeis que sejam, perturbam todo o mundo. É que não deixam de encontrar ouvidos ávidos para as recolher e bocas dóceis para as propagar, sem dúvida na melhor das intenções, mas sempre com os inevitáveis exageros. Essas falsas notícias são às vezes o simples produto de imaginações que se comprazem em alimentar o pendor do povo pelo sensacional. Neste caso, são inocentes bolhas de sabão que se enchem e rapidamente sobem para o ar e lá se desfazem sem deixar vestígios, inócuas como a fantasia que as gerou. Outras vezes, porém, são filhas exclusivas da malevolência e, gotas de fel, impressionam os espíritos desprevenidos e espalham a inquietação e o temor. O processo é velho, não há remédio para o mal que faz, mas não será inútil denunciar esse esforço tenaz com que se procura destruir a convicção de estar encerrada a era de sobressaltos que perturbaram tão violentamente a vida política e social de São Paulo nos últimos anos. Quanto a mim, essas gotas de fel nenhum mal me fazem. Só aceitei o meu cargo por estar certo de poder suportar todos os venenos imagináveis, até mesmo a traiçoeira cicuta da calúnia”.

A cicuta da calúnia não foi a única retribuição recebida por Armando de Salles Oliveira em sua carreira. Ele renunciara ao governo do Estado para se candidatar à Presidência da República. O golpe de 10 de novembro de 1937 fez com que ele fosse preso e exilado.

Quando já hospitalizado e de onde não sairia vivo, quem o visitava dele ouvia recomendações sobre planejamento e organização da administração pública e das atividades privadas. O homem que fundou a Universidade de São Paulo também foi iniciador da organização científica na Administração Pública brasileira. Faleceu em 16 de maio de 1945.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 01 09 2023



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