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Acadêmico: José Renato Nalini Dizia-se antigamente que pretensão e água benta, o interessado usa como e quando quiser. Na proporção que entender adequada.
Pretensão mais água benta Dizia-se antigamente que pretensão e água benta, o interessado usa como e quando quiser. Na proporção que entender adequada. Pois é o que o Brasil sugere, quando tenta propor à União Europeia que esta o considere um país de baixo risco de desmate. Como é que, na condição de "Pária Ambiental", a registrar recordes mensais de extinção da cobertura vegetal, não só, mas principalmente na Amazônia, convencerá a atenta Europa de que não desmata e não há risco de vir a fazê-lo? Para isso, precisaria mostrar que a nomeação de Marina Silva não é gesto simbólico, para convencer a comunidade internacional de que se levará a sério o artigo 225 da Constituição da República. Mais ainda, provar que o desmanche do Ibama cessou e que suas estruturas estão sendo recuperadas e equipadas, para atender à sua vocação de protetora da floresta. Teria de persuadir os europeus de que a regularização fundiária será enfrentada como política estatal permanente. Os estrangeiros sabem que nem a União tem noção exata de qual a dimensão de suas terras. Com isso, a criminalidade organizada ganha desenvoltura para destruir, para incendiar, para grilar, para fabricar desertos. Está muito certo o Parlamento Europeu ao avalizar a lei comunitária, com validade e incidência nos vinte e sete países que compõem a União, de vedar o comércio de produtos vinculados ao desmatamento. O velho continente sabe que a mudança climática é a mais grave ameaça já enfrentada pela humanidade. E não desconhece que o Brasil é um emissor potente de gases produtores do efeito-estufa, quando permite que uma escancarada ilicitude extermine a última grande floresta tropical do planeta. Também não se deve confiar que a certificação a respeito desses produtos - madeira, soja, milho, cacau, café, borracha, algodão, etc. - mais aqueles oriundos da pecuária, permaneçam sob a responsabilidade brasileira. Aqui é fácil falsificar, emitir declarações fictícias, valer-se da corrupção endêmica, praga que nos acompanha desde a chegada dos portugueses em 1500. Criticar as exigências europeias é reclamação de mau perdedor. E o Brasil é um péssimo perdedor. Destrói o seu maior patrimônio, compromete o futuro das gerações que ainda não nasceram, regride em seu dever de assegurar ambiente saudável para todos, ao se acumpliciar com os criminosos que atuam em todos os biomas. Este país que já foi promissora promessa ecológica, viu-se alvo de uma infeliz conjunção de fatores: criminosos e Estado, de mãos dadas, empenhados em acabar com a floresta. Com argumentos pífios e imbecis, como a imaculada soberania - "os europeus já destruíram suas matas, não têm legitimidade de impedir que agora destruamos as nossas" - ou a falácia de que a Amazônia continua intacta. Assim como os portugueses a encontraram ao aqui aportarem. Tudo convergindo para a dramática situação a que chegamos. A resposta que o Brasil poderia fornecer ao mercado importador seria um projeto de uso da inteligência e da tecnologia para que nossos biomas deixassem de ser meros fornecedores de comodities, para oferecer aos importadores produtos ecologicamente corretos e de valor agregado. Punir exemplarmente os dendroclastas, os grileiros, os que exploram minérios em áreas demarcadas, em reservas ecológicas, municiar os Estados da Amazônia Legal e aqueles que integram biomas como o cerrado e a Mata Atlântica, o Pantanal e os Pampas, de equipamentos hábeis a evitar a delinquência ambiental, isso sim, seria gesto responsável para recuperar o comprometido valor reputacional da palavra estatal tupiniquim. A Europa já sofre com falta d'água e assiste, entre estarrecida e temerosa, ao comprometimento do estoque de água doce de que o Brasil dispunha e do qual abre mão, entregando-o à insanidade generalizada. Por isso é que, sem respostas concretas, sem ação exemplar, sem atitudes responsáveis, o Brasil não convencerá a União Europeia de que deva celebrar acordo com o Mercosul. Sem uma reação compatível com os recentes desmandos, sua pretensão não ecoará num espaço em que a civilização chegou há mais tempo e se consolidou. Civilização, bem essencial de que estamos ainda distanciados, na evidente regressão constatável em todos os planos e cuja neutralização parece também remota. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão Em 15 07 2023 voltar |
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