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Acadêmico: José Renato Nalini Desde criança, aprendi, por mérito exclusivo de minha mãe, a ler com prazer
Deus é mãe! O milagre da maternidade é também mistério. A ciência explica a fecundação, a gestação, o parto. Todavia, não tem condições de explicar integralmente a natureza do sentimento materno, aquele amor infinito, que se sobrepõe a todas as forças e que é capaz de ir aos infernos para salvar o filho. Para nós, os crentes, é o testemunho de que o Criador foi tão magnânimo, que concedeu às criaturas parcela considerável de Seu poder: o de gerar outras vidas. Mas a questão continua transcendental até para os agnósticos, os desprovidos de fé, os ateus. Essa ternura materna é insondável. Experimentada por todas as mães, tendo como objeto de amor, como alvo carinhoso, todos os filhos. Apenas a patologia consegue explicar a existência de mães que abandonam seus filhos, ou que os renegam. Essa a exceção confirmatória da regra inescapável: mãe é a concretização do amor, só que do amor desinteressado. Potência incondicional posta a serviço da cria. Os que tivemos a ventura suprema de ter mães extraordinárias, delas somos devedores insolventes. Nunca conseguiria pagar o que minha mãe fez por mim. Desde o berço, a sábia mestra que me transmitiu lições ainda hoje preciosas. Procurar ser um pouco melhor a cada dia. Nossa vocação é a perfectibilidade. Respeitar a todos, mas com a singularidade afetuosa para os mais idosos. Minha família sempre cuidou com afeto de seus velhos. Na verdade, só eram velhos para a ingenuidade infanto-juvenil da primeira metade do século passado. Hoje, sobrevivemos a quase todos os avós. Morria-se muito cedo naquele tempo. Ser bom aluno, afeiçoar-se à professora, tratá-la não só com respeito, mas com verdadeira veneração. Cumprir as obrigações religiosas. Estar sempre com a consciência tranquila. Mas a maior lição foi a leitura. Desde criança, aprendi, por mérito exclusivo de minha mãe, a ler com prazer. Todos os meses, a depender de minha classificação no boletim de aplicação e comportamento, eu recebia um livro de estórias da Melhoramentos. Esses pequenos livros, que cheguei a ler para meus filhos, ainda estão comigo. Na esperança de que algum neto se interesse também. Eram leituras edificantes. A moral estava numa narrativa que nos encaminhava para o bem. Quando isso cai na mente infantil, na fase ainda com espaço bastante para acolher tudo o que lhe é endereçado, cala profundamente. Meus pais também eram devotos de suas mães. Foi um aprendizado pelo exemplo. Minha avó paterna morreu cedo, eu era ainda criança. Mas tenho lembrança de meu pai chorando, copiosamente, e do luto que se seguiu durante mais de um ano. Minha avó materna foi uma das mais deliciosas experiências que vivenciei. Quando ela faleceu, eu ia completar dezoito anos. Era doce, excessivamente generosa, protetora e cúmplice. Cheguei a ir ao cinema com ela - Cine Marabá - assistir filmes que ela escolhia e, ao assisti-los, nós dois chorávamos. Um deles: "Em cada coração uma saudade", no qual as crianças ficavam órfãs e eram distribuídas por vários lares adotivos. Hoje, tenho duas filhas que também são mães e que seguem o modelo tradicional do cuidado contínuo, do trato extremado, numa feliz reprodução daquilo que se perpetua numa família que rende culto à maternidade. Somente a convicção de que existe algo mais do que o Big-Bang autoriza a dizer e a acreditar que o amor materno só se compara com o amor divino por Sua criação. Não é heresia, portanto, dizer que, em termos de amor, Deus é mãe! Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 08 05 2022 voltar |
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