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MAIS AMAZÔNIA PARA O BRASIL
Acadêmico: José Renato Nalini
Como diz João Moreira Salles: as pessoas precisam fazer música sobre a Amazônia, pintar a Amazônia, fazer poema, peças de teatro, livros.

Mais Amazônia para o Brasil

Estou lendo "Arrabalde", de João Moreira Salles e concordo com ele. Os brasileiros não se impregnaram de Amazônia. Não a conhecem, por isso não a defendem. Contudo, o que era resto se tornou centro. "Pra o concerto geral das nações, o Brasil é um país quase irrelevante, salvo pela Amazônia hoje em dia".

Para escrever o livro, João seis meses no Pará. "Ao cabo dos seis primeiros meses do governo, ficou claro que a Amazônia estava abandonada, entregue ao crime. O Estado simplesmente abdicou da sua responsabilidade em relação à Amazônia".

O brasileiro deveria conhecer mais a Amazônia, encantar-se com ela. Há muito o que descobrir: a exuberante biodiversidade, uma flora que poderá impactar a indústria farmacêutica, a de cosméticos, a de perfumes, a de alimentação. Fazer um turismo ecológico, pois restam poucos lugares no planeta ainda intocados.

Em vez disso, o que se viu na Amazônia nos últimos anos? Entregue à criminalidade organizada, que extermina a floresta, invade demarcações indígenas para explorar minérios, a ordem imposta pelo banditismo internacional, a transformação da rica vegetação em pasto, para depois se converter em deserto.

Por incrível que pareça, os próprios moradores da região da Amazônia legal não têm conexão com a floresta. "A Amazônia é essencialmente urbana. As pessoas estão nas cidades, que têm muito pouca conexão com a floresta. Os empregos precisam ser gerados nas cidades, e não se pensa nas cidades amazônicas como uma solução para a floresta. A gente conhece as mazelas das cidades brasileiras e na Amazônia é ainda pior".

O retorno de Marina da Silva ao Ministério do Meio Ambiente, que ela bem conhece e que foi desativado no último governo, é uma esperança de que o Brasil possa vir a conhecer adequadamente o seu maior patrimônio. Considerado, no estrangeiro, como a salvação climática para todo o planeta. Sem prejuízo, é preciso motivar todos os brasileiros a se interessarem pela região responsável pelo regime de chuvas no país inteiro, e que, se vier a ser comprometido - como já ocorreu no ano passado - vai acabar com a alegria da "salvação da lavoura" chamada agronegócio.

Para ajudar Marina a recompor o Ministério, é preciso fortalecer a sociedade civil brasileira e também não fechar as portas ao aporte de capital internacional, para que se reverta a vexaminosa condição brasileira de "Pária Ambiental", título obtido no último quatriênio.

Espera-se que o Ministério Indígena ponha cobro na violência que produz matança, na continuidade de um genocídio que teve início no século XVI e que ainda não terminou. Invasão de terras, assassinato de defensores, a desvalorização do significado dessas etnias, tudo vem acontecendo com a leniência do Estado. E com o beneplácito dos que consideram o indígena um semovente e não um ser humano merecedor de tratamento digno, em nada diferente daquele destinado ao branco.

João Moreira Salles, na entrevista concedida ao jornalista Vinicius Sassine, observou - não sem certa perspicácia - um paradoxo instigante: "O garimpo ilegal e a ocupação das terras públicas brasileiras configuram uma coisa curiosa, se levarmos em conta que esse governo é muito ligado ao pensamento militar. Os militares sempre tiveram a obsessão da soberania. A grande ironia é que nesses quatro anos o Estado brasileiro perdeu a soberania da Amazônia. É na Amazônia que facções disputam poder. As armas e ferramentas do garimpo não são mais dragas. É isso, mais fuzil AR-15. Você não entra mais".

Por isso é bom que todos leiam "Arrabalde". Mais do que isso, assistam documentários. Façam concursos a respeito da Amazônia. Estimulem a participação de todos os estudantes e de toda a cidadania, para que reconheça o valor imenso da Amazônia para mitigar os efeitos do aquecimento global e para garantir ao Brasil uma economia mais próspera. Indaguem à sociedade o que fazer para salvá-la, integrando-a ao Brasil, que a negligencia tanto, que a entregou à criminalidade sofisticada, aquela que domina vários mercados, inclusive o do ouro.

Como diz João Moreira Salles, "as pessoas precisam fazer música sobre a Amazônia, pintar a Amazônia, fazer poema, peças de teatro, livros. Claro que muito disso já existe. Mas a floresta não impregnou a nossa imaginação, não faz parte do nosso patrimônio simbólico. E falo de nós brasileiros que não moramos lá".

Como está na capa do livro "Arrabalde", "A Amazônia produz 20 da água doce do planeta e abriga por volta de 16 mil espécies de árvores. Maior floresta tropical do mundo, ainda encerra mistérios que instigam pesquisadores e leigos". Está na hora do brasileiro comum acordar. E prestigiar o que o Brasil ainda tem de bom, apesar da crueldade com que o verde tem sido tratado nos últimos anos.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 15 01 2023



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