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Acadêmico: José Renato Nalini A Amazônia não é o espaço adequado para a pecuária. É um erro de perspectiva pelo qual os gananciosos pagarão caro.
Despedir-se do churrasco Ninguém consegue segurar o avanço da ciência, logo acompanhado por sua serva, a tecnologia. Quando li, em "Arrabalde", de João Moreira Salles, que a pecuária declinaria em poucos anos, pensei que isso poderia ser a resposta à volúpia do desmatamento em todos os biomas, notadamente na Amazônia. O Brasil tem mais gado do que gente. Só que a pecuária tupiniquim é arcaica. Na Amazônia, não é competitiva porque se destrói a cobertura vegetal e ali se coloca o boi. Como diz o jovem ativista, "ao contrário da imagem que o agronegócio projeta de si, a pecuária brasileira é medíocre. A Costa Rica produz 25 vezes mais proteína animal por hectare do que a Amazônia. O Brasil é menos produtivo do que a Argentina e o Uruguai, seus concorrentes diretos. Com os Estados Unidos, a comparação é constrangedora. Embora o atual rebanho norte-americano seja menor do que o da década de 1950, o país produz muito mais carne hoje do que naquela época". A Amazônia não é o espaço adequado para a pecuária. É um erro de perspectiva pelo qual os gananciosos pagarão caro. Pode ainda demorar um pouco, mas a conta chegará. Continua Salles: "quarenta anos atrás, só 10 do rebanho brasileiro estava na Amazônia Legal; hoje, chega a 43. Essa migração acelerada - em nenhuma outra parte do Brasil o rebanho cresceu tanto - se dá por várias razões: preço baixo das terras, subsídios, leniências públicas, substituição da atividade em regiões mais desenvolvidas do país. Em estados como São Paulo, por exemplo, a pecuária perdeu espaço para a cana-de-açúcar e a laranja, lavouras que se beneficiaram de investimentos em tecnologia agrícola. Requerem mais capital e competência do que a pecuária mediana praticada no país, mas, em contrapartida, são mais rentáveis". Um problema que todos conhecem é o de que a criminosa apropriação de terras públicas - o patrimônio do povo é que está sendo espoliado - começa com o desmatamento por parte dos grileiros, que logo colocam ali algumas cabeças de gado, para legitimar uma posse. Beneficiados com a anistia de governo que entrega o que é da cidadania para um grupo heterogêneo, onde não faltam delinquentes. É a situação em que se encontra a maior parte da Amazônia Legal. Só que os americanos, sempre na frente em relação à pesquisa e ao exercício de uma futurologia baseada em estudos realizados por jovens preparados nas melhores Universidades que ali se encontram, já detectou que a carne - qual a consumimos hoje - será substituída muito brevemente pela carne produzida em laboratório. Uma reportagem de Filipe Pacheco na FSP de 29.11.22 anuncia que o Brasil deve começar a produzir e comercializar carne cultivada em laboratório já em 2024. Informação de Raquel Casseli, diretora de engajamento corporativo do The Good Food Institute, uma organização que financia projetos e pesquisas no segmento. Hoje, existem já 57 universidades e centros de pesquisa que desenvolvem projetos sobre proteínas alternativas, tanto para plant-based (produzidas a partir de vegetais) quanto de carne cultivada. Em 17 de novembro último, o FDA, a agência americana reguladora de medicamentos, aprovou a comercialização de carne de laboratório. Por enquanto, a licença vale só para a carne de frango da food tech californiana Upside Foods. Na União Europeia, o curso dessa transformação também está bem adiantado. A carne cultivada é um método de produção de alimentos de origem animal a partir da extração de células-tronco. Elas são processadas em biorreatores que proporcionam condições para proliferação e segurança biológica contra contaminações, até o produto final, que é extraído por meio de impressão 3D. atualmente, a maior parte dos projetos atingiu o estágio de massa proteica, uma espécie de carne moída, que é utilizada para produzir hamburgers, empanados e alimentos como croquetes. Mas está adiantado o projeto para reproduzir carne em cortes específicos: filés, bifes, tudo aquilo que se pode pedir num excelente restaurante. A boa notícia é que o dinheiro, aquilo que move tudo, até a cabeça-dura e empedernida de pecuaristas old-fashion, vai provar que é melhor ter a floresta em pé do que criar gado que não engorda e que passará a ser um desastroso prejuízo, assim que fenômenos extremos se intensificarem na região devastada pela ganância primitivista dos que ainda estão na geração cow boy, quando o mundo está a necessitar de água pura, oxigênio e os demais serviços gratuitos prestados pela cobertura verde. Quando perceberem que árvore viva e incólume à motosserra e aos "correntões" rende mais do que gado, a bússola que atrai cifrão se voltará para aquilo que os cientistas e ecologistas anunciavam há décadas. A esperança é que haja tempo adequado para essa conversão. Há quem acredite que o ponto de inflexão no extermínio da floresta já tenha sido ultrapassado. Já não há tempo para evitar a catástrofe. Por enquanto, é bom imaginar como serão os futuros churrascos. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão Em 01 02 2023 voltar |
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