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O MUNDO FUNCIONA?
Acadêmico: José Renato Nalini
Somos gananciosos, estamos desperdiçando e melhorando nossas eficiências simultaneamente. Só que a equação não bate. A eficiência é muito menor do que o desperdício.

O mundo funciona?

O mundo, como o conhecemos, existe há milhões de anos. Sempre funcionou. Rotação e translação, lei da gravidade, a sequência das estações, a vida desabrochando, se desenvolvendo, enfraquecendo e morrendo. Só que de uns tempos a esta parte, os homens vêm se comportando muito mal. Abusam na extração de recursos naturais da Terra. Ela já não consegue recuperação, o que é essencial para a continuidade de qualquer modalidade existencial sobre o planeta.

Vaclav Smil, professor da Universidade de Manitoba escreveu o livro “Como o mundo funciona de verdade: a ciência por trás de como chegamos aqui e para onde estamos indo”. Ele é um cientista que se especializou em energia e apela para os quatro grandes pilares da civilização moderna: cimento, aço, plástico e amônia. Qualquer um deles, para se tornar utilizável, exige a queima de enorme quantidade de combustível fóssil.

Ele observa que a transição energética em um país com um milhão de pessoas é diferente daquela necessária a um país com um bilhão de habitantes. Se para o primeiro é suficiente uma quantia não superior a alguns bilhões de dólares, para o segundo é necessário dispor de um trilhão.

A COP26 deliberou que é urgente reduzir as emissões de dióxido de carbono em 45 até 2030. Mas é impossível: só faltam oito anos e as emissões nunca baixaram. Só aumentam!

Smil é cético e pensa que não faz sentido estabelecer metas que não serão alcançadas. Se alguns chamam essa fixação de metas de ambição, ele prefere chamar de delírio. O mais importante seria a transição mental: fazer com que as pessoas consumissem menos. Por que carros tão potentes?

Nós nos iludimos com as promessas tecnológicas e pensamos que a impressão 3D permitirá imprimir casas e carros. A ciência pop é delirante. O Presidente Biden quer descarbonizar completamente a geração de eletricidade até 2035. Mas o país não tem sequer uma rede elétrica nacional! Além disso, o povo americano forma uma sociedade NIMBY: “Not In My Backyard”, ou seja, não no meu quintal.

Quanto à catástrofe “iminente”, Vaclav Smil critica o fato de não ter havido reação humana compatível com a desgraça da queima de combustíveis fósseis em larga escala. A humanidade poderia ter trilhado um caminho diferente. Hoje, mais de um bilhão de pessoas estão desnutridas ou sofrem de insegurança alimentar.

Há mais de trinta anos anuncia-se a catástrofe climática. Reuniões do IPCC se sucedem e o que tem sido feito? Os compromissos não são cumpridos. Trinta anos depois, as emissões aumentam a cada dia. Por que não se faz nada? Há uma série de providências que poderiam ser tomadas para reduzir a produção de gases venenosos.

Algo tão grave, sem precedentes na nossa história. Entretanto, a humanidade parece não se importar com isso. Cada um de nós continua a se comportar de forma totalmente irresponsável. Se hoje nós cessássemos a emissão de forma integral, os benefícios só seriam sentidos a partir de 2070. Ainda com a redução parcial de emissões, a temperatura continuará a aumentar. Não repercute na consciência do homem comum a imposição de um sacrifício para a fruição de um benefício que só atingirá seus netos.

Somos gananciosos, estamos desperdiçando e melhorando nossas eficiências simultaneamente. Só que a equação não bate. A eficiência é muito menor do que o desperdício.

É! Na verdade, o mundo não funciona! Vai acabar mal.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 14 07 2022



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