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Acadêmico: José Renato Nalini Quanto mais informação as pessoas têm sobre o próprio contexto, maior é a capacidade de intervirem sobre sua realidade e contribuírem na produção e uso de evidências.
As evidências são ignoradas Uma conurbação como São Paulo seria inimaginável há um século. Mas ela se formou e existe. E precisa de uma administração competente. Já se afirmou que a capital é inadministrável. Contudo, aqui residem milhões de almas e elas contam com o mínimo para viver e desenvolver suas atividades. Só que o conceito de administração pública parece estacionado e isso representa retrocesso. Continua-se a acreditar em normatização disciplinadora, quando a indisciplina é a regra costumeira. Ninguém consegue segurar o dinamismo paulistano. Quem já teve oportunidade de sobrevoar a megalópole num fim de semana, constatará o espetáculo análogo ao de um formigueiro: gente ajudando gente a construir, a fazer o acréscimo das lajes, a ocupar todos os vazios. Isso se faz a despeito ou, geralmente, ao contrário do que preveem os Planos Diretores. Pois estes são feitos em gabinetes de arquitetos que são geniais, produzem obras estéticas admiráveis, mas têm pouco contato com gente real. Aquele paulistano que precisa se locomover durante horas, utilizando-se de vários meios de transporte, até alcançar o seu espaço de trabalho. As evidências estão aí: mostram que há um vazio ocioso exatamente no centro expandido, a área que mais foi contemplada com infraestrutura e é servida de abundantes meios de transporte coletivo. Uma primeira evidência: esse torrão privilegiado perde moradores. Enquanto isso, crescem as franjas periféricas, ocupadas por aqueles que não encontram moradia de preço compatível com suas possibilidades. Outra delas: as cidades inteligentes adensaram significativamente o seu centro. Converteram-no em ambiente acolhedor para fins residenciais, comerciais, de serviço, para artes e para o convívio saudável. Aqui, impede-se o aproveitamento útil de áreas que continuam ocas. Mais ainda: fazer com que o trabalhador habite uma órbita razoável de distância do lugar de trabalho favorece uma série de fatores. A saúde do profissional, a solidificação de suas relações familiares e de amizade, o rendimento no trabalho, além da ponderável e cada vez mais séria redução na emissão de gases causadores do efeito estufa. Uma evidência que tem sido decantada e pouco enfrentada: a excessiva judicialização da política urbanística. O impedimento contumaz a que se discutam atualizações nos planos defasados, a vedação à edificação em zona de influência de enclaves blindados para os muito ricos, a invocação a um pretenso interesse público, em lugar de se enfrentar a verdade: o poder que alguns têm de neutralizar providências de interesse de todos. Não se comenta a evidência que disso resulta: os prejuízos causados à cidade, seja em termos ambientais, urbanísticos e econômicos. Quando se deixa de construir por sistemática obtenção de liminares judiciais, quem perde? Os empreendedores, os adquirentes das unidades que deixarão de ser edificadas, mas também a municipalidade. Um terreno representa ínfima parcela do IPTU que seria lançado sobre as futuras residências. Quem responderá por esses prejuízos? Será que os envolvidos nessa trama judiciária têm noção do que a cidade colhe em atraso, subdesenvolvimento, crescimento da miséria e da exclusão, quando a miopia deixa de detectar as evidências ignoradas pelos interessados? A civilização age diversamente. A pesquisadora Beatriz Caetana, que atua no consórcio europeu Urbinat, cujo propósito é encontrar soluções para as cidades baseadas na natureza, sustenta o caráter intersetorial de políticas públicas, independentemente da área. "A ideia de políticas baseadas em evidências está muito ancorada em uma necessidade de envolver diferentes segmentos da sociedade na coleta, produção e disseminação da informação". São as pessoas que melhor conhecem suas necessidades e podem apresentar alternativas viáveis e criativas, nem sempre detectadas pelos eruditos em suas pranchetas. Na Democracia, é a maioria que deve decidir os destinos da cidade. "Quanto mais informação as pessoas têm sobre o próprio contexto, maior é a capacidade de intervirem sobre sua realidade e contribuírem na produção e uso de evidências". Evidências que têm sido sistematicamente desprezadas pelos que se consideram os verdadeiros "donos da cidade". Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião Em 09 12 2022 voltar |
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