Compartilhe
Tamanho da fonte


VAMOS DAR TETO A QUEM NÃO TEM
Acadêmico: José Renato Nalini
A Prefeitura de São Paulo abriu edital de licitação para a oferta de moradia a quem não tem.

Vamos dar teto a quem não tem

A moradia é direito social inserto na Constituição Cidadã. Assim como outros direitos que a sociedade esqueceu, há milhões de sem teto em todos os lugares. O acréscimo do número dos moradores de rua deveria ser um sinal para que os cidadãos de bem - ainda os há, felizmente! - se motivassem a eliminar essa mácula reputacional da República Federativa do Brasil, na fórmula um Estado de direito de índole democrática.

Infelizmente, a política profissional procura mais a multiplicação de partidos, para assegurar a mamata dos Fundões e para dar ao mundo o vexame do "orçamento secreto". Uma exceção é a Prefeitura de São Paulo, que abriu edital de licitação para a oferta de moradia a quem não tem.

Até o dia 26 de janeiro aceitam-se as propostas para quem quiser participar desse procedimento administrativo que se pretendeu tornar menos complexo, mas que ainda é burocrático e excessivamente formalista: a licitação.

O importante é que a construção civil é um setor antenado e resiliente. Conseguiu sobreviver, a despeito da irônica hostilidade que o Estado brasileiro - em todas as suas esferas - ostenta em relação à iniciativa privada. Sem a qual, o Brasil estaria em situação muito pior.

A construção civil garante empregos, garante a movimentação do mercado, garante a edificação e é imprescindível para que os nossos irmãos que moram em favelas, em comunidades, em cortiços e na rua, possam ter concretizado o sonho aparentemente impossível da casa própria.

O SECOVI, poderoso Sindicato que congrega toda a cadeia e é um esteio da economia paulista e brasileira, contribuiu para aprimorar os editais e precisaria divulgar entre seus associados essa excelente oportunidade para mudar o cenário da capital. São Paulo é o exemplo para todo o Brasil. Dando certo aqui, por que não replicar a iniciativa em outras cidades? Ou há alguma cidade brasileira que tenha resolvido, de forma concreta, absoluta e definitiva, o drama da casa própria?

Outra boa notícia é que a famigerada Cracolândia, vergonha mundial, vai ser objeto de enfrentamento. É surreal que áreas nobres da maior cidade da América Latina se vejam comprometidas, assustando seus moradores e afugentando visitantes, porque existe uma legião de infelizes, alvo de traficantes, que mergulharam na droga e que já não podem usufruir do direito a ter direitos, o nome com que Hannah Arendt chamou a cidadania. É preciso devolver a esses seres humanos o seu status civitatis. Devolver a dignidade. Pois não é digno estar refém da droga e de quem tira proveito mergulhando na miséria e na infelicidade semelhantes que não souberam se livrar a tempo das substâncias entorpecentes e que perderam completamente a condição de se enxergarem como seres racionais, merecedores de um destino melhor.

Outra chaga paulistana - e que se espalha por outros municípios - é a dos moradores de rua. Logradouro público não é espaço de dignidade para a residência de ninguém. Ouso dizer que não existe o "direito a morar na rua". Rua é lugar de locomoção. Direito de uso comum de todos. Não pode ser restrito a uma ocupação exclusiva.

Basta pensar que se alguém invade uma propriedade, bem de uso privado do titular do direito real, pode ser expulso pelo próprio dono, pois o direito não quer cidadãos covardes. Se preferir, há o sistema Justiça pronto a reintegrar na posse o legítimo proprietário. Ora, como permitir que alguém se aproprie daquilo que é de todos, de uso comum do povo, reconhecendo a ele um direito inexistente e verdadeiramente surreal?

Espera-se que a municipalidade paulistana continue na senda corajosa de enfrentamento de problemas aparentemente insolúveis. Só aparentemente, porque não encontraram gestores corajosos e destemidos para fazer o que é preciso. É a velha fábula do "rei está nu". É preciso olhos de criança, de pessoas sensíveis, para enxergar tais tragédias e enfrentá-las mediante adequado uso dos recursos jurídicos disponíveis.

Também se aguarda que o sistema Justiça não impeça, como tem feito com frequência, que exercentes de cargos para os quais foram democraticamente eleitos pela população se vejam impedidos de fazer aquilo que é interesse comum. A paralisação de políticas estatais por liminares que depois se eternizam no ritmo de lentidão próprio à Justiça convencional, desserve a todos. São Paulo precisa de ousadia e destemor. Sempre foi essa a sua sina. Afinal, nosso lema é conduzo, não sou conduzido. Vamos em frente. O paulistano merece essa chance.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 12 01 2022



voltar




 
Largo do Arouche, 312 / 324 • CEP: 01219-000 • São Paulo • SP • Brasil • Telefone: 11 3331-7222 / 3331-7401 / 3331-1562.
Imagem de um cadeado  Política de privacidade.