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Acadêmico: José Renato Nalini Quando a política ameaça a democracia, não há como fugir ao repto
O papel renovador das Academias A ideia das Academias de Letras sempre foi polêmica. Inspirada no Jardim de Akademus, de Platão, encontrou no Cardeal Richelieu um corifeu patrocinador da criação da Academia Francesa, que serviu de modelo para todas as outras. Em 1897, Machado de Assis fundou a Brasileira e em 1909, Joaquim José de Carvalho, médico do Rio de Janeiro radicado em São Paulo, inaugurou a Academia Paulista de Letras. Desde então, ela tem funcionado de forma ininterrupta. E nestes tempos sombrios, foi chamada a se posicionar. Tempos sombrios, indagar-se-á? Há quem sustente que tudo está muito bem e que não há problemas no Brasil. Mas na área cultural, como explicar o desmanche de todas as estruturas tutelares das iniciativas artísticas, a eliminação dos incentivos, o golpe baixo na Educação? Ou alguém consegue legitimar a rotatividade no Ministério da Educação, as pepitas de ouro entregues aos pastores, o desmantelamento do Enem, as bíblias com fotografia do titular da Pasta? Em períodos desafiadores, impõe-se que o resíduo de lucidez com que o Brasil ainda pode contar, assuma protagonismo. As Academias foram ridicularizadas por congregar nefelibatas que tomam chá - ou vinho, uísque, cerveja - em torno a uma mesa de platitudes. Mas não é para isso que elas existem. Congregam intelectuais que se destacaram em suas áreas de atuação. Presumivelmente, enxergam um pouco adiante. Têm obrigação de se posicionar. Embora se diga que as Academias não possam fazer política, concorda-se com a circunstância de que a política partidária, entregue à gula dos políticos profissionais, não tem muito a ver com quem se propõe a cultivar o belo, o vernáculo, as artes e o bem. Mas quando a política ameaça a democracia, não há como fugir ao repto. Foi assim que a Academia Paulista de Letras elaborou vários manifestos, que foram tornados públicos, para evidenciar qual a postura dos seus integrantes. Não houve unanimidade, é claro. Mas prevaleceu a norma democrática da vontade da maioria. A História vai cobrar dos que vivenciaram esta melancólica fase de retrocesso - ambiental, cultural, moral - o que eles fizeram pelo Brasil. Para estar de bem com a consciência sensível, expuseram-se, corajosamente. Pois, nestes dias, pensar de forma diversa é quase crime. O fanatismo não perdoa quem não leia a mesma cartilha e desafine no canto monocórdio. Mas as Academias atuam também politicamente, na renovação de seus quadros. A Academia Paulista de Letras acolheu dois Maestros - Júlio Medaglia e João Carlos Martins - um músico: Zuza Homem de Melo; um quadrinista, Maurício de Sousa. Um publicitário, Roberto Duailibi. Dois novelistas: Walcyr Carrasco e Maria Adelaide Amaral. Dois arquitetos: Benedito Lima Toledo e Ruy Ohtake. Abraçou Jô Soares, cuja perda ainda lamenta. Ampliou o conceito de "Letras", para receber exemplares únicos em segmentos de extrema relevância cultural. Hoje, primeiro de setembro deste emblemático 2022, toma posse Djamila Ribeiro. Pensadora, ativista, empenhada na correção de equívocos históricos, perpetrados contra os africanos que escravizamos por mais de três séculos. Escritora corajosa, mas terna e sensível. Sucede à nossa grande dama da literatura brasileira, a inefável Lygia Fagundes Telles. Conheci e convivi com Lygia. Ela gostou da escolha. Tenho certeza. É mais um brado significativo do papel renovador das Academias. Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 01 de setembro de 2022 voltar |
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