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TUDO INVENÇÃO CATASTROFISTA
Acadêmico: José Renato Nalini
Há uma profunda desestabilização dos ecossistemas e podem surgir outras pandemias, mais letais até do que a da Covid 19.

Tudo invenção catastrofista

Aqueles que continuam a acabar com as árvores, a poluir atmosfera, solo e água, que não acreditam no aquecimento global e no fim dos tempos – provocado pela ignorância e cupidez humana – devem achar natural que a Inglaterra tenha superado os quarenta graus centígrados pela primeira vez em sua história.

Também derivam de causas naturais os incêndios florestais em Portugal e Espanha. Em nossa pátria-mãe, morreram 1.063 pessoas a mais do que o normal. Bélgica e Alemanha sofrem com o calor excessivo, assim como a França. Tudo consequência da insensatez que comanda a inconsciência coletiva neste sombrio cenário da primeira metade do século 21.

O Brasil não escapa dessa desgraça. A falta de chuva faz escassear os reservatórios utilizados pela população para se dessedentar e para sua higiene pessoal. Quando vierem as chuvas, as inundações e deslizamentos continuarão a mostrar que não se agride impunemente a natureza.

Todavia, como adverte o médico infectologista Esper Kallás, as consequências do aumento na temperatura do planeta não se resumem aos incêndios, derretimento de calotas polares, tsunamis e desaparecimento de ilhas habitadas. Há uma profunda desestabilização dos ecossistemas e podem surgir outras pandemias, mais letais até do que a da Covid 19. A peste negra foi um dos resultados de mudança drástica, a erupção do vulcão Krakatoa no ano 536. Cinco anos depois, ela havia acabado com um quarto da população do Império Bizantino.

Para os especialistas, o Brasil é um típico caso de “hot spots”, um lugar com as mais propícias condições para os saltos de vírus, que ocorrerão se continuarem a destruir as florestas. O ritmo do extermínio da mata faz com que nosso país ingresse de vez na era das pandemias. Diz o cientista: “A humanidade está cada vez mais vulnerável. Torna-se imprescindível a discussão sobre emissão de gases de efeito estufa, aumento de temperatura e outras mudanças radicais que temos causado ao planeta, com o efeito que pode ter para as doenças infecciosas”. Ou será que a cloroquina continuará a ser o remédio mágico, insuficiente para frear as mortes, mas bom o bastante para enriquecer quem o fabrica e comercializa?

Quando a União negligencia a defesa da natureza, estimula a exploração de minérios em áreas indígenas, desmancha a estrutura dos equipamentos institucionais encarregados de observância efetiva do disposto no artigo 225 da Constituição da República, é hora de sacudir a população. Esta caminha passivamente para o patíbulo. Não haverá futuro, nem existirão as gerações do porvir, se o clima de terra arrasada continuar com essa volúpia insana.

O que fazer? Começar em casa. Cada lar é uma célula produtora de consequências para o amanhã comum. A forma como se usa a água, o desperdício de comida, o não aproveitamento dos resíduos, a despreocupação com o desaparecimento do verde, a absoluta inconsequência com que se despreza a educação ambiental, tudo vai redundar em perda para a humanidade.

Deixar de conferir à União, uma ficção que tem se mostrado maligna para o Estado Brasileiro, essa importância imperial que costuma incensá-la como se ainda vivêssemos a monarquia. Conscientizar as crianças de que governo é servo do povo e não seu patrão. Inocular o orgulho pelo berço natal, o lugar onde tudo acontece. Invoque-se, uma vez mais, a lição de André Franco Montoro: “as pessoas não nascem na União, nem nascem no Estado: nascem no município”. Aqui se vive, aqui se paga pela omissão dos governantes. É localmente que se deve combater o inimigo comum: o veneno da ambição, a ignorância crassa que faz desprezar a incontestável realidade: o homem é um elo apenas nessa cadeia vital em que todos os demais elos são importantes.

Cada município tem de atuar dentro de seu território e cuidar do ambiente da melhor forma possível: repor as árvores ceifadas; fazer viveiros de mudas, ensinar às crianças a base da economia circular, pois o descarte é excessivo e representa prejuízo para a ecologia e para a economia. Um país com trinta e três milhões de famintos tem de ser mais sério. De deixar orçamentos secretos de lado e levar seus autores à Justiça. Acabar com a matriz da pestilência chamada reeleição. Reduzir ao mínimo o tamanho do Estado tentacular, que não cabe no PIB brasileiro. Dar educação de qualidade a estes seres ameaçados que sofrem as consequências de um premeditado dolo das autoridades responsáveis e que serão vítimas dessa atitude verdadeiramente delinquencial.

A humanidade corre perigo e não é invenção catastrofista, senão a resposta da natureza maltratada, sacrificada e que levará consigo toda espécie de vida existente neste sofrido planeta.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 19 08 2022



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