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ALGUÉM PRESTOU ATENÇÃO?
Acadêmico: José Renato Nalini
É hora de se pensar seriamente no que significou este período tenebroso, de "soltar a boiada", de folclorizar os ecologistas.

Alguém prestou atenção?

Ainda bem que 2022 passou. Espero não contrariar Tiririca: "Pior que está não fica!". É que o ano passado foi o pior para o combalido ambiente brasileiro. O DETER, programa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais encarregado de fiscalizar o meio ambiente constatou que de janeiro a novembro de 2022, foram destruídos mais de dez mil quilômetros quadrados de floresta! 2022 foi o ano apocalíptico para a cobertura vegetal, um crime contra a natureza e contra a economia. Pois é menor a possibilidade de vender créditos de carbono para os países desenvolvidos, que acordaram tarde para a importância da ecologia.

A mensuração do extermínio começou em 2016 e 2022 foi o pior ano dessa contagem. Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, que dispõe de inúmeras organizações da sociedade civil, afirmou que o governo passado deixou uma "herança nefasta para o Brasil e deve ser responsabilizado legalmente por toda a destruição que causou".

Enquanto isso, a civilização restringe a importação de produtos gerados no desmatamento. Algo que vai atingir plenamente o agronegócio e não ajudará a melhorar a imagem brasileira, seriamente comprometida neste setor.

A não ser... E aí a grande indagação: será que os novos gestores da coisa pública poderão entender a gravidade da situação? Não é suficiente o "desmatamento zero", que deveria ter começado ontem. É urgentíssimo reflorestar. Haverá coragem para isso? Haverá condições? Há mudas suficientes? Há viveiros? Há obreiros? Sabe-se por onde começar, diante da profunda irregularidade fundiária, a impedir o conhecimento de quais as terras públicas, quais as pertencentes a particulares?

A partir da definição das eleições, esperava-se que Marina Silva fosse nomeada Ministra do Meio Ambiente, para poder articular essa verdadeira batalha que será a recuperação dos males infligidos à natureza. Isso não aconteceu.

Acena-se com a edição de mais uma lei para a Amazônia, assim como existe a lei da Mata Atlântica. Não confio no excessivo apego ao fetiche da lei. Temos lei para tudo no Brasil. Temos o artigo 225 da Constituição, que seria bastante para refrear todos os ímpetos criminosos que acabam com o amanhã para a humanidade. No entanto, a desenvoltura com que a ilicitude, com a conivência do governo, atua no setor mais sério de nosso tempo, desalenta quem aprendeu a confiar no sistema Justiça.

O que existe em termos de normatividade é mais do que suficiente para reprimir esses inacreditáveis e maléficos abusos e para iniciar uma recuperação que levará décadas - se iniciada agora - para chegar a um ponto de razoável equilíbrio.

Se houver vontade política, tão profícua quando se trata de pedir e distribuir cargos públicos, haverá um chamado à sociedade civil, ao empresariado, à Universidade, às organizações do Terceiro Setor. A comunidade internacional já evidenciou seu empenho em mitigar os efeitos do aquecimento global. A medida mais eficiente, mais prática, mais viável e descomplicada é o reflorestamento. A agenda ESG é oportuna e pode ser levada a sério em todos os níveis. Não são apenas as megaempresas, mas até pessoas físicas podem adotar uma postura de se preocupar, simultaneamente, de questões ecológicas, sociais e de governança eficiente. Por isso, e valendo-se dos insistentes recados da Mãe Natureza, tudo converge para um trato consequente, se as proclamações altruísticas não se resumirem à tática do discurso.

Sabe-se que a bioeconomia florestal ainda não foi descoberta no Brasil. No restante do planeta, movimenta cerca de duzentos bilhões de dólares por ano. E a Amazônia, embora detenha trinta por cento da última grande cobertura vegetal dos trópicos, só participa com zero virgula dois por cento desse montante.

É hora de se pensar seriamente no que significou este período tenebroso, de "soltar a boiada", de folclorizar os ecologistas, de desmontar as estruturas de apoio gradual e lentamente construídas desde a década de setenta, quando o brasileiro Paulo Nogueira Neto contribuiu para a elaboração do conceito de sustentabilidade. Repetia, qual mantra: "Sabendo usar, não vai faltar". Só que não soubemos usar. Já está faltando. A carga que se lança nos ombros da atual administração federal é pesadíssima. Porém todos sabiam disso. Agora é parar de reclamar e agir. O futuro e suas crianças agradecem.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 04 01 2023



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