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Acadêmico: José Renato Nalini "Sempre se viu a sociedade mudar a lei; nunca a lei mudar a sociedade"
Teimosia ou burrice? O Brasil não aprende a lição dos doutos e peritos na prometida edificação de uma pátria justa, fraterna e solidária, promessa até hoje descumprida. Dentre os brasileiros que ofereceram receita para melhorar a vida dos brasileiros está Oliveira Viana (1863-1951). Francisco José de Oliveira Viana foi sociólogo, considerado uma verdadeira obra-prima da sociologia, que sistematizou no Brasil. Escreveu muitos livros. Um deles, "Instituições Políticas Brasileiras", deveria ser relido por todos os que se aventuram na vida pública. Ele começa o segundo volume com uma citação de Eça de Queiroz, muito propícia para nossos dias: "Os que sabem dar a verdade à sua pátria não a adulam, não a iludem, não lhe dizem que é grande, porque tomou Calicut; dizem-lhe que é pequena porque não tem escolas. Gritam-lhe sem cessar a verdade rude e brutal. Gritam-lhe sem cessar a verdade rude e brutal. Gritam-lhe: Tu és pobre, trabalha! Tu és ignorante, estuda!". Em seguida aborda o que chama "o idealismo utópico das elites e o seu "marginalismo" político". Critica os legisladores e os juristas em geral, porque desconhecem todo o vasto mundo de usos, costumes, tradições e, consequentemente, de ideias, preconceitos e sentimentos do nosso povo-massa, subjacente às vistosas estruturas políticas e constitucionais. O jurista acredita que todas as realidades sociais podem ser eliminadas ou abolidas pela Constituição ou pela normatividade infraconstitucional. É uma mentalidade ilógica e contraditória, típica do bacharelismo que assola o país. O que diria ele se tivesse conhecimento que hoje o Brasil detém um número de unidades de ensino jurídico - Faculdades de Direito - superior ao da soma de todas as outras que existem no restante do mundo. Para Oliveira Viana, "no Brasil, cultura significa expatriação intelectual. O brasileiro, enquanto é analfabeto, raciocina corretamente e mesmo inteligentemente, utilizando o material de observações e experiências feitas sobre as coisas que estão ao derredor dele e ao alcance dos seus sentidos, e sempre revela em tudo este inalterável fundo de sensatez, que lhe vem da raça superior originária". Paradoxalmente, depois de estudar - quando fazem com que ele decore informações desnecessárias, complicam os assuntos, convertem o direito, de ferramenta que é, para a solução de questões humanas, em cipoal complexo e indecifrável. É a velha discordância "entre o direito-lei e a realidade social (direito costume)", traço dominante da história política dos povos latino-americanos. O que faz recordar o instigante livro de Jean Cruet: a vida do direito e a inutilidade das leis. Cuja epígrafe ou subtítulo é bem adequada a esta reflexão: "Sempre se viu a sociedade modificar a lei; nunca se viu a lei modificar a sociedade". É uma exuberância de imaginação jurídica, principalmente na órbita da política. Excesso de normatividade e déficit de ação. Dir-se-á que o legislador legisla para a pátria e com a melhor das intenções. Só que o brasileiro que serve para a base de seus raciocínios estrategicamente malabaristas, não é o homem do povo, mas "é uma entidade abstrata, um"ente da razão", que não só deixa de coincidir, mas que pouco lembra o brasileiro real e concreto. Isso perdura há séculos. Não se vislumbra mudança de rumo, apesar do ufanismo na celebração dos duzentos anos do "grito do Ipiranga". Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 15 de setembro de 2022 voltar |
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