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QUEM PAGARÁ O PREJUÍZO?
Acadêmico: José Renato Nalini
humanidade que retrocede em ética e nos demais valores, acostumou-se a se servir da natureza como se ela fora uma espécie de supermercado gratuito.

Quem pagará o prejuízo?

A humanidade que retrocede em ética e nos demais valores, acostumou-se a se servir da natureza como se ela fora uma espécie de supermercado gratuito. Dali tudo se extrai. Nada se repõe.

Minha geração foi irresponsável. Continuou a exaurir os recursos naturais, não prestou atenção à ciência, ignorou os intensos e frementes sinais emitidos pelo planeta. Até que a coisa chegou ao estágio atual. Já ultrapassamos o ponto de inflexão para uma conversão dos hábitos. Estamos a caminho do caos. Ou seja: a vida já não terá lugar na Terra, dentro em pouco tempo.

Somente jovens sensíveis conseguem enxergar isso. O coração empedernido do velho está frígido e imóvel. Ainda pensa que o apocalipse acontecerá dentro de cem anos. E ele já não estará por aqui.

A jovem Vanessa Nakate, de Uganda, é uma ativista climática. Inspirada em Greta Thunberg, Vanessa organizou sua primeira greve por justiça climática em janeiro de 2019. Esteve em Davos, em 2020, para pedir que governos, bancos e empresas deixassem de subsidiar combustíveis fósseis. Foi também a Glasgow, na COP26. Uma de suas frases: “A humanidade não será salva por promessas”.

Ela integra o movimento “Fridays for Future Uganda”, movimento de jovens que faltam às aulas às sextas-feiras, para exigir ações contra a crise climática. Agora ela encara a responsabilidade dos países desenvolvidos ante a emissão de gases causadores do efeito estufa. Ela vê um aspecto da crise que o Brasil ainda não enfrenta, ao menos com essa força: na África subsaariana, cerca de 3,5 milhões de novos deslocamentos derivam da crise climática. Prevê-se que entre 56 milhões e 86 milhões de pessoas tenham de migrar de seus países por força da seca. É a migração ambiental, em pleno curso.

Ela tem consciência de que a África é responsável por menos de 4 das emissões. Enquanto isso, muitas comunidades naquele ambiente enfrentam alguns dos piores impactos da crise e enfrentam inundações e ciclones, dentre outros fenômenos. O ciclone Idai, em março de 2019, destruiu boa parte do continente africano e deixou pessoas mortas, propriedades destruídas e muitos desalojados. A seca na África Oriental fez com que mais de 26 milhões de pessoas perambulassem à procura de comida. Animais famintos morreram. As comunidades sofreram bastante.

Não é possível que a humanidade se acostume a se adaptar à fome. Nem se pode exigir delas que percam sua identidade, sua cultura, sua história. Por isso é que as nações ricas devem criar um fundo de indenização pelos males que acometem os mais pobres.

Há muitas possibilidades, se os homens tivessem juízo. Por exemplo: a indústria bélica. É totalmente absurdo, surreal até, que se fabrique armamento e se dissemine o seu uso generalizado. Um instrumento utilizado para tirar a vida não deveria ser produzido. Existe já uma tecnologia que permite a neutralização de qualquer pessoa, sem que seja necessário tirar-lhe a vida.

Quanto se gasta com armamento no mundo inteiro? Qual a vantagem dessa cultura? A multiplicação de assassinatos como os que ocorrem reiteradamente nos Estados Unidos?

Vanessa, em Uganda, desenvolve projetos comunitários que poderiam ser copiados em outros países, como o Brasil. Há muita similitude entre nosso país e a África. Lá ela instala painéis solares e fogões ecológicos em escolas, para impulsionar a transição para a energia renovável e reduzir a lenha que as escolas utilizam no preparo da alimentação escolar. Também há um projeto de distribuição de lâmpadas solares para famílias.

Simultaneamente, ela combate o fenômeno das “noivas climáticas”, meninas que são obrigadas a casamento precoce porque seus pais não têm condições de alimentá-las, já que em virtude de ocorrências climáticas, a família perdeu tudo.

Ela tem plena consciência de que a crise climática enfatizou e exacerbou as desigualdades de gênero. As mulheres são as maiores vítimas. Elas são mães e têm de enfrentar o desabrigo, a fome, a sede e a falta de vestuário para as suas proles.

Como jovem ativista, vê com angústia a proliferação de projetos que usam combustíveis fósseis. “Não se pode comer carvão, nem beber petróleo. Nem respirar o chamado “gás natural”. Dentre as cem práticas que reduzem as emissões de gases venenosos, a quinta é a educação das meninas e o planejamento familiar. Quando a menina é educada, é a comunidade inteira que ganha. Viva Vanessa! Que surjam Gretas e Vanessas brasileiras!

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 29 06 2022



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