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EM BUSCA DO BOI VERDE
Acadêmico: José Renato Nalini
O Brasil possui mais cabeças de gado do que gente. A pecuária, em regra, desmata para formar pasto. Depois de um tempo, a área é abandonada, porque sequer braquiária nasce ali.

Em busca do boi verde

O Brasil possui mais cabeças de gado do que gente. A pecuária, em regra, desmata para formar pasto. Depois de um tempo, a área é abandonada, porque sequer braquiária nasce ali. Por isso muitos pensam que somos fabricantes de deserto.

Seria o caso de indagar? Vale a pena acabar com nossas florestas, que em pé renderiam créditos para a descarbonização, tudo para alimentar outros povos?

Sempre soube que, além do desmatamento voraz para atender à pecuária, o gado expele gá5 s metano pela flatulência e pela digestão. Ouvi também que esse gás é mais nefasto do que o emitido pelos automóveis, os vilões que se alimentam de combustível fóssil que está envenenando o mundo.

Mas há controvérsias. Vejo que Frank Mitioehner, pesquisador da Universidade da Califórnia e especialista em qualidade do ar do departamento de ciência animal em Davis, sustenta que o metano emitido pelo gado tem potencial para conter o aquecimento do planeta.

Será?

Ele veio a convite de uma empresa do setor para dissertar sobre “não precisamos eliminar a pecuária para parar o aquecimento global”. Sua tese é a de que o gás emitido pelo arroto do boi – não falou da flatulência – tem duração menor na atmosfera. Já o CO2 perdura muito mais.

Ele reconhece que a pecuária é fonte de gases do efeito estufa. Mas o efeito nefasto é menor do que o causado pelos combustíveis fósseis. Diz que nos Estados Unidos, 80 das emissões derivam dos veículos e apenas 4 provêm dos animais. Enquanto o CO2 dos veículos dura um milênio, o gás metano sofre o processo de oxidação e desaparece em uma década.

Quando alertado de que o Brasil tem um perfil de emissões muito diferente dos Estados Unidos e que um terço delas vem da agricultura e pecuária, principalmente fermentação entérica, mais o desmatamento que a pecuária ocasiona, o cenário é muito menos favorável do que o propagandeado por ele.

Então responde que o Brasil é uma economia emergente e que por conta do nosso atraso no desenvolvimento, as emissões são causadas por essa atividade ainda primitiva. “Quanto menor o desenvolvimento de um país, mais importante é o setor agrícola no perfil das emissões. Em alguns países, os gases de efeito estufa do gado chegam a 90. Isso não significa que o gado deles seja terrível em emissões; significa apenas que os outros setores são relativamente menos desenvolvidos”.

Seu otimismo é contagiante: o que importa para o Brasil é que, se o metano é o maior responsável pelas emissões agrícolas, isso representa uma oportunidade significativa. Se o Brasil conseguir reduzir o metano, e de preferência agressivamente, estará imediatamente retirando carbono da atmosfera e, com isso, reduzindo o aquecimento.

Para isso seria necessário que as indústrias agrícolas levassem a sério esse projeto. Para o pesquisador da Universidade da Califórnia, “se o país reduzir o metano em 20 ou 30, não apenas poderá compensar outras emissões agrícolas, mas eventualmente chegar a um ponto de neutralidade climática”.

A Califórnia conseguiu reduzir a emissão de metano graças aos incentivos financeiros propiciados. Com medidas plenamente factíveis. Por exemplo: cobrindo o local de armazenamento de resíduos nas fazendas. O estrume a céu aberto é uma usina de emissão de metano. Já com a cobertura, os gases são capturados e convertidos em combustíveis.

O benefício evidente é que deixar de capturar o metano significa não só prejuízo para o ambiente, como perda de dinheiro. Ao se alimentar uma vaca, cerca de 10 da energia fornecida ao animal se perde como metano. Seria, imagem fornecida por Frank Mitioehner, como deixar no inverno as janelas e portas abertas. O metano, longe de ser problema, é oportunidade.

Se os criadores de gado quiserem, isso pode ser feito no Brasil. Assim como cuidar de uma nova alimentação para o gado, que implique em emitir menos metano.

Resta ver se as empresas que se comprometem a levar também a sério a agenda ESG, adotarão essas providências ou continuarão na destruição e extermínio do verde e da biodiversidade, rumo ao suicídio coletivo, não tão homeopático agora, em vez de cuidar de um amanhã seguro para as próximas gerações.

Se eles não se converterem, sempre restará voltar ao vegetarianismo, começando pela “segunda sem carne”, que causa tanta celeuma num país que já foi promissora potência verde e hoje é um lamentável “pária ambiental”.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 11 07 2022



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