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O VENENO CORREU SOLTO
Acadêmico: José Renato Nalini
O Brasil precisa respirar novos tempos. Mais saudáveis, mais amenos, mais esperançosos. Não mais deixar que o veneno corra solto, como ocorreu em 2021.

O veneno correu solto

As termelétricas fósseis teriam de ser condenadas à extinção, houvesse o mínimo de sensatez por parte de todos os governantes. Não é o que acontece. Neste Brasil, que foi o campeão do desmatamento entre 2019 e 2022, as emissões de gases venenosos causadores do efeito-estufa por termelétricas fósseis aumentaram 75 apenas em 2021, comparadas com 2020.

Isso porque vinte por cento da matriz energética brasileira derivou de termeletricidade fóssil, proveniente da queima de gás e carvão. Os dados foram anunciados pelo IEMA - Instituto de Energia e Meio Ambiente. Houve lamentável intensificação dessa fonte de energia que no ano 2000 chegava a nove por cento. Mais que dobrou em 2021.

Isso derivou da crise hídrica, proveniente do desmatamento em todos os biomas, porém principalmente na Amazônia. É lamentável que o país campeão em potencialidades solares e eólicas veja aumentar a participação das fontes de fósseis na matriz energética, principalmente a partir de 2010. Comprovado que a geração energética fóssil passou de 30,6 terawatts-hora em 2000, por 133,8 terawatts-hora em 2021. O aumento não deriva de novas usinas, mas da intensificação no funcionamento das já existentes, assim como da utilização de fontes de energia mais poluentes como o carvão. Com isso, as oitenta e duas usinas termelétricas conectadas ao Sistema Interligado Nacional emitiram 55,6 milhões de toneladas de gás carbônico. Dessas, apenas treze usinas foram responsáveis por mais da metade dos gases emitidos por todo o polo energético avaliado.

As dez usinas mais emissoras de gases-estufa são Candiota III e Pampa Sul, ambas no Rio Grande do Sul. Em seguida, Jorge Lacerda I, II, III e IV, todas em Santa Catarina. Porto do Pecém I e II, no Ceará, Porto do Itaqui no Maranhão, Arembepe e Global II na Bahia.

Os municípios campeões na emissão foram Macaé, no Rio de Janeiro, São Gonçalo do Amarante no Ceará, Candiota no Rio Grande do Sul, Capivari de Baixo em Santa Catarina, Santo Antônio dos Lopes, no Maranhã, Manaus, no Amazonas, Duque de Caxias e Seropédica, no Rio de Janeiro, São Luís no Maranhão e Barra dos Coqueiros no Sergipe.

Quatro empresas são as responsáveis por 61 dos gases-estufa emitidos em 2021: Petrobrás, com 26,1, Eneva, com 13,9, Eletrobrás com 11,8 e Fram Capital Energy com 8,8 das emissões.

A apuração é parcial, porque não estão computadas as termelétricas desvinculadas do Sistema Interligado Nacional. Assim, as termelétricas a biomassa, que funcionam a partir da combustão do bagaço de cana, deixaram de ser contabilizadas. Nem se cuidou de apurar a emissão de termelétricas autoprodutoras, aquelas conectadas a indústrias e geradoras de eletricidade para o funcionamento dessas empresas.

Com toda essa emissão, as termelétricas só respondem por 18 das emissões brasileiras, segundo o SEEG - Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa. As fontes mais significativas na emissão brasileira são o desmatamento e o agronegócio. Por isso é grande a expectativa de que o "desmatamento zero" seja concretizado o quanto antes e que o reflorestamento - do qual não se falou no governo brasileiro até o final de 2022 - seja uma política estatal de execução constante e obrigatória.

Existe ameaça no horizonte: a Lei 14.182, sancionada pelo governo antiecológico, a obrigar a contratação de novas termelétricas. O impacto disso é pavoroso. Prevê-se aumento de emissões à razão de vinte milhões de toneladas de gás carbônico. Ou seja: mais de trinta por cento nas emissões atuais do Sistema Interligado Nacional. Impor-se-ia a revogação dessa lei, pois o Brasil firmou acordo comprometendo-se a reduzir suas emissões dos gases venenosos.

A ciência já possui mecanismos de aproveitamento da energia solar, da energia eólica, da energia do hidrogênio verde, da energia das marés e daquela gerada pela combustão de resíduos sólidos que hoje se destinam a "lixões", poluindo o solo e a atmosfera, ou são lançados ao mar, ameaçando a pureza e balneabilidade das águas, além de acelerar a extinção de espécies ameaçadas.

Todo o empenho do Brasil será procurar matrizes energéticas verdes, rumo à sustentabilidade, com apoio a pesquisadores e a cientistas, espécie não só abandonada entre 2019 e 2022, mas também menosprezada e folclorizada. O Brasil precisa respirar novos tempos. Mais saudáveis, mais amenos, mais esperançosos. Não mais deixar que o veneno corra solto, como ocorreu em 2021.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 09 01 2023



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