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Acadêmico: José Renato Nalini Nosso Parlamento claudica e feio. Que a História registre os nomes dos responsáveis, para que o tribunal da razão consiga concretizar a devida justiça.
Parlamento também claudica Na formatação ideal da separação de Poderes do Estado, a mais relevante dentre as funções é a exercida pelo Legislativo. Ele estipula as regras do jogo. Governar, no Estado de Direito de índole democrática, é cumprir a lei. Julgar, a função do Judiciário, é fazer incidir a vontade concreta da lei sobre as controvérsias. Quem está com as rédeas do poder nas mãos é o Parlamento. Mas nem sempre funciona como se almejaria, o jogo entre as funções do Estado. Durante muito tempo, no Brasil, o Parlamento se apequenou e se submeteu à vontade soberana do Executivo. Este é quem dispõe das prerrogativas de nomear e conseguiu cooptar parlamentares para servirem aos objetivos do governo. Isso legitimou que se falasse, com muita frequência, que “fora do Executivo não há salvação”. O caso mais emblemático é o das Câmaras Municipais. Embora o Município tenha sido erigido à categoria de entidade da Federação, seus legisladores não podem quase nada. Limitam-se a dar nomes de ruas e títulos de cidadania. Uma visão estreita do Judiciário faz com que a imensa maioria das leis editadas pelos Legislativos Municipais seja considerada inconstitucional. Nem sempre é assim. O que sobrou para o parlamento local? Aquele que mais conhece as necessidades peculiares à cidade? Vive-se outra fase no âmbito da União. O “Centrão” fisiológico dominou o Executivo e o submete às suas vontades. Daí o orçamento secreto, os Fundões Eleitoral e Partidário, a destinação de verbas imensas para microcomunidades, tudo a mostrar ao Brasil quem está mandando. Só que o Parlamento a exercer esta espécie de Parlamentarismo tupiniquim também deverá acertar contas com o futuro. Não tomar providências previstas na Constituição para apreciar pedidos de impeachment é uma das mais flagrantes máculas. Mais importante e grave ainda, é coonestar com a “soltura da boiada”, que foi bem apreendida e melhor cumprida pela criminalidade organizada, que dá as cartas na Amazônia e em outros biomas. Tanto assim, que já se chama de “boiadinha” a pauta contra o ambiente que está a merecer aceleração no Senado. Descumprindo com a promessa de ouvir a Comissão do Meio Ambiente, a presidência do Senado atropela a aprovação de maneira insólita. Flexibilizar a lei que é chamada de “Código Florestal” mas que sacramentou o retrocesso na tutela da floresta, autorizar mais agrotóxicos proibidos em seus países de origem, anistiar desmatadores, diminuir restrições em áreas de preservação e em unidades de conservação, tudo isso é acelerado de forma flagrante. Tudo para servir ao agronegócio que não se preocupa com a natureza. Há poucos agropecuaristas conscientes, aqueles que perceberam que o mundo civilizado deixará de comprar nossos grãos – destinados a alimentar gado – se não nos comprometermos com a preservação ambiental. O chamado “PL do veneno” já mereceu acerbas críticas por parte de ambientalistas e também do pessoal da saúde. Mas a ânsia em agradar setores que financiam campanhas, neste ano em que deveriam ser renovadas as composições parlamentares no âmbito federal e estadual é maior do que qualquer escrúpulo ou constrangimento. A Comissão do Meio Ambiente foi escanteada. Os jornalistas João Gabriel e Renato Machado mostram quais são os projetos nocivos que fazem parte da nefasta “boiadinha”: o primeiro é a PL do veneno, que foi para a Comissão da Agricultura sem passar pela do Meio Ambiente. Permite registro de novos agrotóxicos e diminui poder do Ibama e da Anvisa. O parcelamento das dívidas do Ibama cria mecanismo procrastinatório e lesivo à economia. Autocontrole sanitário: autoriza a contratação de empresas privadas para substituir o Estado na fiscalização e facilitar aprovação. Anistia ao desmatamento altera o chamado “Código Florestal” e amplia em quatro anos os imóveis regularizáveis, mesmo que desmatados. Construção de reservatórios de água em APP. Também contribui para desmatamento nas Áreas de Preservação Permanente. Linhas de transmissão em áreas indígenas, isenção para a silvicultura, libera os poluidores de pagamento de taxa ao Ibama. Também integra a “boiadinha” a permissão para abertura da Estada do Colono, que reparte ao meio o Parque do Iguaçu, com todos os inconvenientes daí decorrentes. Nosso Parlamento claudica e feio. Que a História registre os nomes dos responsáveis, para que o tribunal da razão consiga concretizar a devida justiça. Isso se houver amanhã. Pelo jeito, o caos definitivo está cada vez mais próximo. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 02 07 2022 voltar |
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