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Acadêmico: José Renato Nalini A celebração do 7 de setembro deveria insistir na implementação da democracia participativ e exigir compostura de quem quer que seja remunerado com dinheiro público.
Interdependência e vida Há duzentos anos, o grito teria sido “independência ou morte”. Hoje, o brado seria: “interdependência e vida”. Já não faz sentido falar em independência como aquela condição de total plenitude de poder. Assim como a ideia de soberania se relativizou, porque os fatos não têm compromisso com a teoria, a existência de nação absolutamente independente é impossível em nossos dias. E por que isso? O mundo se apequenou. Já era pequeno. Um planeta de reduzidas dimensões diante da imensidão cósmica. Habitante de uma galáxia que não é das mais importantes. Aos poucos, a tolice dos racionais foi se apercebendo da fragilidade extrema do bicho humano. Nasceu sem pedir, vive algumas décadas – não mais – e morre sem querer. Nesse período, pode se considerar o suprassumo da espécie. Pode enriquecer. Pode conquistar louros e vitórias. Mas acabará como qualquer outro: sob a terra ou calcinado. Suas cinzas espalhadas ao vento. Poucos anos depois, ninguém se lembrará dele. É difícil que alguém tenha consciência de que o mundo existiu milhões de anos sem que nós estivéssemos aqui. Fizemos falta? Nenhuma. Partiremos e também ninguém sentirá falta. A vida continua. Por isso é que, se em 7 de setembro de 1822 o jovem herdeiro da Coroa portuguesa recebeu cartas de sua lúcida e culta esposa, a Imperatriz Leopoldina e de seu leal e sensato amigo José Bonifácio, circunstância que o levou a declarar rompidos os laços que uniam o Brasil a Portugal, hoje a situação é muito diferente. Não há nação independente, naquele sentido de exercer uma soberania incontrastável, absoluta, incondicionada, ilimitada, onipotente. Hoje, todas as nações dependem umas das outras. E há coisas visíveis que nos fazem pensar que a própria natureza nos ensina a humildade, não o ufanismo. Pois chuva ácida não respeita fronteiras; nem as verdadeiras ilhas de pet que navegam pelos mares, deixarão de chegar a algumas praias, porque situadas em países “independentes”. Outras ocorrências humanas evidenciam a interdependência entre todos: o tráfico de armas, o tráfico de drogas, o tráfico de pessoas. Os Estados Unidos, a hegemonia ocidental mais segura do ocidente, não tiveram o seu 11 de setembro? Quantos de seus Presidentes já foram assassinados? Se quiserem brigar com a Rússia ou com a China, em que plano estará a independência? Valeria a pena reafirmar essa condição e sofrer as consequências nucleares dessa insana valentia? Para o Brasil que nasceu abençoado, mas onde quase quarenta milhões de filhos passam fome diariamente, a independência é algo fictício para a maioria de seus habitantes. De que adianta uma república vociferar-se independente, quando seus nacionais têm uma educação pífia, o que os leva à quase inutilidade? O trabalho sofisticado exige profissionais qualificados e a escola brasileira não produz esses quadros. Como declarar-se independente, se milhões não têm casa, não têm emprego, não contam com saneamento básico, a saúde é sempre uma questão tormentosa, a violência ceifa dezenas de milhares de vidas a cada ano? Mais importante do que invocar a independência de 7 de setembro, é pensar como fazer para reduzir o número de partidos políticos, instituições que inspiraram a busca de uma representatividade significativa, mas que se transformaram em fábricas de políticos profissionais. O que fazer para acabar com orçamento secreto, algo surreal e que só existe no Brasil: é crível que o Paramento ouse tornar sigilosa a destinação do dinheiro do povo? Como acabar com os “Fundões” – Eleitoral e Partidário – que levam dinheiro da população sofrida – o brasileiro paga um tributo elevadíssimo para os serviços públicos de que dispõe – e deixam de atender ao mínimo existencial? A celebração do 7 de setembro deveria insistir na implementação da democracia participativa, acabar com a matriz da pestilência chamada reeleição, exigir compostura de quem quer que seja remunerado com dinheiro público. Lembrar ao governante de que, nas Democracias, ele é servo do povo e não seu soberano. Uma nação tem cidadãos, não súditos. Assim como na vida privada os humanos dependem uns dos outros, as nações também estão cada vez mais interdependentes. E é bom que seja assim. Desestimula rompantes de autoritarismo e de menosprezo ao outro. Em lugar de “independência ou morte”, clamemos “Interdependência e vida”! Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 07 de setembro de 2022 voltar |
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