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OS GRANDES ESQUECIDOS
Acadêmico: José Renato Nalini
Um desses vultos hoje praticamente esquecidos é Fernão Dias Paes - e não Paes Leme, observa Affonso de E. Taunay, em "A Grande Vida de Fernão Dias Paes".

Os grandes esquecidos

A fugacidade da vida e o banquete da superficialidade, atuando em conjunto, contribuem para enterrar mui rapidamente os vultos que mereceriam, na memória universal, um cultivo eterno. Um desses vultos hoje praticamente esquecidos é Fernão Dias Paes - e não Paes Leme, observa Affonso de E. Taunay, em "A Grande Vida de Fernão Dias Paes".

Não se sabe onde nasceu. Provavelmente em São Paulo ou imediações e no ano de 1608, segundo o inventário de seu pai. Pois tinha, em 1633, vinte e cinco anos de idade. Era de família nobre e fidalga. Sua descendência se apura através de vários séculos de presença nas Cortes Portuguesas.

O ambiente de Piratininga do Brasil seiscentista, povoação ilhada da civilização, não permitia houvesse grande preocupação com documentos. Retratos não existem. De Fernão Dias Paes ficaram poucos e fragmentados despojos, pois foi sepultado na Igreja de São Bento. Quando o templo foi reformado, o abade Dom Miguel Kruse autorizou a abertura do esquife. Os ossos mostravam alguém com elevada estatura, verdadeiro gigante para a época.

Sabe-se que a 2 de julho de 1640, já de volta de sua peregrinação ao sul, assinou um "Termo de notificação que se fez aos padres da Companhia de Jesus". Eles foram intimados a sair de São Paulo.

Em 1639, Fernão Dias Paes era capitão das ordenanças da Vila de São Paulo e eram tempos amargos. Os holandeses ampliaram as fronteiras do seu domínio até o São Francisco no sul, e até ao Ceará no norte. As esquadras holandesas queriam mais. Uma delas apareceu na barra de Santos e ameaçou São Vicente e a Vila de Braz Cubas. Não era a primeira vez. Já em 1615 a esquadra de Joris van Spilberg provocara os vicentinos e os paulistas desceram a serra sob o comando de Sebastião Preto, para rechaçar os invasores.

Em 1640 o assalto foi muito mais grave. Não se encontram documentos sobre essa verdadeira guerra. Só se preservou a certidão passada a 16 de dezembro de 1640, pelo capitão-mor da Capitania de São Vicente, João Luiz Mafra. Este pediu o auxílio dos paulistas e Fernão Dias Paes acorreu com sua companhia armada.

Nesse mesmo 1640, em São Paulo, houve uma batalha campal entre os Taques e os Camargos. Aqueles, liderados por Pedro Taques, cunhado de Fernão Dias Paes, pois casado com Potência Leite, irmã do bandeirante. Estes, por Fernão de Camargo, apelidado "Tigre", por sua ferocidade.

Para culminar, os jesuítas opunham resistência às entradas ao sertão e à captura de índios. Por isso os paulistas impuseram aos padres do Colégio deixassem São Paulo. Os jesuítas resistiram, mas a turba ignara exigia a sua partida. O padre que substituía o Reitor encarregou o vigário de administrar os bens da Companhia de Jesus, inclusive os objetos utilizados no culto. E ainda registrou em ata: "Peço ao mesmo reverendo Padre olhe com particular cuidado que se não façam agravos aos escravos e índios forros de serviço desse Colégio, mandando lhes dizer algumas missas quando alguns deles morrer, pagando a esmola dos bens deste Colégio".

As idas e voltas da História. Se em 1640, Fernão Dias Paes se colocou em antagonismo com os jesuítas, em 1655, foi dos que mais prestaram auxílio à reintegração deles em seu colégio. Na verdade, atribui-se exclusivamente a ele o regresso dos inacianos a Piratininga.

Em 1641, "Tigre" assassinou Pedro Taques. Homicídio que afetou Fernão Dias Paes, que se tornou irredutível adversário dos Camargos, na segunda fase da cruenta guerra civil. De 1653 a 1660, ele se tornou a primeira figura do cenário paulista, durante as sanguinolentas peripécias da guerra civil entre Pires e Camargos. Encerrado o litígio em 1660, já em 1661 Fernão Dias Paes faz a sua grande jornada ao sul, em território hoje paranaense. A região de Apucarana se chamava Guaíra e entre os guainás, ele permaneceu logo tempo.

Em 1664, de volta de sua incursão à pátria indígena, volta a São Paulo e recebe de Afonso VI de Portugal, pedido concitando-o a auxiliar a expedição das esmeraldas de Agostino Barbalho. Contudo, permaneceu em Piratininga até 1672, quando convidado a organizar bandeira para ir às esmeraldas. No ano seguinte partiu para a sua fantástica empreitada em Minas, da qual não voltaria com vida. Algo para se contar uma outra vez.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 09 08 2023



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