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Acadêmico: José Renato Nalini Existe longa distância entre o estágio civilizatório atingido na Terra de Tio Sam
Nossa diferença com os States As pessoas formam filas para experimentar petiscos de estabelecimentos que chegam cobertos de fama. Também para adquirir ingressos para grandes espetáculos. Não hesitam permanecer até dias à espera da abertura das bilheterias. Uma pena que tal entusiasmo inexista para mostrar indignação diante da destruição da Amazônia e dos demais biomas brasileiros. Este setembro mostra ruas cobertas de sementes de pau-ferro, de ipê, de bauínia. Perdem-se nas ruas. Não há uma recolha para formar viveiros e replantar aquele trilhão de árvores que falta na face do planeta. Mais de um bilhão delas só no Brasil. Enquanto isso, sem que haja o extermínio programado que ocorre no Brasil, os americanos verificam que suas castanheiras sofrem as consequências do aquecimento global. Elas cobriam a paisagem dos Apalaches, eram bilhões que se desenvolviam em frondosas florestas que iam do Maine ao Mississipi. Mas um fungo exótico chegou a ameaçar a espécie de extinção. Hoje, as castanheiras americanas estão funcionalmente extintas. O que os americanos fazem? Cuidam, árvore por árvore, com pólen geneticamente modificado. Ele conterá DNA destinado a combater a praga. Foi a fórmula que os ianques encontraram, prestigiando a ciência e a tecnologia, para devolver à natureza uma árvore que as pragas atingiram. Tudo indica – e os americanos são perigos em estudar as grandes tendências do porvir – que pragas e pestes arbóreas se propagarão, em virtude das mudanças climáticas. Freixos morrem atacados por brocas verdes. Os pinheiros do oeste não resistem a surtos de besouros. A cada seis árvores nativas dos quarenta e oito Estados americanos, uma ao menos está correndo o risco de extinção. Os cientistas acreditam que esse tratamento, que requer minuciosos cuidados, tempo e paciência, poderá ajudar a combater as mudanças climáticas. As castanheiras americanas vivem bastante e crescem rapidamente. Parecem uma esponja que suga os gases causadores do efeito estufa. Por isso ela é também conhecida como “árvore perfeita na natureza”. Durante milênios ela garantiu sustento a esquilos, ursos e pessoas. Mas elas passaram a ser vitimadas por fungos que abrem cancros em seus troncos. Isso inibe a circulação de nutrientes, as folhas cabem e a árvore morre. O berço da moderna democracia leva a sério a política ambiental, embora também registre surtos de ignorância, que rima com ganância. Existe uma Fundação da Castanheira Americana, organização sem fins lucrativos cujo objetivo é resgatar a árvore. E a biotecnologia é uma aliada nessa missão. O que acontece com a castanheira, pode orientar pesquisas que salvem outras árvores. É a ciência, essa categoria tão desprestigiada no Brasil, que está servindo aos Estados Unidos, para garantir o replantio de milhares de castanheiras geneticamente modificadas. Elas vão exercer papel relevante na atenuação dos efeitos das mudanças climáticas. Um subproduto nada desprezível diante da situação do planeta nesta década. É uma diferença sensível entre a percepção de um problema ecológico lá e aqui. Nos Estados Unidos, uma só espécie – a castanheira – leva equipes de cientistas a desenvolverem esforços e estudos com o fito de salvá-la. Aqui, são milhares de espécies sendo sumariamente dizimadas, seja com a motosserra, seja com os “correntões” amarrados a dois tratores que “matam por atacado” aquilo que a natureza levou milênios para nos entregar. Os dados científicos das entidades não vinculadas ao governo que se dispuseram a apurar o que ocorre principalmente na Amazônia dão notícia de que a cada segundo, quase vinte árvores são derrubadas. Quem acredita que a Amazônia está intacta, exatamente igual ao ano de 1500, quando os portugueses tomaram posse deste continente? Somos imitadores da cultura americana. Seus filmes, seus produtos, o sonho da “Disneylândia”, suas músicas, seus tênis, seus hamburgers e hot-dogs impregnaram a vida brasileira. Por que não copiá-la também quando seu governo e seu povo oferecem a seus cientistas condições ideais para salvar a castanheira? Ou, porque não se valer desse know-how para tentar salvar o que resta nos biomas tão sacrificados por uma insanidade que não pode ser senão manifestação de uma perigosa falha de caráter? Existe longa distância entre o estágio civilizatório atingido na Terra de Tio Sam – sem ignorar suas máculas – e o retrocesso que o Brasil ostenta em pleno emblemático ano de 2022. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 05 10 2022 voltar |
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