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ANIVERSÁRIO DO GONZAGUINHA
Acadêmico: Gabriel Chalita
No aniversário do Gonzaguinha, quero aniversariar a decisão inegociável de não jogar fora a esperança, de não cultivar nenhum preconceito, de desalojar a mentira e as arrogâncias, de celebrar um tempo de bondade que está sempre pronto para nascer.

Eu sei que ele morreu e morreu jovem. Sou um homem que sabe das coisas, só não sei como as coisas chegaram onde chegaram.

Gonzaguinha, que nasceu no dia em que nasce a primavera, escreveu o amor e a liberdade como convicção de vencer as ditaduras e de resistir: "Nunca se entregue, nasça sempre com as manhãs" .

A primavera desmente as mortes dos invernos. A da estação e a da alma. "Toda pessoa é sempre as marcas de outras tantas pessoas".

Pessoas do meu tempo andam marcando com dor outras pessoas. Eu, que sou vendedor de pastel em uma das tantas feiras da grande cidade, vi uma mulher, candidata a um cargo importante, gravando um vídeo com um falso sorriso de alegria e jogando no lixo o pastel que não comeu. E vi uma outra mulher, remexendo o lixo para espantar a fome.

Ouvi no rádio, da minha barraca, a história de um presidente que, mais uma vez, desrespeitou uma mulher. Eu não tive estudo, mas estudo os comportamentos dos outros. E não acho certo o machismo, nem a covardia, nem o desrespeito.

Vi no celular a cena triste da imagem de um homem, se auto-proclamando distribuidor de bondades, humilhando uma mulher ao entregar para ela uma marmita. Não acho certo. A bondade é livre, é pura, é bonita. "Eu fico com a pureza da resposta das crianças, é a vida, é bonita e é bonita".

Não gosto de armas. Armas ferem e matam. Gosto de escolas. Escolas cultivam bonitezas. Ainda sonho em estudar. Parei nos inícios, vida dura que tive. Onde moro, muitos jovens morrem sem deixar de ser jovens. Basta andar pelo cemitério. Gosto de ver as placas com as despedidas. É triste quando a data de falecimento é tão próxima à data de nascimento. Vidas desperdiçadas. Não, não gosto de armas, nem de brigas, nem de ódios.

Desperto o dia, na minha casa de um único cômodo, e renovo a decisão que aprendi de minha avó, analfabeta, que me ensinou que ninguém deve causar mal em ninguém.

Fazer pastel é uma inspiração. Sorrio cada sorriso de quem come e sente a gostosura do que preparei. É bom alimentar. Quando vejo quem não tem, tento ajudar. Se tivesse mais, ajudaria mais. A vida passa tão rapidamente que fazer alguém feliz é colocar dentro da gente uma boa porção de felicidade. "E o brilho das pessoas é bem maior, irá iluminar nossas manhãs".

No aniversário do Gonzaguinha, quero aniversariar a decisão inegociável de não jogar fora a esperança, de não cultivar nenhum preconceito, de desalojar a mentira e as arrogâncias, de celebrar um tempo de bondade que está sempre pronto para nascer.

Semana que vem, é dia de eleição. Quando perguntam na feira, enquanto saboreiam o pastel, sobre em quem votar, eu faço como a minha avó, falo de mansinho para nunca machucar. Mas votar em quem machuca, jamais. Votar em quem tripudia sobre a dor do outro, jamais. Votar em quem não demonstra sentimentos de compaixão, isso não.

Sei que há os que acreditam que a mentira tem poder de convencimento. Pode ter. Não em mim. Eu desacredito do que não me provam. Eu provo o amor como a luz que me explica onde devo ir e como devo me portar.

Ainda vou estudar para saber mais coisas. O que sei, da escola da vida, é que a vida é o que tenho, é o que defendo. Se um dia eu conseguir, serei professor, acho que de todas é a profissão mais bonita. Ensinar. Ajudar os medos a irem embora, um a um. Ajudar a tirar dos ombros os pesos que não são nossos.

Gosto dos livros. Leio devagar, mas leio. Gosto de anotar as palavras que não conheço e de ficar repetindo. E, vez em quando, canto também. Enquanto frito os pastéis. Enquanto sonho com um mundo sem as hipocrisias nem as injustiças.

Sobre a mulher que estava no lixo buscando o que comer, eu preparei um pastel bem gostoso. E, sobre a outra, a candidata, deixa pra lá, porque eu sei "que a vida podia ser bem melhor, e "se depender de mim, "será".

Feliz aniversário, Gonzaguinha.




Publicado no site do jornal O Dia, dia 25 de setembro de 2022.



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