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CIDADANIA CHAMADA A AGIR
Acadêmico: José Renato Nalini
Como consequência de uma educação superada, anacrônica e, em muitos casos verdadeiramente imbecil, a cidadania não participa da gestão da coisa pública.

Cidadania chamada a agir

Desde a promulgação da Constituição Cidadã de 1988, tenho observado que o Estado de direito de índole democrático então instaurado foi tímido em iniciativas. O constituinte apenas incluiu plebiscito, referendo e iniciativa popular entre os institutos da democracia direta ou semidireta. Poderia ter introduzido no sistema o veto popular e o recall. Por isso, aquela dicção "todo o poder emana do povo que o exercerá diretamente, nos termos da Constituição ou por representantes eleitos", fica um pouco prejudicada.

Talvez por isso e como consequência de uma educação superada, anacrônica e, em muitos casos verdadeiramente imbecil, a cidadania não participa da gestão da coisa pública. Deixa a cargo da política profissional, que se entrega à insaciável busca de poder e de bens materiais, obtenção de verbas por emendas parlamentares, aumentando os lamentáveis Fundos Partidário e Eleitoral e mantendo a matriz da pestilência chamada reeleição.

Poucos os cidadãos verdadeiramente ativos, interessados em aprimorar a convivência, hoje tão prejudicada pela predominância dos mesquinhos focos paroquiais e medíocres.

Mas de quando em vez raia uma luz. Tímida, fraca, mas um lampejo que precisa da participação de todos para se tornar um farol que ilumine o nosso amanhã.

Os Bancos Brasileiros, que percebem o que ocorre no mundo, viram que a União Europeia disciplinou em abril último o controle das entradas, em seu território, de bens que possam provir de desmatamento. Esse crime hediondo, que extermina o futuro e põe em risco a própria continuidade da aventura humana sobre o sofrido planeta.

Vai daí que vão controlar os frigoríficos, a fim de verificar se compram gado proveniente de áreas desmatadas na Amazônia Legal e no restante do Maranhão, como condição de aprovação de pedidos de crédito.

Essa providência da FEBRABAN é uma reação do setor às inafastáveis preocupações com o maior perigo que ronda a humanidade, que é a mudança climática.

Diz-se que o sistema bancário brasileiro tem uma das estruturas mais sólidas e inteligentes sobre a face da Terra. É um exemplo de autorregulação e, quando se trata de cuidar de seus interesses legítimos, os bancos brasileiros se unem. Não há competição quando se cuida da sobrevivência do sistema.

Assim, quando procurados para o fornecimento de crédito a frigoríficos e matadouros, exigirão destes que cumpram um protocolo com requisitos comuns para combater o desmatamento ilegal. Isso consiste na implementação de um sistema de rastreabilidade e monitoramento, apto a demonstrar qualquer aquisição de gado associado ao desmatamento ilegal, por fornecedores diretos e indiretos.

É claro que há quem se recuse a cumprir essa exigência. Invoca-se a autonomia para cuidar dos próprios interesses e impugna-se a terceirização de responsabilidade própria - dos bancos - para os frigoríficos. Para demonstrar a irresignação, pretendem que isso se aplique a todo e qualquer correntista dos bancos.

Mas a verdade é que as instituições financeiras sabem o que significa se indispor com o mercado importador da Comunidade Europeia. Por isso, perfilham a orientação mais civilizada, aquela que já é válida no Velho Mundo. E não podem pensar que os vinte e sete países da União Europeia deixem de comprar carne bovina, café, soja, milho, ou qualquer outro produto brasileiro produzido mediante prática de crime hediondo, a dendroclastia, a derrubada de nosso maior patrimônio: a exuberante biodiversidade contida na cobertura verde da última grande floresta tropical do planeta.

Onde está a cidadania nesse ajuste?

Num canal denominado "Conte Aqui", previsto na autorregulação da Febraban, para denunciar descumprimento normativo. Assim qualquer pessoa interessada na preservação da floresta, poderá acompanhar a observância desse protocolo, ainda tímido, mas algo que mostra a preocupação dos bancos com a criminosa destruição do bioma amazônico, o mais afetado pelo extermínio imposto pela criminalidade organizada.

Não se espere muito de governo, bom em discursos, miserável na prática da tutela ambiental. Haja vista as derrotas impostas não ao Executivo, mas aos brasileiros de hoje e de amanhã, pela tentativa de exploração de petróleo na foz da Amazônia e esvaziamento do Ministério do Meio Ambiente, que parte do mundo considerava blindado sob esta gestão.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 26 06 2023



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