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Acadêmico: José Renato Nalini Para Eduardo Prado, "a ditadura é o engrandecimento nacional, porque é o regime em que o poder pode tudo e em que o cidadão vale nada".
Você quer mesmo a ditadura? Seriam desavisados os que pleiteavam intervenção militar acampados às portas dos quartéis? Teriam noção do que significa um regime de força, considerado preferível à presumível socialização do país, ameaça que renegavam e da qual procuraram fugir? Talvez lhes falte conhecer um pouco mais da história do Brasil, que trocou o estadista magnânimo Pedro II por uma república atabalhoada, logo tendente a adquirir tonalidades autoritárias. Para estes, é imperiosa a leitura de "Os fastos da ditadura militar no Brasil", escritos pelo grande paulista e paulistano Eduardo Prado. Para ele, espírito cosmopolita, intelectual que militou em todas as áreas, implantara-se no Brasil uma ditadura, a partir de 15 de novembro de 1889. Desde então, vislumbra-se a potencialidade de um endurecimento no exercício do poder. Um poder que vicia e que tende a se eternizar, de que é sintoma a matriz da pestilência chamada reeleição. Sebastião Pagano, em seu livro "Eduardo Prado e sua época", observa: "Há inconscientes que suspiram por uma ditadura para a "salvação" do país, e, das inúmeras que a república apresentou, a começar pela de Deodoro, o proclamador, resta essa montanha de escombros das liberdades públicas, da desmoralização do país e do perpétuo recomeçar pelos fragmentos restantes que dia a dia vão se partindo mais e pulverizando a sagrada herança da História". Invoca a ironia de Eduardo Prado, para quem "a ditadura é o engrandecimento nacional, porque é o regime em que o poder pode tudo e em que o cidadão vale nada". E mais: "A ditadura, quando não se notabiliza pelo crime, distingue-se pela vaidade". Regimes ditos democráticos, "do povo, para o povo e pelo povo", não raro atuam contra o povo. Chefes saídos do povo, militares ou civis, pela sua absoluta falta de educação política, seu egoísmo e ambição, têm brindado a civilização com esses espetáculos degradantes da autocracia total". Eduardo Prado era monarquista indignado com o golpe cruel que derrubou o Imperador e o expulsou, e à sua família, na calada da noite. Não silenciou. Usou, direta, ardente e virilmente, a pena e a oratória. Publicou "A ilusão americana" e incomodou o poder. "Lógico é que a república que se apoderara do país sem nenhuma consulta à nação que foi aceitando a situação imposta e inelutável, não o visse com olhos ternos. Perseguiu-o. o marechal de ferro, Floriano Peixoto, mandou prendê-lo. Teve de fugir, primeiro para a Bahia e de lá para Londres, onde se encontrou com Ruy Barbosa, também arrependido de haver apoiado a República. A narrativa dessa fuga está em várias obras e adquiriu mais de uma versão. Alguns dizem que Eduardo Prado estava em sua fazenda do Brejão. Outros, que estava em São Paulo. Dona Veridiana, sua mãe, fê-lo vestir-se como trabalhador da lavoura e, acompanhado por Navarro de Andrade, tomou o rumo de Minas. Bernardino de Campos, chefe republicano e presidente do Estado, avisou Dona Veridiana que seu filho predileto e mais brilhante, se caísse nas mãos do governo federal, poderia acabar sem vida. Na obra "Viagem à Bahia", Cid de Castro Prado observa que "Eduardo Prado, monarquista intransigente, era um dos maiores espíritos do Brasil daquele tempo. Cumpria salvar-lhe a vida, e Bernardino de Campos prolongou-lhe a existência com a nobreza de um adversário que avisa, e de um concidadão que procura conservar, além das conveniências do momento, aquilo que pertence à pátria toda e para sempre: uma inteligência privilegiada". Eduardo também foi salvo na sua rota de fuga, pela família do senador Tanajura. O delegado de polícia local quis denunciar o exilado ao governo. Mas a dona da casa impediu que ele o fizesse. Em hipótese alguma quebraria os preceitos da hospitalidade e do asilo. A monarquia tinha caído, mas a nobreza continuava. Eduardo Prado conseguiu chegar a um navio inglês, ancorado em Salvador. O governo despótico apreendera todos os exemplares de seu livro "A ilusão americana". Mas tanto os "Fastos", como "A Ilusão" "ficarão eternamente como um brado da civilização contra a barbárie. Como o eco sonoro de uma voz brasileira contra a intromissão de costumes antijurídicos da autocracia triunfante e contra a desnacionalização do Brasil". Faria bem aos incautos a leitura de tudo isso. A sedução do poder absoluto parece tranquilizar os que têm medo de vivenciar a experiência complexa de uma verdadeira democracia. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão Em 23 02 2023 voltar |
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