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Acadêmico: José Renato Nalini O Conselheiro Ribas era um espírito iluminado. Erudito, nunca deixou de estudar, exercício constante durante toda a sua existência.
Táticas do Conselheiro Ribas Crescem as vozes em torno à urgente reformulação do ensino brasileiro. Aulas expositivas que transmitem informações nem sempre atualizadas, que podem ser confrontadas mediante um clique num dispositivo eletrônico, não animam o alunado a se envolver no aprendizado. Os docentes mais sagazes recorrem a métodos do chamado "ensino ativo", que funcionam a contento. Mas quem se dispuser a conferir o histórico de velhos mestres, se surpreenderá com o que já se fazia há quase dois séculos. Examine-se, por exemplo, a vida e a carreira do Conselheiro Antônio Joaquim Ribas, nascido no Rio de Janeiro a 3 de maio de 1818. Foi preparado por Júlio Frank e, dileto aluno, recebeu do mestre muito mais do que o necessário para ingressar na Academia do Largo de São Francisco em 1835. Destacou-se no curso por sua aplicação e tirocínio. Bacharelando-se, inscreveu-se para a defesa de tese e, para a sua arguição, faltaram dois professores sorteados: os Conselheiros Crispiniano e Ramalho. Isso repercutiu como gesto de hostilidade para com o doutorando. Ele guardou essa mágoa por toda a vida. E, mais tarde, Crispiniano reprovou o filho de Ribas, fazendo com que ele fosse terminar a faculdade no Recife. Pois Antônio Joaquim Ribas ofereceu-se para reger a Cadeira de História Universal, vaga com a morte de seu preceptor, Júlio Frank. O Governo aceitou e, posteriormente, foi nomeado catedrático em 1842. Os alunos não faltavam às suas aulas. Exercia um elevado magistério. Era professor completo. "Metódico e claro na exposição, profundo nas investigações, criterioso nos conceitos, lógico e agudo na crítica, invencível na argumentação. E todas estas vantagens realçadas, quanto à forma, por palavra fluente e elegante, dicção nítida e voz de agradável timbre", na visão de Almeida Nogueira. Tanto assim, que foi convidado a substituir Silveira da Mota na cadeira de Direito Administrativo. Este era um docente sui generis. Deu a aula inicial, mera apresentação, e faltou dias seguidos. Ao voltar, disse que não encontrara livro adequado e se serviria do "Jornal do Comércio" que estampara o orçamento do Império. O Conselheiro Ribas tinha exata noção de que aluno não perdoa. Se percebem fragilidade, coitado do mestre. Mas, se ao contrário, reconhecem talento, erudição e amor ao ensino então aumenta o respeito e o real progresso no aprendizado. Ele já exercitava um método ativo em suas aulas. Ficou uma semana a explicar um só ponto do programa. Na aula seguinte, sem prévio aviso, quis ouvir seus alunos. Estes fizeram algumas críticas. Ribas os ouviu com toda a atenção e depois refutou todas as objeções. Foi vitorioso. Tão claro, tão preciso, tão convincente, que os deixou mudos, sem qualquer possível réplica. Vencidos, mas convencidos. E assim decorreu sua carreira docente. Primeiro como substituto, depois como Catedrático de Direito Civil, a partir de 1860, foi um dos mais respeitados professores da São Francisco. Não se satisfazia com explicar bem. Ele queria ser bem compreendido. Costumava exigir dos alunos noções claras e definições precisas. E se valia do método socrático. Se as respostas fossem vagas, incompletas, ele passava a formular novas questões. Alunos seus mencionavam alguns episódios exemplificativos. Perguntava Ribas a um examinando: - "O que se entende por pessoa?". - "Pessoa é todo ente capaz de direitos e obrigações", respondeu o discípulo. - "E o que é ente?", prossegue Ribas. - "Ente é tudo que existe; mas estou em dúvida...". Quando o estudante hesitou e começou a fazer um movimento oscilatório com o indicador e o dedo maior da mão direita, a balbuciar - "Dúvida, professor...dúvida?...". O professor Ribas o interrompe: - "Não diga nada! O senhor não poderá encontrar definição oral tão expressiva como esse gesto que está fazendo. Dúvida é isso mesmo: é a vacilação entre dois juízos". O Conselheiro Ribas era um espírito iluminado. Erudito, nunca deixou de estudar, exercício constante durante toda a sua existência. Não o animava, contudo, o desempenho da advocacia. Nem se apaixonava pela política partidária, embora tenha sido Deputado Provincial entre 1850 e 1861. Deixou o livro "História dos Paulistas", obra de que se tem notícia por referências esparsas e de que se não conhece exemplar em qualquer biblioteca. Jubilou-se em 23 de fevereiro de 1870, mudou-se para o Rio e ali ainda viveu por mais vinte anos. Faleceu em Petrópolis, a 22 de fevereiro de 1890. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão Em 17 06 2023 voltar |
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