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EDUCAR PARA A VERDADE
Acadêmico: José Renato Nalini
Assumir o século 21 e suas tecnologias produziria aquilo que certos governos temem: uma cidadania proativa, assertiva, crítica e exigente.

Educar para a verdade

Embora a verdade seja uma indagação irrespondível, é fácil perceber que ela é pouco prestigiada no mundo em que vivemos. A falsidade e a mentira dominam as informações. Quando não, a tendência ao não verdadeiro nos faz desconfiar de tudo e de todos.

Como debelar esse mal, que contamina todas as nossas relações? O Brasil da credulidade chegou ao ápice da ignorância ao acreditar em todas as imbecilidades disseminadas pelas redes sociais. Cidadãos eruditos, com pós-graduação, chegaram a afirmar que as vacinas teriam chips para controle dos brasileiros. Como se uma República de bilhões de almas tivesse interesse em dominar este país latino-americano.

Quem melhor cuidou desse fenômeno foi a Finlândia. Ela já é exemplo na educação. Tem os melhores índices da avaliação PISA, realizada trienalmente pela OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Desde 2016, incluiu no currículo escolar a alfabetização midiática. Algo que o Brasil deveria copiar com urgência.

O fruto dessa iniciativa foi tornar a Finlândia o país mais resistente entre as nações europeias. A confiança no governo atinge 71. A média dos demais países, excluído o Brasil, foi de 41.

Como se faz isso? Por exemplo, em matemática, ensina-se como as estatísticas podem ser destorcidas. Em história, mostram-se casos em que a propaganda influenciou a população de maneira a fazê-la optar pelo erro. O caso emblemático é o Brexit na Inglaterra. Para deixar a União Europeia, divulgou-se que o imigrante iria tomar os empregos dos ingleses. Isso em cidades que não tinham um só estrangeiro entre os moradores.

Requisita-se dos alunos pesquisar alguns temas e encontrar fontes sólidas ou oscilantes. Cada estudante passa a exercer o papel de verdadeiro "detetive digital". Muitos exercícios propiciam análise de alegações em notícias e vídeos e em postagens das redes sociais. Estimula-se a comparação com várias outras mídias e a investigação de como a desinformação afeta a emoção do leitor. Também se exercita a redação de notícias falsas, discutidas em classe.

Coteja-se uma série de versões do mesmo fato, para que o alunado chegue a apontar qual o nível de verdade inserto em cada qual. O objetivo não é fazer com que o educando acredite em tudo o que o governo diz e desacredite em tudo o que é dito por outra fonte. O que se quer é que os alunos tenham condições de responder às questões que seguem: "Quem produziu a notícia? E por quê? Há provas do que é afirmado ou se trata apenas de uma opinião? Pretende-se que o estudante raciocine antes de transmitir uma notícia.

Para a defesa da democracia, é mister que toda a sociedade se articule e adote uma postura crítica. Para isso, a Finlândia também conta com a Mediametka, uma organização de alfabetização midiática e que funciona desde 1950. Foi criada para alertar sobre os riscos que os quadrinhos podiam causar em leitores infantis. Hoje tem projetos na área de inclusão, processo criativo e diversidade cultural, para que crianças e jovens conheçam os processos midiáticos e saibam como eles funcionam em sua complexidade e alcance.

Depois de experimentar o nefasto fenômeno da disseminação de falsidades nas redes sociais, o Brasil precisa atuar em várias frentes. O lado bom da internet é que as novas gerações já nascem com chips e sabem pesquisar sobre qualquer assunto, inteirando-se de informes confiáveis quando provindos de Universidades, Bibliotecas, Institutos respeitáveis ou intelectuais responsáveis.

A disciplina da internet deve partir da própria sociedade, desde que ela seja educada adequadamente, de forma a filtrar informações equivocadas, falsas ou semi-verdadeiras, pois todas elas provocam o mal. A escola tupiniquim parou no ensino/aprendizado com foco na memorização de dados, sem atentar para o fato de que hoje, mediante mero clique, o educando curioso pode ter acesso a informações mais atualizadas, coloridas, sonoras e sedutoras. Tudo isso, em cotejo com as aulas prelecionais que a criança em tenra idade ainda suporta, mas que a juventude hostiliza, tanto que a evasão é algo que ocorre principalmente no Ensino Médio e na Universidade.

Assumir o século 21 e suas tecnologias não faria mal para a educação brasileira. Ao contrário, produziria aquilo que certos governos temem: uma cidadania proativa, assertiva, crítica e exigente. Para isso existe o regime democrático, opção do povo, mediante atuação de seu representante, o constituinte de 1988.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 16 01 2023



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