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Acadêmico: José Renato Nalini O Brasil sempre negligenciou a escola. Não é por acaso que as colônias espanholas tiveram Universidade desde o século XVI e nossas Escolas superiores datam do século XIX.
Educação: descaso antigo Costuma-se atribuir a falência da educação pública - e da educação em geral, inclusive a particular - à perda de sensibilidade dos contemporâneos. Ilusão. O Brasil sempre negligenciou a escola. Não é por acaso que as colônias espanholas tiveram Universidade desde o século XVI e nossas Escolas superiores datam do século XIX. Pense-se há apenas duzentos anos ou pouco menos. Em 1836, dos 21.933 habitantes da cidade de São Paulo, apenas 1.009 eram "pessoas que, sabendo ler e escrever, são aptas para serem empregadas". São Paulo contava com dois seminários, que abrigavam dezenove rapazes e trinta e três meninas, nove escolas elementares com um total de duzentos e sessenta e sete rapazes e sessenta e três meninas. Pequeníssima fração das crianças frequentava as aulas. Alguns membros da Câmara se preocupavam com o analfabetismo dominante. Exigiam inspeções e em 1832, estas revelaram que todas as escolas de São Paulo estavam "em bastante relaxação, seja porque o governo não havia prestado os utensílios necessários para as aulas, seja pelo pouco zelo que animava então aos respectivos professores". O absenteísmo era a regra e a aplicação e disciplina eram escassas. O pouco caso em relação à docência aumentou quando foram proibidos os castigos físicos. Todos os Presidentes da Província entre 1835 e 1845 se queixaram da falta de professores formados, do estado de ruína dos prédios das escolas e da ausência de inspeção escolar. Um elogio de Daniel Kidder, que visitou São Paulo nessa época e escreveu "Brazil and the brazilians", em relação a uma escola que considerou "a mais florescente do Império", deve-se a uma circunstância especialíssima. O fervoroso missionário encontrou alunos aprendendo a ler em trechos da Bíblia. Daí a sua observação: "Lições muito apropriadas foram escolhidas, de acordo com a capacidade dos pequenos leitores e não podem deixar de exercer a mais benfazeja das influências sobre os seus espíritos, bem como sobre os seus corações". Os dois seminários, fundados em 1825, não estavam melhores na década de trinta. O primeiro diretor do seminário de meninos dedicado a Sant'Ana frequentemente abandonava seu posto. Em 1829, seu substituto era um menino de treze anos. Um dos professores mais antigos era incompetente e se utilizava exclusivamente de jornais como material de aula. O prédio estava deteriorado. Os escravos fugiam e deixavam os alunos sem roupa limpa, com roupa para consertar e com uma insuficiente dieta de couve e farinha de milho. A regra era que pela manhã, um aluno designado gritava: "Acordai, ó irmãos, do sono que é sombra triste da morte: vamos adorar o Senhor!". A distância do seminário em relação ao centro da cidade impedia uma supervisão mais eficiente. Não era melhor a situação das meninas do Seminário da Glória. O prédio estava em frangalhos e superlotado. Pensou-se e executou-se uma loteria provincial para fornecer fundos de sua manutenção. Mas o dinheiro nunca foi entregue. A inspeção levada a efeito em 1830 denunciava boa orientação moral e aulas de costura. Mas faltavam escravos para os serviços essenciais, sobretudo de limpeza e manipulação alimentar. Também se criticava a ausência de leitura do catecismo e da Constituição Nacional de 1824. E como a diretora nada entendia da matéria, não havia aulas de aritmética. Mais tarde houve queixas contra a falta de um capelão e de uma enfermaria, assim como em relação ao refeitório insalubre e a admissão de alunas com deficiência mental. Em 1839, o Presidente da Província declarou que os dois seminários eram mal dirigidos e necessitavam de reestruturação. A população, à época, entendia que as mulheres não precisavam mais do que saber cuidar da cozinha e de filhos. A resistência a qualquer mudança anestesiou a sociedade. Em 1836, o governo provincial tentou criar uma chamada "Fazenda Normal", em antiga propriedade jesuítica no bairro de Sant'Ana, paróquia rural de São Paulo. Ali deveriam os órfãos não escravos estudar doutrina cristã, educação cívica, geometria, mecânica, química, botânica e agricultura. Debalde. Logo no ano seguinte, o diretor reclamava que a fazenda estava "cheia de mato e formigas e a casa bastante arruinada". O pouco que se havia plantado era insuficiente até para o sustento dos residentes. E os dez escravos "só encontravam tempo para maldades e tentativas de fuga". Insistiu em mais escravos, gado, instrumento, plantas e sementes. Como não foi atendido, em 1838 a fazenda foi abandonada. Outra inovação foi o Gabinete Topográfico, fundado em 1835 e destinado a ser escola de engenheiros civis, depósito de instrumentos geodésicos e biblioteca de mapas regionais e projetos de estrada. Começou com catorze alunos e em 1842 contava com vinte e três. Mas em 1849 foi suprimido por dois anos e, finalmente, deixou de existir. Já a Academia de Direito, criada em 1827 e instalada em 1828, foi outra história. Sempre voltamos a ela. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão Em 01 05 2023 voltar |
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