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SEJAMOS HONESTOS!
Acadêmico: José Renato Nalini
A esperança de novos tempos, para recuperar os anos perdidos, se esvai ao se assistir à continuidade do palanque e a luta incruenta pelos cargos e funções, todos dispostos a continuar a exaurir as tetas da República.

Sejamos honestos!

Encarada com franqueza e humildade a aventura humana sobre este maltratado planeta, o Brasil não tem muito a oferecer. Como nação, ainda não resolveu seus paradoxos. Foi o último país a abolir a escravidão. Praticou genocídio contra milhares de etnias indígenas, dizimou raças e culturas. Acabou com a Mata Atlântica, tão exuberante que fez os portugueses acreditarem haver redescoberto o Jardim do Éden.



Nunca enfrentou guerra externa, mas matou milhões de filhos em vários episódios cruentos. Pode parecer algo irrelevante, mas não mereceu um só Prêmio Nobel. Aqui do lado, vários países sul-americanos já foram contemplados. Quem mora no estrangeiro diz que a única menção que se faz ao Brasil é a Amazônia.

Tem-se de praticar a humildade, como o faz João Moreira Salles, no livro cuja leitura é imprescindível, por parte dos brasileiros que querem algo melhor para a sua Pátria. Ele reconhece: "A despeito da retórica ufanista, o Brasil é pouca coisa. Não é potência econômica, nem científica, nem tecnológica, nem geográfica. Longe disso. Quinhentos anos depois da chegada dos portugueses ao litoral baiano, não temos muito o que mostrar ao mundo. O cenário à frente também não é promissor. Num século que se organiza cada vez mais em torno não de coisas, mas de conhecimento, nossas perspectivas parecem medíocres. Países como a China importam cérebros; o Brasil tem escolhido exportar os seus, movimento que ganhou volume nos últimos anos e se transformou numa verdadeira fuga de pesquisadores. Para que haja cientistas é preciso haver ciência. A cada novo corte de verbas para pesquisa, a cada criacionista indicado para cuidar das escolas e bibliotecas do país, o Estado brasileiro reafirma que não trilha esse caminho".

A esperança de novos tempos, para recuperar os anos perdidos, se esvai ao se assistir à continuidade do palanque e a luta incruenta pelos cargos e funções, todos dispostos a continuar a exaurir as tetas da República.

O agro propaga o seu estrondoso sucesso. Mas João Moreira Salles observa: "a soja do Centro-Oeste brasileiro é idêntica à soja cultivada no continente africano ou na Sibéria. Se o Brasil soube fazer a sua revolução agrícola, outros países podem fazer a deles, como prenunciam as mudanças climáticas e as transformações tecnológicas em curso. Resta saber se a concorrência mais forte virá das novas fronteiras de plantio ou dos laboratórios".

A única formidável chance do Brasil está em nossa natureza, que tem sido exterminada sem dó. "Temos a maior biodiversidade e a maior quantidade de carbono estocado em matéria orgânica do planeta (a Rússia nos ultrapassa, se incluído o carbono capturado no solo).Mais do que importante, esse é um patrimônio crucial. Num mundo fadado a enfrentar a emergência climática que se avizinha, preservar a maior floresta tropical do mundo é, antes de tudo, um dever de civilização. Para um país que contribuiu tão pouco para a felicidade do planeta, cumprir essa tarefa já seria imenso. Isso deveria bastar, mas os benefícios não se esgotam aí, pois não se resumem apenas ao cumprimento da responsabilidade moral: até segunda ordem, esse patrimônio vital que nos foi legado arbitrariamente pelas vicissitudes da química e da física da Terra é o único em condições de nos dar alguma relevância global", enfatiza Moreira Salles.

Nunca demos a devida importância a essa riqueza. Ganância rima com ignorância. Ambas caminharam juntas e movidas pela insaciável fome que mantém ativos os espíritos inferiores: o dinheiro. Foram deixando terra arrasada. Pastos abandonados tendentes à desertificação. João Moreira Salles, otimista, pensa que "num aparente paradoxo, tamanho desperdício, esse excesso de terra abandonada, essa França onde nada se produz - quase um terço de tudo o que foi desmatado desde que os dados começaram a ser compilados por satélite -, pode ser percebido, não sem dor, como uma trágica vantagem". Isso porque aquilo "que precisava ser desmatado, já foi, com sobras, e em boa parte para nada. O país destruiu bem mais do que precisava e agora se vê com uma oferta abundante de terras improdutivas. Nesses pastos inóspitos é possível erguer outro tipo de economia". Por isso, "um projeto de país digno do nome seria compreender todo esse potencial e essa riqueza e, a partir daí, transformar o Brasil naquilo que pouquíssimos países estão habilitados a ser: uma potência ambiental dos trópicos".

Teremos clarividência, seriedade e vontade política para tanto? A conferir.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 25 02 2023



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